Lula cita mensalão, cobra aliados a agir contra corrupção e admite erros anteriores
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem repetido a aliados não querer enfrentar outro escândalo como o do mensalão —principal caso de corrupção do primeiro mandato do petista e até hoje uma fonte de desgaste para o partido.
Lula tem feito a avaliação reservada a assessores próximos. Nessas conversas, ele pede empenho na fiscalização e controle do governo; e também destaca que todos têm responsabilidade no combate à corrupção.
Segundo pessoas que acompanham o petista, Lula tem demonstrado a intenção de consolidar sua biografia com o terceiro mandato à frente do Planalto, tentando se firmar como o líder popular que derrotou a extrema direita no país e reduzir o peso eleitoral que antigos casos de corrupção tradicionalmente impõem ao PT.
A pretensão do presidente, no entanto, pode esbarrar na aliança que ele firmou com o centrão, o que inclui a nomeação em postos-chave em empresas que já foram alvo de denúncias de irregularidades.
Petistas reconhecem que corrupção é um flanco do partido. O tema, segundo membros da legenda, teve peso na votação apertada em outubro, quando Lula venceu o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por 50,9% dos votos válidos contra 49,1%.
A reportagem ouviu relatos de pessoas próximas ao presidente, que tiveram conversas reservadas com ele durante a formação do novo governo e no início da gestão.
Nas conversas, o presidente reconhece que houve erros nas gestões anteriores. Na opinião de aliados, o terceiro mandato é fundamental para que casos de corrupção como o mensalão se descolem da imagem de Lula.
Hoje com 77 anos, ele tem dito que não há espaço para erros nessa etapa da sua trajetória.
O mensalão foi um esquema ilegal de financiamento político em troca de apoio parlamentar no primeiro mandato de Lula (2003-2006). Foi revelado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. O discurso do presidente foi se ajustando ao longo do tempo até que ele passou a admitir os erros no governo, mas sem apontar culpados.
Adversários de Lula usam frequentemente denúncias de corrupção nos governos do PT —em especial o mensalão e o petrolão— como munição para atacar o petista.
Na campanha de 2022, uma das principais estratégias de Bolsonaro foi associar Lula a casos de corrupção, esperando com isso aumentar a rejeição do petista. O ex-mandatário e aliados frequentemente se referem a Lula como “ex-presidiário”, em referência aos 580 dias que o petista permaneceu preso em decorrência de condenação na Lava Jato —posteriormente anulada.
Como resposta, a estratégia eleitoral do PT foi defender mecanismos anticorrupção criado nos governos Lula e Dilma Rousseff.
Durante a campanha, Lula foi questionado sobre o mensalão no Jornal Nacional. Na ocasião, ele insistiu no discurso de que o governo petista criou mecanismos de investigação que expuseram casos de corrupção.
Durante a campanha, Lula inclusive chegou a apresentar medidas de Dilma e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) como suas. É o caso da Lei Anticorrupção, que responsabiliza empresas por crimes contra a administração pública, sancionada por Dilma em 2013.
Outro exemplo é a criação da CGU (Controladoria-Geral da União), fundada pelo tucano em 2001.
Hoje, esses dois instrumentos —CGU e Lei Anticorrupção— devem ser usados para reforçar o sistema de fiscalização do governo. Uma ideia é ampliar a atuação do órgão de controle, que tem escritórios em todos os estados, em investigações da Polícia Federal.
Integrantes do governo Lula têm a visão de que, ao ampliar as investigações, haverá uma inibição a práticas ilícitas, além de aumentar as chances de acordos de leniência e denúncias de irregularidades.
Em entrevista à CNN Brasil nesta quinta-feira (16), Lula foi questionado sobre qual será o critério para decidir se um integrante do governo será exonerado ou não quando houver denúncia de irregularidades.
O presidente ressaltou a importância da CGU nesse processo.
“Para mim, todos, sem distinção, terão direito à presunção de inocência. Na hora em que houver uma denúncia, vamos ver internamente, através da CGU, a investigação [do caso] para saber se tem procedência a denúncia”, declarou o presidente.
“Se tiver culpa, a pessoa simplesmente sairá do governo”, completou.
Na mesma entrevista, ele minimizou o elo da ministra Daniela Carneiro (Turismo) com milicianos da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro.
Para ampliar a base do governo, Lula tem feito negociações com o centrão e distribuído cargos em estatais, como a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), que é investigada por suspeita de corrupção em obras de pavimentação.
O governo petista também fez um acordo com Arthur Lira (PP-AL) para que parte da verba de ministérios seja usada para bancar emendas de deputados novatos que ajudaram a reeleger o presidente da Câmara.
Quando o esquema do mensalão foi revelado, Lula primeiramente insinuou em uma entrevista em Paris que o caixa dois eleitoral era disseminado entre partidos no país.
Semanas depois, pressionado, fez um pronunciamento ao lado de ministros dizendo que estava indignado com as “revelações que chocam o país”.
Com o passar dos anos, mudou o tom. Em 2010, ainda como presidente, classificou a crise política vivida como uma “tentativa de golpe”.
O Supremo concluiu o julgamento do mensalão em 2013, condenando 25 pessoas, incluindo o ex-ministro José Dirceu, coordenador da vitoriosa campanha de 2002. Entre os condenados, também estavam dois líderes de partidos hoje ligados ao bolsonarismo: Jefferson, do PTB, e Valdemar Costa Neto (PL).
Após anos longe dos holofotes, Dirceu tem sido reabilitado por lideranças do PT. No ato em comemoração aos 43 anos do PT, nesta semana, o ex-ministro recebeu uma saudação de Lula.
“Companheiros e companheiras, eu quero agradecer cada um de vocês, mulheres e homens. Companheiro José Dirceu, agradecer a você porque eu sei o quanto você foi solidário ao que eu passei. Quero agradecer a todos os presidentes do partido e aqui estou vendo a Gleisi e o Rui Falcão, José Dirceu e eu mesmo já fui presidente [do partido]”, disse.
Catia Seabra/Thiago Resende/Folhapress
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