Alta do preço dos combustíveis 'engorda' cofres da União em 2021 e arrecadação deve passar de R$ 70 bi
Aumento dos preços de combustíveis para consumidor final fica a critério de distribuidoras e postos — Foto: Marcelo Brandt / G1 |
O cálculo foi realizado pelo sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.
"O governo está numa posição muito confortável. Nunca arrecadou tanto na área de óleo e gás como hoje em dia", afirma Pires.
O governo ganha em três frentes: via arrecadação, dividendos e royalties. Veja em detalhes:
R$ 15,2 bilhões com arrecadação de PIS e Cofins até setembro. São os tributos federais que incidem sobre os combustíveis.
R$ 23 bilhões com dividendos da Petrobras. A parcela do lucro que a estatal distribui para os acionistas – o governo federal é o maior deles.
R$ 31,9 bilhões com participação especial e royalties previstos até o fim deste ano. Esse dinheiro é pago pelas petroleiras à União para ter direito a explorar o petróleo.
Em todo o ano de 2020, a União recebeu R$ 36,2 bilhões com arrecadação de PIS e Cofins de combustíveis, dividendos da Petrobras e participação especial e royalties.
Escalada de preços
Neste ano, o Brasil lida com uma escalada de preços dos combustíveis.
Nas bombas do país, o preço médio do litro da gasolina chega a R$ 6,710, o do diesel está em R$ 5,339, e o do etanol é de R$ 5,294, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O gás de cozinha também está em alta. O botijão de 13 quilos custa R$ 102,48 - o Congresso também aprovou um projeto que cria um auxílio gás para famílias de baixa renda, mas a proposta ainda depende da sanção do presidente Jair Bolsonaro.
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A alta do preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha pode ser explicada, sobretudo, pelo aumento da cotação do petróleo no mercado internacional e pela desvalorização do real em relação ao dólar.
Hoje, a cotação do barril do petróleo supera os US$ 80 no mercado internacional, e o dólar está acima de R$ 5,50.
Esse cenário tem levado a Petrobras a promover sucessivos aumentos no preço dos combustíveis vendidos para as refinarias – e esses reajustes acabam sendo repassados por toda a cadeia, até chegar ao consumidor. O último deles foi anunciado no fim de outubro: o litro da gasolina teve alta de 7,04%, e o do diesel subiu 9,15%.
"É um momento de tempestade perfeita, com petróleo muito caro e o câmbio muito elevado", destaca Pires.
O reforço ao caixa da União fica evidente quando se olha o Projeto de Lei Orçamentária de 2021. Na época, o governo estimava que o barril de petróleo teria um preço médio de US$ 44,49, praticamente metade do valor atual, e que a cotação do dólar encerraria o ano em R$ 5,11.
"O governo (federal) e os estados estão ganhando mais com os preços altos", afirma David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da ANP. "E há um ponto interessante: a gente não percebe uma redução drástica de consumo mesmo com os preços elevados."
No caso do etanol, a alta dos preços se deve a questões climáticas, como seca e geada, que vêm impactando a safra de cana-de-açúcar, a matéria-prima do combustível.
União versus estados
A disparada dos valores nas bombas abriu mais uma crise entre o presidente Jair Bolsonaro e os governadores. Bolsonaro passou a cobrar publicamente que os estados reduzissem o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para que, dessa forma, os preços da gasolina e do diesel recuassem.
O ICMS é o principal imposto arrecadatório dos estados e tem um peso grande na formação de preço dos combustíveis . Na semana passada, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) aprovou o congelamento por 90 dias do chamado "preço médio ponderado ao consumidor final". A medida, no entanto deve ter pouco efeito no preço pago nas bombas.
Não vai acontecer nada demais (com o preço). Os estados já tiveram uma arrecadação extra bastante importante, assim como o governo federal e a Petrobras também tiveram", afirma Zylbersztajn. "Todo mundo que vive do mercado de petróleo ganhou dinheiro."
A União também já alterou a tributação sobre o diesel e o gás de cozinha como forma de reduzir o valor aos consumidores, mas a medida foi inócua.
O governo Bolsonaro editou, em março, um decreto no qual zerou as alíquotas de PIS e Cofins que incidem sobre óleo diesel e gás de cozinha. A redução valeu nos meses de março e abril, para o diesel, e segue em vigor no caso do botijão.
"Meses atrás, o presidente Bolsonaro determinou que não se recolhesse PIS e Cofins. E a queda no preço foi quase nenhuma porque a Petrobras continuou aumentando o preço do diesel", pondera Pires.
O que pode ser feito?
Os analistas dizem que são necessárias medidas estruturais para resolver a disparada do preço dos combustíveis.
Fundo de estabilização
Na avaliação de Pires, o governo deveria criar um fundo de estabilização para evitar repasses de preço ao consumidor nos momentos de forte alta da cotação do petróleo.
"O fundo não vai resolver o problema de aumento do preço do combustível", pondera o diretor do CBIE. "Mas ele vai ajudar em duas coisas: diminuir a volatilidade, ou seja, não vai haver um repasse tão rápido para o consumidor. E pode reduzir um pouco o preço. Tem de fazer a conta, mas é possível reduzir."
Hoje, nos cálculos dele, se o governo quiser dar botijão de graça para 17 milhões de famílias - população que deve passar a ser beneficiada com o Auxílio Brasil a partir de dezembro -, o custo será de R$ 10 bilhões por ano. Já uma redução de 10% no preço do diesel teria um gasto estimado entre R$ 11 bilhões e R$ 12 bilhões.
"É muito dinheiro, mas o dividendo da Petrobras foi de R$ 23 bilhões."
Nos períodos de baixa da cotação do petróleo, esse fundo seria capitalizado, segundo Pires, com o governo não reduzindo o preço do combustível na mesma intensidade da queda da cotação do barril.
"Como o petróleo é volátil, ele pode ir a US$ 50 (o barril) daqui a pouco e aí todo mundo se esquece do problema que estamos vivendo hoje. Mas lembraremos dele na próxima crise", alerta Pires.
Segundo o blog da Ana Flor, o governo trabalha numa medida provisória que vai criar um fundo de estabilização para amenizar a alta dos preços do diesel e do gás de cozinha. A medida não deve incluir a gasolina.
Políticas de médio e longo prazos
Para Zylbersztajn, o fundo de estabilização não é o melhor caminho. Segundo ele, só valeria a pena um subsídio para a compra do gás de cozinha pela "questão emergencial e social".
"É uma questão de solidariedade com pessoas que não têm como pagar R$ 100, R$ 120 num botijão de gás."
O Brasil, afirma o ex-diretor da ANP, deveria investir em políticas de médio e longo prazos e isso passa por acabar com o monopólio da Petrobras na área de refino, por exemplo.
"Mesmo que o preço esteja relativamente alinhado (com o mercado externo), o fato de não ter competição não traz clareza e transparência na formação dos custos e de quanto efetivamente ela poderia vender (o combustível)."
Ele também ressalta que o país deveria discutir medidas para acabar com a dependência do petróleo.
"Até que ponto, com essa discussão enorme sobre a substituição dos combustíveis fósseis, o país vai subsidiar combustíveis que têm origem no petróleo e no gás natural", questiona Zylbersztajn. "Uma política responsável passa por criar mecanismos (de solução) de médio e longo prazos."
Por Bianca Lima e Luiz Guilherme Gerbelli, GloboNews e g1
09/11/2021 06h00 Atualizado há 44 minutos
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