Poder de Alcolumbre vai a teste no Senado com ataque de rivais e choro
A disputa entre Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Rogério Marinho (PL-RN) pelo comando do Senado, na quarta-feira (1º), representou um teste de fogo também para Davi Alcolumbre (União-AP), parlamentar que acumulou poder nos últimos anos e, exatamente por isso, tem sido alvo de ataques de políticos que se sentem alijados –incluindo integrantes de seu próprio partido.
Pacheco –que chegou ao cargo pelas mãos de Alcolumbre e que tem no senador do Amapá seu principal cabo eleitoral– derrotou Marinho, o candidato do bolsonarismo, por 49 votos a 32.
No discurso de senadores e deputados, o resultado pode ser visto tanto como uma vitória inequívoca de Alcolumbre, mas também como o seu oposto. Ou seja, uma derrota, na opinião de um grupo menor de parlamentares.
Uma explicação sobre como isso é possível passa pela concentração de poder nas mãos do senador do Amapá e a reação que isso tem gerado.
Alcolumbre, que tem 45 anos, presidiu o Senado no biênio 2019-2020, ocasião em que montou uma robusta rede de apoio interno por meio da distribuição entre os parlamentares das bilionárias verbas orçamentárias das emendas de relator.
Após ter a reeleição barrada por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), que vetou a possibilidade de recondução ao cargo dentro da mesma legislatura, fez de Pacheco seu sucessor em fevereiro de 2021.
Alcolumbre saiu da cadeira máxima do Senado e assumiu outra também poderosa: o comando da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), onde deve continuar nos próximos anos.
Ele também foi escolhido pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), durante a fase de transição, para ser o interlocutor da União Brasil nas negociações de adesão do partido ao Palácio do Planalto.
Com isso, apadrinhou dois dos três ministros direcionados por Lula à legenda: Waldez Góes (Integração) e Juscelino Filho (Comunicação).
Essa foi a gota d’água para que o senador virasse alvo de uma rebelião interna no partido, que é uma colcha de retalhos ideológica forjada no campo da direita.
A União Brasil foi criada em fevereiro do ano passado por meio da fusão de DEM (ex-PFL e com origem na Arena, a sigla de sustentação do regime militar) e o PSL, o partido nanico que virou grande ao eleger Jair Bolsonaro em 2018.
O caldeirão de insatisfações engrossou na atual disputa ao comando do Senado, quando Alcolumbre se colocou mais uma vez como o cabo eleitoral de Rodrigo Pacheco.
Diferentemente do presidente reeleito do Senado, que tem postura mais institucional e distante do corpo a corpo tão prezado por boa parte do mundo político, Alcolumbre é um político ao estilo clássico, que preza o contato direto a caloroso –como mostram fotos de Alcolumbre registradas nos momentos anteriores à eleição.
A grande concentração de poder em torno de um único político foi usada como discurso de campanha contra Pacheco por Marinho e aliados, além de desafetos dentro da União. Ou seja, usou-se à exaustão a tese de que reeleger o senador de Minas reforçaria ainda mais o poder de Alcolumbre, desde já um dos principais cotados para suceder o próprio Pacheco em 2025.
Esse argumento, reconhecem até aliados de Alcolumbre e Pacheco, reforçou a candidatura de Marinho, que, mesmo sendo oposição e disputando o cargo contra a máquina federal, conseguiu reunir 40% dos votos da Casa.
Daí, concluem os adversários, mesmo com a vitória de Pacheco, Alcolumbre sai como o “grande derrotado” –expressão usada reservadamente por dois deles– da eleição no Senado por dois motivos.
Primeiro, por ter dificultado a reeleição do senador por Minas, já que a dissidência contra Pacheco, por exemplo, teve como um dos principais líderes o senador Lucas Barreto, do mesmo PSD, rival de Alcolumbre no Amapá.
Segundo, por ter ficado claro que há uma insatisfação no Senado contra sua concentração de poder não só dentro da União Brasil, mas também fora da legenda, o que se refletirá na eleição de 2025 (o mandato de presidente do Senado é de dois anos).
O fato é que o grupo político de Pacheco e integrantes do governo consideram que Alcolumbre passou no teste de fogo e entregou na quarta o que prometeu, incluindo o voto de ao menos seis dos nove integrantes da União para Pacheco –Sergio Moro (PR) e Alan Rick (AP) estariam entre os pró-Marinho (a votação é secreta).
Depois do resultado de quarta, o parlamentar do Amapá chegou a chorar dentro de seu gabinete ao se reunir para comemorar com familiares, amigos, assessores e aliados, entre eles o senador Jayme Campos (União-MT).
A Folha confirmou a informação com fontes distintas.
De acordo com esses relatos, Alcolumbre fez um discurso emocionado no gabinete, se dizendo injustiçado com as críticas de que havia se tornado um peso para a candidatura de Pacheco. Também salientou a diferença conseguida, de 17 votos. Ele teria afirmado ainda que fez o que achava ser melhor para o Brasil, já que, em suas palavras, uma vitória de Marinho representaria um retrocesso.
Alcolumbre nega concentração de poder e tem citado em conversas, por exemplo, o apoio a Efraim Filho (PB) para a liderança do partido no Senado.
Procurado, o senador afirmou à Folha que as críticas são uma tentativa de anular um cabo eleitoral de Pacheco. “Mesmo os adversários reconhecem que tenho alguma importância na articulação dentro do Parlamento. Fui deputado por três mandatos, fui senador, fui presidente da Casa, presidente da CCJ, líder”, disse.
“Não se pode agradar a todos, mas tenho um trabalho reconhecido no Congresso, e que é respeitado e respeitoso. Penso que foi mais uma tentativa de anular, de tirar do jogo um articulador da candidatura do presidente Pacheco. O resultado fala por si.”
Alcolumbre diz ter sido apenas um eleitor e cabo eleitoral de Pacheco, a quem considera “o nome certo na hora certa”.
Ele também negou que sua atuação faça parte de qualquer acordo envolvendo a disputa de 2025. “Isso é uma precipitação sem lógica. Meu trabalho é dia a dia. Minha única pretensão é seguir trabalhando no Senado Federal nas pautas essenciais para o Brasil e para o meu Amapá.”
Em uma coisa, aliados e adversários de Alcolumbre concordam: haverá mais testes de fogo para o senador.
Com a volta do Congresso aos seus trabalhos, o governo Lula buscará aprovar, entre outros projetos, a reestruturação da Esplanada dos Ministérios, que subiu de 23 para 37 pastas, o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária, além de projetos visando dar uma resposta institucional aos ataques golpistas de 8 de janeiro.
É esperado no PT e no governo que a União Brasil seja um dos principais focos de tensão na relação, já que pode nessas votações apresentar traições significativas na Câmara e no Senado, apesar de ter três ministérios.
Entre outros pontos de preocupação, há temor de derrota em medidas provisórias.
Qualquer sinal de rebelião relevante na União Brasil será debitado na conta de Alcolumbre.
Alguns parlamentares da União Brasil ouvidos pela Folha, porém, dizem que o avanço da distribuição de cargos de segundo e terceiro escalões estão beneficiando outros líderes da legenda, entre eles o deputado Elmar Nascimento (BA), que teve a ida para um ministério vetada pelo PT.
Com isso, alguns parlamentares da União mais alinhados ao Planalto dizem que o partido entregará proporcionalmente mais votos ao governo do que MDB e PSD, siglas de centro-direita que também ganharam três ministérios cada.
RAIO-X
Davi Alcolumbre, 45 Vereador, deputado federal por três mandatos e eleito senador em 2014, foi alçado ao posto máximo do Senado no início do governo Bolsonaro. Na ocasião, enfrentou Renan Calheiros (MDB-AL) com o apoio do Palácio do Planalto. Na sua gestão, construiu uma rede de apoio a partir do controle sobre as bilionárias emendas de relator. Depois de eleger o aliado Rodrigo Pacheco em 2021, passou a presidir a CCJ, a comissão mais importante do Senado
Ranier Bragon/Folhapress
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