Lula cedeu com perda de poder de Marina e agiu para blindar Casa Civil de Rui Costa em MP
Operação do Planalto foi para preservar prioridades de presidente, como manter PPI com Rui Costa e extinguir Funasa |
O Palácio do Planalto agiu para tentar evitar derrotas em áreas prioritárias para o presidente Lula (PT) na medida provisória da reorganização da Esplanada dos Ministérios.
Com aval de Lula, a articulação política do governo cedeu à pressão do centrão, principalmente dos ruralistas, para blindar a Casa Civil, responsável pela execução dos projetos mais importantes para o presidente, como o PPI (Programa de Parceria de Investimentos).
A ideia de retirar poderes do ministro Rui Costa (Casa Civil) foi debatida por líderes do Congresso em meio a insatisfações com a articulação política do governo. Rui adotou um perfil mais técnico no comando da pasta, em vez de também participar de negociações com parlamentares.
O saldo da negociação do novo formato da Esplanada foi negativo para a ministra Marina Silva (Meio Ambiente), cuja pasta foi esvaziada com transferência de atribuições para outros ministérios.
Um exemplo é o CAR (Cadastro Ambiental Rural), o instrumento para controlar terras privadas e conflitos em áreas de preservação. De acordo com o relatório do deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), o CAR deverá sair do ministério chefiado por Marina e seguir para a pasta da Gestão e Inovação em Serviços Públicos.
Interlocutores de Lula também atuaram para evitar que o relator propusesse a recriação da Funasa, extinta no início do governo. O centrão pressiona para a reativação do órgão. A ideia é que Isnaldo inclua no texto um dispositivo que autoriza sua extinção e delega ao governo a palavra final sobre o assunto.
A avaliação no Planalto é que as concessões previstas no relatório de Isnaldo seriam inevitáveis com a atual correlação de forças no Congresso. A ala política tinha o diagnóstico de que seria muito difícil enfrentar a articulação da bancada ruralista na área agrária e ambiental.
Marina, porém, já fez chegar ao Planalto a insatisfação com a perda de atribuições. Nesta terça-feira (23), em entrevista, ela criticou as medidas.
“Qualquer tentativa de desmontar o sistema ambiental brasileiro é um desserviço”, disse a ministra do Meio Ambiente, que já enfrenta uma disputa interna no governo diante do desejo da Petrobras de explorar petróleo na bacia da foz do rio Amazonas.
Além disso, o relatório da MP que muda a estrutura da Esplanada prevê a transferência da gestão da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. Hoje a estrutura está com o Meio Ambiente.
A Integração é comandada por Waldez Góes —apesar de ser do PDT, ele foi uma indicação de parlamentares da União Brasil.
Outra desidratação da pasta de Marina consiste na mudança de sistemas de informações para o Ministério das Cidades, comandado por Jader Filho (MDB-PA). São eles: Sinisa (Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico), Sinir (Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos) e Singreh (Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos).
Alvo de disputa entre ruralistas, a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) também deverá ter suas competências desmembradas.
Sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), o órgão estava vinculado à pasta da Agricultura, atualmente comandada por Carlos Fávaro (PSD). Com a MP original, editada por Lula no início do governo, ela foi transferida para o Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, chefiado por Paulo Teixeira (PT).
O relatório do deputado não retira a Conab do Desenvolvimento Agrário, mas transfere parte de suas competências de volta à Agricultura. Essas mudanças foram negociadas com as pastas de Teixeira e Fávaro.
Isnaldo não incluiu no seu relatório o conteúdo da medida provisória que transfere o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Banco Central para o Ministério da Fazenda, possibilidade que era ventilada nos bastidores.
Congressistas já dão como certa que essa matéria irá perder a validade e, portanto, o conselho deverá voltar para a alçada do BC. Integrantes da equipe econômica minimizaram os efeitos de eventual perda de validade da MP para transferência do órgão.
Ao deixar uma reunião com o presidente Lula, no Palácio da Alvorada, o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) afirmou que ainda é possível fazer “ajustes” até a votação da medida provisória na comissão, mas minimizou as mudanças promovidas pelo relator.
Padilha ainda acrescentou que o texto foi todo negociado com o conjunto do governo. Segundo ele, trata-se de um relatório “equilibrado”, que mantém o espírito inicial da proposta do governo.
“É natural que o Congresso Nacional, sobretudo uma comissão mista, que debate Câmara e do Senado, queira fazer contribuições. São contribuições que mantêm o espírito inicial da reestruturação do governo, ou seja, aquelas questões centrais estão mantidas”, afirmou.
“Eu considero que o relatório é positivo, ele mantém questões centrais que o governo queria estabelecer, inclusive incorpora elementos muito importantes e faz equilíbrios”.
Catia Seabra, Thiago Resende e Renato Machado / Folha de São Paulo
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