Bancada evangélica diz que Receita sob Lula reavalia atos de Bolsonaro por perseguição

Líderes da bancada evangélica no Congresso afirmam que a reavaliação de benefício tributário concedido na gestão Jair Bolsonaro (PL) ao segmento representa uma perseguição política por parte do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Formada em grande parte por integrantes do PL de Bolsonaro, a bancada promete resistir a eventuais mudanças na interpretação do Fisco.

“Tivemos reuniões com a Receita desde o governo Michel Temer [2016-2018] e, depois, na época do governo do presidente Bolsonaro. Tínhamos uma série de pedidos, a Receita aos poucos foi entendendo o que tinha acontecido e chegou ao ponto de a gente conseguir resolver 70% dos problemas”, afirma o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que presidiu a frente evangélica até fevereiro deste ano.

“A gente tem clareza de que a Receita durante os governos petistas foi usada através de instruções normativas para perseguir o segmento religioso”, diz.

Como mostrou a Folha, a isenção tributária a pastores evangélicos publicada pela Receita às vésperas da campanha eleitoral de 2022 está passando por reavaliação interna do Fisco, sob suspeita de ter ocorrido de forma atípica.

O ADI (Ato Declaratório Interpretativo) nº 1, de 29 de julho de 2022, ampliou o alcance da isenção previdenciária a pastores —forte núcleo de apoio a Bolsonaro, então candidato à reeleição— e também está sob investigação do TCU (Tribunal de Contas da União).

Um dos pontos detectados, de acordo com envolvidos na análise, é que a edição do ato não passou pela avaliação técnica da subsecretaria de tributação da Receita.

O ato, que trata da prebenda —valor fixo recebido pelos pastores e líderes religiosos, em geral para sua subsistência—, foi o capítulo final de uma longa lista de projetos aprovados pelo Congresso por pressão da bancada evangélica que resultaram em anistia e isenção a igrejas evangélicas.

A lei isenta a prebenda do recolhimento, pelas igrejas, de contribuição previdenciária, desde que ela tenha relação com a atividade religiosa e não seja vinculada a alguma espécie de produtividade.

A Receita, porém, detectou nos últimos anos que algumas igrejas adotavam um sistema similar ao da participação nos lucros de empresas privadas. Ou seja, a distribuição de altas somas de dinheiro que premiavam pastores e líderes religiosos de templos com maior arrecadação de dízimos.

Apesar de reconhecer a contribuição de Bolsonaro, Sóstenes diz considerar injusta a afirmação de que o ex-presidente foi o responsável pelas medidas em prol da bancada evangélica devido ao veto que ele aplicou em 2020 a um artigo que aprovava uma anistia aos religiosos. O próprio Bolsonaro, porém, estimulou o Congresso a derrubar o seu veto.

“Ele não resolveu, nós [Congresso] é que resolvemos por nós mesmos. Ele até contribuiu, ajudou as reuniões, botou o Paulo Gudes [ministro da Economia] e o secretário da Receita em reuniões com a gente, na sala dele, na Presidência, mas na hora que ele teve que sancionar nossa lei, ele vetou [parcialmente]. Ele não tem responsabilidade legal sobre isso.”

O atual presidente da frente evangélica, deputado Eli Borges (PL-TO), afirma concordar com eventual reavaliação do ato da Receita, desde que seja para deixá-lo mais claro no sentido da isenção para o exercício do sacerdócio.

“Não podemos perder as conquistas, nós queremos ampliá-las. A igreja faz relevante trabalho para a sociedade brasileira praticamente a custo zero. Os pastores prestam relevante serviço para a sociedade, com a doação sacerdotal, e precisam ser respeitados nessa questão tributária. Naturalmente existe a questão pessoal de cada um. Aí, fora do sacerdócio, entendemos que a lei tem que alcançar a todos”, diz.

O deputado Pastor Marco Feliciano (PL-SP) afirma considerar a publicação da Receita de 2022 um ato jurídico perfeito, que só é revisto agora por razões políticas.

“Usam-se lupas para debruçar sobre tudo que envolva as igrejas, a fim de criar factoides, reformando tudo que foi elaborado pelo governo passado”, afirma. “No que se refere a assuntos de interesse social dos cristãos, a ampliação do alcance da isenção previdenciária a pastores não pode ser encarada como privilégio, mas questão de justiça.”

Segundo ele, a base Evangélica no Congresso está em alerta para resistir a eventuais mudanças.

A Receita enviou as informações sobre o caso ao TCU em fevereiro deste ano. O tribunal havia aberto ainda em 2022 um procedimento para investigar possíveis irregularidades na edição do ADI. Ao fim desse procedimento, a normativa poderá ser total ou parcialmente revista.

Ranier Bragon/Folhapress

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