Tribunal derruba audiência e liberação de R$ 35 mi de Palocci decididas por juiz da Lava Jato

O TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) derrubou duas decisões do juiz federal Eduardo Appio que atendiam a pedidos da defesa do ex-ministro Antonio Palocci.

Além de cancelar uma audiência na qual Palocci seria ouvido sobre eventuais “excessos e erros” da Operação Lava Jato, marcada pelo magistrado de primeiro grau para ocorrer nesta sexta-feira (19), o tribunal de segunda instância também anulou outra decisão de Appio que liberava R$ 35 milhões de uma conta ligada ao ex-ministro.

Desde o início do ano, Appio está à frente da 13ª Vara de Curitiba, responsável pelos processos remanescentes da Lava Jato. Crítico de métodos antigos da investigação, o juiz tem tomado decisões favoráveis aos réus com frequência, revendo posições de outros magistrados.

“Considerando o princípio constitucional da presunção de inocência, os bens constritos não podem ficar eternamente sob confisco do Estado brasileiro”, escreveu Appio em 12 de maio, ao decidir pela liberação de R$ 35 milhões para Palocci.

Ele justificou, ainda, que o cálculo de danos ocasionados pelo acusado, segundo o MPF (Ministério Público Federal), foi “meramente conjectural e não representa a responsabilidade em concreto, especialmente quando se considera o grande número de bens imóveis que podem servir de garantia ao juízo”.

Por volta das 14h30 desta sexta, o juiz do TRF-4 Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz derrubou a decisão, atendendo a um pedido do MPF.

De acordo com os procuradores da República, a conta com R$ 35 milhões estava atrelada a uma ação penal que, por força de uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), já foi transferida para a Justiça Eleitoral do Distrito Federal. Além de alegar incompetência da Vara de Curitiba no caso, o MPF também reclama que não foi intimado por Appio sobre o caso.

Em ofício encaminhado ao juiz de segunda instância, Appio afirma que “tão somente deu cumprimento à decisão proferida pelo Juízo da 10ª Vara Federal do DF e que o Ministério Público Federal em Curitiba acompanhou e concordou com esta decisão liberatória de valores que são de propriedade de Antonio Palocci Filho e esposa (meação)”.

Em outra decisão do TRF-4, na qual a audiência de Palocci com Appio foi cancelada, o tribunal de segunda instância também aponta incompetência da Vara de Curitiba.

O MPF afirma que assuntos ligados ao acordo de colaboração de Palocci são de competência da 8ª Turma Criminal do TRF-4, o que foi acolhido pelo magistrado de segundo grau.

“Acaso a defesa tenha interesse em discutir o acordo de colaboração, cabe a ela provocar esta corte regional em procedimento próprio”, escreve o juiz federal de segunda instância Loraci Flores de Lima, em decisão assinada no final da tarde de quinta (18).

A reportagem procurou a defesa de Palocci, mas ainda não obteve retorno.

Por meio de uma petição apresentada pelo advogado Tracy Reinaldet, Palocci tinha se colocado à disposição de Appio para esclarecer o contexto da sua prisão, do seu acordo de colaboração premiada e também apontar “excessos e erros” da Lava Jato.

Sem antecipar fatos específicos, Palocci disse que seu objetivo era contribuir para o aprimoramento do sistema de Justiça penal, para “torná-lo mais democrático e garantista”.

Ao receber a petição, na segunda (15), Appio determinou no mesmo dia que uma audiência com Palocci fosse realizada nesta sexta, em caráter de urgência. O magistrado escreve, ainda, que o depoimento se justifica “diante do que foi noticiado pelo diligente advogado em relação a eventuais abusos e prática de tortura contra Antonio Palocci”.

Críticos da Lava Jato, como o ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), tem usado a expressão “tortura” para se referir a ordens de prisão que têm por finalidade forçar o acusado a delatar. Appio já se disse garantista e contrário aos métodos de antigas autoridades da operação, como o ex-procurador Deltan Dallagnol.

Em decisão assinada na madrugada desta sexta, Appio convocou Deltan para prestar depoimento, na condição de testemunha, no dia 19 de junho. Alega que precisa ouvir o ex-procurador sobre se há “vínculo de amizade pessoal e íntima” com o procurador da República Walter Jose Mathias Junior, membro do MPF que atualmente atua nos processos do advogado e réu Rodrigo Tacla Duran.

Ao convocar Deltan, o juiz escreve, ainda, que a audiência deve ser realizada no formato presencial, “haja vista ser fato notório que a referida testemunha não mais ostenta prerrogativa de foro ou os privilégios legais inerentes ao mandato de deputado federal”.

Eleito deputado federal pelo Podemos do Paraná nas urnas do ano passado, Deltan teve o mandato cassado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na última terça (16). Ele ainda pode recorrer —a cassação ainda não tramitou internamente na Câmara dos Deputados.

Appio destaca que Tacla Duran vê “atuação parcial e eivada de suspeição” de Mathias Junior, por conta de suposta proximidade com o ex-procurador e ex-coordenador da Lava Jato no MPF.

Durante audiências, o procurador Mathias Junior já afirmou a Tacla Duran não ter nada pessoal contra o réu e que não possui relação de proximidade com Deltan.

Denunciado por crime de lavagem de dinheiro, Tacla Duran alega que seus processos são derivados de “perseguição” de Deltan e do MPF.

Em redes sociais, Deltan já chamou Duran de “mentiroso compulsivo, criminoso confesso e lavador de dinheiro profissional” e disse que o juiz Appio, a quem chama de “juiz lulista e midiático”, “nem disfarça a tentativa de retaliar contra quem, ao contrário dele, lutou contra a corrupção”.

A reportagem procurou Deltan nesta sexta sobre a audiência de 19 de junho, mas ainda não obteve retorno.

Catarina Scortecci/Folhapress

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