O apoio dos senadores baianos ao retrocesso, por Raul Monteiro*

Foto: Divulgação/Arquivo

Algum político brasileiro tem dúvida de que o retorno das coligações partidárias é um retrocesso que dificulta a melhoria da qualidade da representação política da sociedade? Claro que não! E por que, mesmo assim, articulam e até anunciam que votarão a favor de uma mudança aprovada na reforma política de 2017 cujo objetivo foi exatamente o de promover, no longo prazo, uma redução na quantidade obscena de partidos que existem no país, ajudando a aperfeiçoar, em última instância, o nível das relações entre a população e aqueles eleitos para representá-la no Parlamento?

Ora, ora! Questão de lógica. Eles votam contra a modernização e o avanço do sistema político porque estão muito mais preocupados com os seus próprios umbigos e esquemas capazes de perpetuá-los no poder do que com a população. Será que pensam de forma diferente os senadores eleitos pela Bahia quando anunciam exatamente seu apoio à volta das coligações? Jaques Wagner, do PT, e Otto Alencar e Angelo Coronel, do PSD, chegaram a gravar um video anunciando a disposição de colaborar, em votação no Senado, com a regressão.

Naturalmente, não apresentaram grande justificativa para a medida. Nem precisavam. Como não disputarão eleições proporcionais agora, o mais provável é que estejam agindo em defesa da vontade de partidos e políticos que dependem mais diretamente do arranjo e com os quais acham interessante fazer ‘uma média’. Mesmo que isso signifique, a longo prazo, prejuízo para a sociedade. Pouco importa que a extinção das coligações tenha sido aprovada no bojo de uma reforma política ocorrida há apenas quatro anos.

Quando agem dessa forma, frontalmente contra o que melhora o controle do povo sobre sua atividade, senadores e deputados se esquecem de que podem estar fomentando a irritação da população contra eles e colocando em xeque a relação dos representados com a democracia, que, como a história evidencia com cada vez maior clareza, precisa ser cuidada. Mais do que isso, demonstram dificuldade em reconhecer que atos continuados em desfavor do interesse público produzem uma indignação que se expressa de forma irracional no apoio a líderes populistas e autoritários que ameaçam acabar com a política, como se assiste neste momento.

Dos três representantes políticos da Bahia no Senado, a reflexão talvez devesse ser feita com maior senso de urgência por Wagner. Ele é ex-governador, candidato à sucessão estadual de 2022 e líder de um partido ideológico de esquerda cujos erros e deslumbramento quando no exercício do poder central se tornaram inegavelmente um dos grandes responsáveis pelos riscos de uma saída autocrática no país hoje. Mas está na cara que não admite os equívocos. Pelo apoio à volta das coligações, percebe-se que aprendeu muito pouco com os erros não só do próprio partido. Sequer percebe o horror que os privilégios da sua classe provoca.

Artigo do editor Raul Monteiro publicado na edição de hoje da Tribuna.
Raul Monteiro*

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