Generais endossam críticas de Bolsonaro a Moraes e ao TSE, mas rejeitam ingerência

As críticas de Jair Bolsonaro (PL) contra o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e o ministro Alexandre de Moraes, presidente da corte, têm encontrado respaldo entre oficiais-generais das Forças Armadas.

Cinco generais ouvidos pela reportagem fazem eco ao discurso de perseguição de Bolsonaro e afirmam reservadamente que Moraes tem extrapolado em decisões, chegando a cometer ilegalidades. Eles citam decisões do TSE sobre direitos de resposta concedidos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a tese apresentada pela campanha bolsonarista sobre um suposto boicote de programação eleitoral do mandatário que teria sido promovido por rádios no Nordeste.

Existe a percepção entre os militares que as denúncias sobre as rádios não deveriam ser descartadas antes de uma apuração mais extensa. Para eles, não é razoável que Moraes tenha rejeitado o caso em cerca de 24 horas e mandado investigar a campanha de Bolsonaro sem antes abrir uma apuração sobre o suposto boicote.

Apesar da opinião dos militares, a tese bolsonarista tem uma série de fragilidades. As próprias rádios citadas nos relatórios que compõem a denúncia contestam a afirmação de boicote. Além do mais, o ministro Fábio Faria (Comunicações) disse estar arrependido de ter participado da apresentação à imprensa que lançou a tese do suposto boicote.

“Me arrependi profundamente de ter participado daquela entrevista coletiva. Se eu soubesse que [a crise] iria escalar, eu não teria entrado no assunto”, disse Faria à coluna da jornalista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo.

De acordo com o ministro, a iniciativa desandou quando bolsonaristas passaram a usar o fato para pedir o adiamento das eleições.

Apesar das queixas contra Moraes, militares ouvidos afirmam que o assunto é de responsabilidade dos partidos e da Justiça Eleitoral e que as Forças Armadas não devem embarcar em qualquer tipo de tese de adiamento de eleições.

Há também no Ministério da Defesa uma insatisfação com a resposta dada por Moraes ao ofício do ministro Paulo Sérgio Nogueira que sugeria ajustes na fiscalização do segundo turno das eleições, especialmente no teste de integridade.

O presidente da corte eleitoral disse que só analisará as sugestões dos militares e da CGU (Controladoria-Geral da União) após a entrega, pelos militares, dos relatórios da fiscalização do pleito —o que no caso da Defesa está prevista para o início de 2023.

Mesmo reconhecendo contrariedade com o chefe do TSE, os oficiais-generais dizem que o único foco das Forças Armadas no período eleitoral é organizar as operações de GVA (Garantia de Votação e Apuração), como fazem tradicionalmente em apoio à Justiça Eleitoral.

No primeiro turno, 34 mil militares atuaram em 585 municípios espalhados em 13 estados para o apoio logístico, com o envio das urnas e auxílio à segurança dos eleitores.

A gestão de Moraes vem, até este momento, decepcionando militares de alta patente. Havia expectativa no Ministério da Defesa que a interlocução com o TSE melhorasse com a chegada do ministro à presidência do tribunal, após um período de embates entre as Forças e o ex-presidente Edson Fachin.

Moraes assumiu o TSE em agosto deste ano, assim que começaram as eleições.

As Forças Armadas foram incluídas pelo TSE na lista de entidades fiscalizadoras da eleição. Bolsonaro costuma fazer ataques sem provas às urnas eletrônicas e afirma que irá aguardar relatório dos militares sobre a lisura do pleito para aceitar o resultado da eleição.

Nesta semana, Bolsonaro tentou mais uma vez envolver os militares em suas acusações contra a lisura das eleições.

Bolsonaro alterou sua agenda de campanha, na noite de quarta-feira (26), para fazer um pronunciamento e uma reunião no Palácio da Alvorada. Ele chamou para a reunião sobre o tema comandantes das Forças e ministros do governo.

Em sua declaração, ele disse ter provas “contundentes” de que foi prejudicado por supostamente terem sido transmitidas mais inserções de Lula do que dele.

“Certos lugares que achava que iria bem e poderia até ganhar, nossa análise —pode ter havido outros fatores— vimos que perdemos. Com toda a certeza, as inserções de rádio fizeram a diferença ou poderiam ter feito a diferença. Não existe outro fator que a gente possa levar em conta nesse momento”, disse o chefe do Executivo, que no momento do pronunciamento estava acompanhado apenas pelos ministros Anderson Torres (Justiça) e Augusto Heleno (Segurança Institucional).

A ida dos comandantes das três Forças para a reunião com Bolsonaro no Palácio da Alvorada foi uma surpresa para oficiais-generais dos Altos Comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

O convite foi feito às pressas. O assunto, segundo um general ouvido pela reportagem, era o que foi classificado por militares próximos ao presidente como as últimas ilegalidades cometidas por Moraes.

A manifestação de Bolsonaro foi feita logo após Moraes rejeitar a ação apresentada pela campanha de reeleição sobre o suposto boicote de rádios na veiculação de propaganda eleitoral.

Na decisão, o presidente do TSE afirma que Bolsonaro não tem provas e se baseia em levantamento de empresa “não especializada em auditoria”.

O ministro apontou possível “cometimento de crime eleitoral com a finalidade de tumultuar o segundo turno do pleito em sua última semana” e mandou o caso para ser avaliado dentro do inquérito das “milícias digitais”, que é relatado por ele mesmo no STF (Supremo Tribunal Federal).

Moraes também encaminhou a decisão à Procuradoria-Geral Eleitoral e ao corregedor-geral do TSE. “Para instauração de procedimento administrativo e apuração de responsabilidade, em eventual desvio de finalidade na utilização de recursos do fundo partidário dos autores.”

Um dia após a reunião dos comandantes, Paulo Sérgio Nogueira se reuniu virtualmente com os comandantes de Operações Conjuntas das Forças para receber os relatos de como está o andamento das soluções logísticas para o transporte das urnas pelo Brasil.

Também na quinta (27), Paulo Sérgio teve uma nova reunião com os comandantes Freire Gomes (Exército), Baptista Júnior (Aeronáutica) e Almir Garnier (Marinha). Os encontros são periódicos e tratam de assuntos de interesse das três Armas.

Um dos principais pilares do bolsonarismo sempre foi a proximidade com os fardados, o que cunhou o apelido de ala militar aos integrantes do seu entorno que são egressos das Forças Armadas.

Cézar Feitoza/Marianna Holanda/Folhapress

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