STF aumenta pressão por regras duras contra big techs e encurrala Congresso

O STF (Supremo Tribunal Federal) intensificou a pressão para que as redes sociais sejam responsabilizadas por conteúdos publicados, numa articulação que levantou novas críticas no Congresso Nacional sobre uma suposta invasão do Judiciário em prerrogativas do Legislativo.

A ofensiva do STF ocorre em meio à discussão ainda emperrada na Câmara dos Deputados sobre o PL das Fake News. A proposta envolve a regulação das redes, mas enfrenta forte resistência das chamadas big techs —entre elas Google e Meta.

A maioria dos integrantes do Supremo é a favor de regulamentar a atuação dessas plataformas. Alguns ministros já defenderam publicamente a criação de mecanismos para isso, em especial Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.

Nos últimos dias, houve uma série de movimentos no STF que elevaram a cobrança sobre o Legislativo.

A presidente da corte, Rosa Weber, decidiu na terça (9) pautar o julgamento que envolve o Marco Civil da Internet já na próxima semana, o que poderá antecipar um desfecho judicial em caso de demora na votação do PL das Fake News na Câmara.

A tendência, no entanto, é que a colocação do assunto na pauta tenha impacto por ora mais como instrumento de pressão. Isso porque nas sessões do plenário do STF da próxima semana, na quarta (17) e na quinta-feira (18), o tribunal deve continuar a analisar uma ação penal da Lava Jato contra o ex-presidente Fernando Collor —e, com isso, pode não haver espaço para o julgamento sobre as big techs.

Em outra frente, ministros do Supremo buscaram respaldar a iniciativa do Parlamento de regular as empresas de tecnologia, mas com manifestações vistas também como cobrança.

Na segunda (8), em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Gilmar Mendes disse esperar uma definição do Legislativo. “Eu tenho a mais absoluta convicção de que o Congresso vai resolver essa questão e vai encontrar uma solução adequada.”

Na quarta (10), Moraes afirmou que as big techs serão enquadradas e que “no Brasil nós demonstramos que não há terra sem lei”. Mais tarde, ameaçou tirar o Telegram do ar caso o serviço de mensagens não removesse texto enviado a seus usuários no qual dizia que “o Brasil está prestes a aprovar uma lei que irá acabar com a liberdade de expressão”.

Em sua decisão, Moraes disse que as mensagens configurariam “flagrante e ilícita desinformação atentatória ao Congresso, ao Poder Judiciário, ao Estado de Direito e à Democracia Brasileira”.

Os ministros do STF entendem que o ideal seria o Legislativo tratar do tema e aprovar uma lei que regulamente o setor. No entanto, acreditam que, caso isso não seja feito, o STF será obrigado a atuar devido ao que os ministros veem como uma omissão legislativa.

A votação do PL das Fake News foi adiada em 2 de maio na Câmara diante do risco de derrota do governo Lula, que apoia a proposta. Dois dias depois, o ministro Dias Toffoli liberou para julgamento no STF os recursos com repercussão geral sobre o Marco Civil da Internet.

Em audiência sobre o tema em março, Moraes disse que o modelo atual de regulação das redes sociais é “absolutamente ineficiente”, “falido” e “destrói reputações e destrói dignidades”. Ele disse ainda que as plataformas foram instrumentalizadas nos ataques golpistas de 8 de janeiro.

No Congresso, a avaliação entre líderes partidários é de que o STF ensaia invadir a esfera de atribuição do Legislativo para regulamentar um tema que, para eles, deveria ser decidido pelos parlamentares.

Apesar da avaliação negativa, já é dado como certo entre congressistas que o Supremo irá tratar do assunto.

O cenário mais pessimista é o da eventual reprovação do projeto de lei no Congresso. Nesse caso, o tribunal caminha para, sozinho, derrubar o trecho do Marco Civil da Internet de 2014 que exime as plataformas de responsabilidade —sobrepondo-se assim a uma decisão tomada pelos legisladores há quase dez anos.

O Supremo deve ir além e também estabelecer parâmetros que não estão previstos em lei para responsabilização das big techs de acordo com a gravidade dos conteúdos publicados nas plataformas.

Nem a eventual aprovação do PL das Fake News descarta a possibilidade de o STF debater os pormenores da regulação das redes sociais.

As dificuldades para construir um texto que tenha votos da maioria têm ampliado a chance de ser aprovado um projeto pouco rígido em relação às big techs. Caso isso se concretize, a tendência é que o tribunal atue para tornar mais duras as regras para as plataformas.

O cenário em que o Congresso regulamente o tema da maneira que o Supremo vê como ideal e fixe penas duras para as empresas de tecnologia é o menos provável no momento.

A tentativa de pressão do Supremo sobre o Congresso em uma pauta que os ministros consideram de extrema importância não é incomum.

No fim do ano passado, à espera de uma decisão do Congresso para pôr fim às chamadas emendas de relator, Rosa Weber pautou ações sobre o tema para as últimas semanas de julgamento do ano.

O Congresso reagiu e, entre uma sessão e outra do Supremo, aprovou um projeto de resolução que fixava critérios para a distribuição das chamadas emendas de relator-geral do Orçamento.

O texto, porém, não agradou aos ministros, que decidiram declarar as emendas de relator inconstitucionais por 6 votos a 5.

O caso da regulação das redes sociais pode seguir um caminho parecido.

Rosa pautou a análise dos processos sobre as big techs no mesmo dia em que o Telegram provocou uma reação de governo, Congresso e Ministério Público após enviar mensagem a usuários da plataforma distorcendo o PL das Fake News.

O Marco Civil, de 2014, é a principal lei que regula a internet no Brasil e determina que as plataformas só podem ser responsabilizadas civilmente por conteúdos de terceiros se não cumprirem ordens judiciais de remoção.

Em um dos casos pautados no Supremo, uma mulher pede indenização ao Facebook por causa de um perfil falso criado em seu nome. Outro caso envolve uma professora de Minas Gerais contra o Google —ela foi alvo de ofensas em uma comunidade do extinto Orkut.

Matheus Teixeira e José Marques/Folhapress

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