Defasagem no preço dos combustíveis gera risco ao abastecimento, diz setor

Foto: Divulgação/Arquivo
O aumento da defasagem entre os preços internos dos combustíveis e as cotações internacionais acendeu alertas no mercado sobre riscos de desabastecimento de produtos por dificuldades de importação por empresas privadas.

As preocupações ganharam força desde a semana passada, quando a Petrobras informou a distribuidoras de combustíveis que não poderia atender a todos os volumes solicitados para entrega em novembro, alegando que houve um crescimento atípico dos pedidos.

O mercado vê na decisão uma estratégia para forçar importações privadas de combustíveis e evitar prejuízos com a venda a preços brasileiros de produtos comprados mais caros no exterior, operação que é vedada pelo estatuto da estatal.

Nesta terça-feira (19), o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás), afirmou que sem a percepção clara de que os preços seguirão regras de mercado, não há segurança para investimentos nem para importações que complementem o déficit interno de derivados.

“O alinhamento de preços ao mercado internacional apresenta-se como a abordagem necessária para garantir o abastecimento do mercado aos menores custos para a população”, disse o instituto, que reúne as grandes petroleiras e distribuidoras de combustíveis que atuam no país, incluindo a própria Petrobras.

Na semana passada, uma associação que reúne distribuidoras de menor porte, a Brasilcom, veio a público dizer que a Petrobras estava cortando em até 50% os pedidos de suas associadas, o que colocaria o país “em situação de potencial desabastecimento”.

A estatal diz que houve uma “demanda atípica” para o período, com pedidos muito superiores aos normais e acima de sua capacidade de produção. “Apenas com muita antecedência, a Petrobras conseguiria se programar para atender essa demanda”, afirmou, em nota.

Para executivos do setor, o problema reflete uma mudança na estratégia comercial da estatal, que reduziu a frequência de reajustes após a posse do general Joaquim Silva e Luna, e hoje admite operar com defasagens por prazos mais longos.

Nesta terça, segundo a Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis), o litro do diesel vendido pela estatal custa R$ 0,61 a menos do que a paridade de importação, conceito que simula quanto custaria para trazer o produto ao país. Na gasolina, a diferença é de R$ 0,46 por litro.

Atualmente, cerca de um quarto do mercado de óleo diesel é abastecido por produtos importados. No caso da gasolina, são cerca de 10%. A Petrobras diz que vem aumentando a produção em suas refinarias, mas uma parcela do mercado continuará sendo atendida por importações.

Executivos do setor entendem que as maiores distribuidoras terão condições de importar os produtos para seus clientes, mas pode haver dificuldade entre as menores e, principalmente, para postos de bandeira branca, que costumam ter menores volumes garantidos em contratos de longo prazo.

Com as defasagens, a participação da Petrobras nas importações cresceu em 2021: em agosto, a estatal foi responsável por 58% das compras externas de diesel e por 83% das de gasolina. Na média, em 2019, foram 30,4% e 39,1%, respectivamente.

Agora, a expectativa é que esse movimento seja revertido, com maior participação privada nas compras no exterior. E, mesmo que não haja desabastecimento, o repasse da diferença deve aumentar a pressão sobre os preços dos combustíveis nas bombas.

Os maiores reflexos devem ser sentidos em regiões mais dependentes de importações, como Norte e Nordeste, segundo executivos ouvidos pela Folha.

Em nota, a Petrobras alega que os pedidos de diesel para novembro superaram em 20% o volume vendido no mesmo período de 2019. No caso da gasolina, a alta foi de 10%. “A Petrobras segue atendendo os contratos com as distribuidoras, de acordo com os termos, prazos vigentes e sua capacidade”, diz.

Segundo as distribuidoras, a alta reflete maior demanda do transporte de cargas e os altos preços do etanol, que vêm levando os consumidores a preferir abastecer o tanque com gasolina.

Entre janeiro e agosto, as vendas de diesel de petróleo (sem considerar o biodiesel misturado antes da entrega aos postos), somaram 35,75 bilhões de litros, volume 5% superior ao verificado no mesmo período de 2019, antes da pandemia. Na gasolina, o volume é praticamente o mesmo daquele período.

A ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) diz não ver nesse momento risco de desabastecimento do mercado. “A ANP segue realizando o monitoramento da cadeia de abastecimento e adotará, caso necessário, as providências cabíveis para mitigar desvios e reduzir riscos.”

Mas o tema já começa a preocupar os principais usuários de diesel do país: nesta terça, a Abrava, associação que reúne caminhoneiros autônomos, divulgou alerta sobre risco de desabastecimento para a categoria.

“Alertamos a categoria de que o corte nos pedidos de diesel as distribuidoras não será somente no mês de novembro, mas também no mês de dezembro o que necessariamente acarretará o desabastecimento nacional a médio prazo”, diz o texto, que ressalta ainda a possibilidade de aumento dos preços.

“As distribuidoras terão que importar o diesel mais caro e repassar os valores aos postos de combustíveis que por sua vez repassarão o aumento aos caminhoneiros, e com a quantidade de diesel menor os preços irão subir de maneira absurda.”
Nicola Pamplona, Folhapress

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