A surpreendente recuperação do emprego no Brasil
O mercado de trabalho mostrou recuperação robusta desde o segundo semestre de 2021, resultado de fatores cíclicos e estruturais. Embora a conjuntura tenha grande importância nesta retomada, a partir do ponto em que estamos, mudanças estruturais serão a chave para reduzir a desocupação de modo sustentado.
Do lado cíclico, é possível destacar o processo de reabertura da economia depois da pandemia, que beneficiou setores mais dependentes de interação social, geralmente serviços mais intensivos em mão de obra. Adicionalmente, os efeitos defasados da política monetária, estimulativa até meados de 2022, ajudaram a impulsionar a atividade econômica e, por consequência, o mercado de trabalho. A construção civil foi um dos setores que se beneficiaram deste cenário, com destaque na geração de empregos.
Como resultado, observamos 8,5% de desemprego em outubro passado (descontados os efeitos sazonais), a menor taxa desde 2015, com atividade econômica ainda aquecida e mercado de trabalho com sinais de dinamismo. O número de desempregados, pouco mais de 9 milhões, também é o menor desde 2015. Importante lembrar que, naquele ano, a desocupação mostrava trajetória de rápida ascensão em resposta à política monetária bastante apertada, e iniciava-se ali uma recessão profunda que se estendeu pelos anos seguintes.
A taxa de formalização atingiu em outubro o maior nível desde 2017, descontando o período em que houve distorções decorrentes do impacto maior das medidas de distanciamento sobre os trabalhadores informais (efeito-composição). A sondagem do mercado de trabalho do Instituto Brasileiro de Economia (FGV-Ibre) referente a dezembro apontou que 87,7% dos trabalhadores informais anseiam por uma ocupação formal.
Agora vemos uma desaceleração no ritmo de crescimento do emprego, que parece mais ligada a fatores de oferta de mão de obra (pessoas voltando a procurar emprego) do que a um arrefecimento da demanda (firmas precisando de mais trabalhadores).
O percentual de pessoas em idade de trabalhar que estão procurando emprego tem caído desde meados de 2022, enquanto o rendimento médio real teve expansão de 6,2% no ano (até outubro, descontados os efeitos sazonais), mesmo com a inflação bastante pressionada nesse período.
Os fatores estruturais, por sua vez, são essenciais para que o mercado de trabalho seja capaz de sustentar taxas mais baixas de desocupação e com maior formalidade no longo prazo, sem riscos de pressionar a inflação.
Avanços que permitem menor assimetria de informação entre quem procura por trabalho e quem oferta vagas de emprego; maior segurança jurídica com menor custo de transação para quem (des)contrata; e simplificação de regras, tendem a reduzir a taxa natural de desemprego, ou seja, aquela que não gera pressões inflacionárias. Essa taxa está relacionada a fricções decorrentes de trabalhadores buscando recolocação entre diferentes setores produtivos ou, ainda, se requalificando para buscar melhores oportunidades no futuro.
Neste contexto, a reforma trabalhista de 2017 possibilitou importante espaço para redução permanente da desocupação no Brasil. A redução na insegurança jurídica ao se contratar abriu espaço para uma queda permanente estimada de 1,7 ponto percentual na taxa de desemprego, de acordo com estudo recente realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (Labor Courts, Job Search, and Employment: Evidence from a Labor Reform in Brazil, 2022).
Adicionalmente, a flexibilização por meio de novas modalidades de contratação –tais como o emprego intermitente e o temporário– permite maior facilidade de adequação entre vagas ofertadas e trabalhadores, e leva a impacto positivo sobre o nível de ocupação.
A evidência internacional comprova que, mesmo entre países desenvolvidos, a maior criação de empregos está associada a ambientes com maior flexibilidade nas relações trabalhistas, menor proteção extensiva e menor taxação nas relações de trabalho, conforme estudo do FMI (Job Creation: Why Some Countries Do Better, 2000). Outro estudo recente (Key Determinants of Job Creation: A Comparative analysis between OECD Countries and Emerging Economies, 2020) mostra que tanto o crescimento econômico quanto o crescimento da produtividade geram impactos positivos sobre a criação de empregos.
Em suma, para que os ganhos recentes no mercado de trabalho se mantenham a longo prazo, é fundamental não apenas a manutenção dos avanços adotados nos últimos anos, como também novas medidas que reduzam a assimetria de informação e permitam que taxas de desemprego mais baixas sejam sustentáveis a longo prazo.
Adicionalmente, esforços para aumentar a produtividade e o crescimento potencial na economia brasileira tendem a trazer ganhos também para o mercado de trabalho, sobretudo no contexto em que o país apresenta baixa produtividade há décadas, em especial na comparação com outros emergentes.
Por fim, as possíveis consequências negativas que a pandemia trouxe para a escolaridade das próximas gerações devem ser monitoradas e corrigidas, de maneira a evitar perdas futuras na qualificação dos trabalhadores.
Em oposição, medidas voltadas à demanda, como estímulos monetários e fiscais, devem ficar contidos a endereçar questões de curto prazo. A manutenção artificial da taxa de desemprego em nível abaixo do equilíbrio tende a gerar riscos inflacionários, e a consequente necessidade de ajustes custosos posteriormente, resultando em períodos longos de desemprego elevado, como observado durante a crise de 2014-16.
Não há saída mágica para a redução do desemprego.
Ana Paula Vescovi / Folhapress
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