Fim das privatizações põe em xeque seis projetos já em curso

A decisão de acabar com as privatizações no país, anunciada na terça-feira (13) pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afeta diretamente seis processos de desestatização de ativos federais que já vinham sendo tocados pelo PPI (Programa de Parcerias e Investimentos).

Para economistas, pode ter impacto também na situação fiscal do país, já que privatizações podem ser usadas para abater dívida ou reduzir necessidade de capitalizar empresas, além de lançar dúvidas sobre o destino de estatais dependentes que consumiram R$ 21 bilhões do orçamento de 2021.

Entre os processos em curso no PPI, o mais avançado é o da Emgea (Empresa Gestora de Ativos) responsável por recuperar créditos da União. O processo está atualmente aguardando acórdão do TCU (Tribunal de Contas da União).

Outros dois processos que já cumpriram a etapa de consultas públicas são considerados os mais relevantes do pacote: Correios e porto de Santos.

A suspensão da privatização dos Correios é uma promessa de campanha de Lula. No início da transição do governo, o ex-ministro das Comunicações e membro da equipe de transição Paulo Bernardo propôs encerrar o processo “logo na saída”.

Com estimativa de R$ 30 bilhões em investimentos, a privatização do maior porto brasileiro também já foi alvo de críticas pela equipe de transição do governo eleito. O governo Bolsonaro tentava realizar o leilão ainda neste ano, mas o plano não avançou.

Uma das alternativas consideradas pela equipe de transição na área de infraestrutura, liderada pela ex-ministra Miriam Belchior, é autorizar somente a privatização do acesso ao canal, em Santos —e não toda a infraestrutura (porto e o canal).

O plano do PPI inclui ainda a ABGF (Agência Brasileira de Fundos Garantidores e Garantias), que gere fundos que garantem investimentos, com estudos concluídos. Em fase de estudos, estão a Companhia Docas da Bahia e o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados).

Mas atrasada, ainda em fase de estudos, está a venda da fatia de 49% da Infraero nos aeroportos de Guarulhos, Confins, Galeão e Brasília. O processo foi retardado para aguardar a concessão dos aeroportos de Congonhas e Santos Dumont.

De todos os projetos de desestatização previstos pelo PPI, dois têm leilão marcado para este mês, antes ainda da posse de Lula. São as vendas do Ceasaminas, que administra entrepostos de alimentos em cidades mineiras, e do metrô de Belo Horizonte.

Para Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central, a decisão sobre privatizações deveria respeitar critérios pragmáticos. “O Estado não tem recurso, na medida em que está em déficit e tem dívida elevada, para financiar todas as estatais e as obras de infraestrutura.”

A necessidade de eventuais aportes em estatais ou gastos adicionais em infraestrutura, diz Meirelles, pode pressionar ainda mais as taxas de juros, já que aumenta a necessidade de financiamento do Tesouro.

A economista Elena Landau, que foi diretora de desestatização do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de 1994 a 1996 e uma das responsáveis pelo programa de privatizações dos governos Itamar Franco e FHC, questiona a ausência de planos para as chamadas empresas estatais dependentes, aquelas que precisam de recursos públicos para sobreviver.

“É ruim a possibilidade de manter empresas que não têm viabilidade, que são dependentes do Tesouro, concorrem no orçamento primário e não devolvem serviço à sociedade como a Valec ou a Telebrás.”

Ela pondera que já se esperava que Lula não estudasse a venda de grandes estatais, como Correios ou Banco do Brasil, mas “tem um grupo de empresas que o governo deveria ou vender ou fundir, porque não cumprem papel nenhum”.

São hoje 18 empresas deste tipo, que atuam em setores como pesquisa, abastecimento, transportes e saúde. Embora o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenha anunciado planos de reduzir esse número, o processo não avançou.

Em maio, o governo autorizou a fusão da Valec e da EPL, em uma empresa chamada Infra S.A. A primeira foi criada para desenvolver o trem-bala e recebeu do Tesouro R$ 518 milhões em 2021; a segunda estuda alternativas logísticas e ficou com R$ 78 milhões.
Nicola Pamplona / Folhapress

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