Reforma prejudica o agro e votação às pressas é desnecessária, diz governador de MT
Foto: Reprodução/Facebook |
“Eu acho difícil e desnecessário [que a Câmara vote o projeto nesta semana]. Um tema tão profundo e tão abrangente como esse merece muitas reflexões”, disse em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.
A bancada ruralista é uma das mais influentes no Congresso. Representantes do setor têm articulado para que parlamentares se oponham à reforma.
A reforma tributária será prejudicial ou benéfica ao agro?
Da forma como está, não temos dúvida que ela vai ser prejudicial ao agro brasileiro, ao cidadão brasileiro e vai aumentar os impostos quando ela estiver definitivamente implantada.
Há uma ideia de quanto seria o aumento dos impostos ao produtor rural?
No Mato Grosso, a nossa estimativa é que o custo de produção vai aumentar em torno de 8%.
Por que haveria esse aumento?
Temos por exemplo os fertilizantes, que pagam 2% de ICMS. Com a reforma, isso poderia passar para 12,5%. É uma estimativa, porque a alíquota nunca foi colocada claramente. Então isso aponta para um aumento de tributação [para o setor]. Isso vale para os insumos, para toda a cadeia [produtiva]. Isso vira crédito, mas há um aumento efetivo durante o período de produção até que ele possa vender, receber esses créditos de volta. E vai haver uma perda de arrecadação dos estados com ICMS, porque alguns itens, como óleo diesel, entrarão na cadeia de crédito e débito.
E a cesta básica? Como ficará com isso?
Teria um aumento claro e efetivo. Isso varia de estado para estado, mas, em Mato Grosso, a carne paga 2% de ICMS e passaria para 12,5%. O açúcar e o arroz pagam zero hoje e também passariam para 12,5%. O Congresso precisa rapidamente trocar isso senão seria um absurdo fazer esse aumento na cesta básica.
O senhor apresentou esse estudo para a bancada ruralista?
Sim. A percepção da bancada é que esse tema é muito complexo, é um tema que merece e precisa ter um aprofundamento maior para que as decisões que vão impactar na vida de todos nós. É algo que não pode ser apresentado assim.
Os defensores da reforma dizem que a proposta está em discussão há muito tempo, veio do governo anterior.
Isso não é verdade. Há 40 anos no Brasil já se fala e fazer uma reforma tributária. Mas o texto desta reforma, que é o que importa, foi entregue há 10 dias. Durante esses anos ficamos discutindo conceitos, premissas. Mas qual o texto na prática? Qual é o impacto da vida do cidadão, das empresas, do mercado, governos? Só um texto claro e objetivo pode dar essas respostas.
Quais são as demandas do governo do Mato Grosso e dos ruralistas para que a reforma possa então ser votada?
Por parte do governo estadual, é necessário que haja uma transição lenta, até 2032. Ela é importante para que o estado não tenha que devolver dinheiro para os incentivos fiscais que foram concedidos de forma onerosa, com respaldo inclusive do Congresso. Queremos também a manutenção da possibilidade de termos os mecanismos de desenvolvimento regional, de investimento de infraestrutura preservados naqueles estados que têm. E também que o fundo de desenvolvimento regional possa capturar corretamente, através de regras justas, a necessidade de o Brasil continuar combatendo as diferenças que existem entre as regiões brasileiras. Sul e Sudeste são regiões mais desenvolvidas no ponto de vista de infraestrutura do que o Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
O senhor vê possibilidade de votação ainda nesta semana?
Acho difícil e desnecessário. Um tema tão profundo e tão abrangente como esse merece muitas reflexões. Andando pelo Congresso Nacional, eu vi centenas de dúvidas e poucas respostas. A grande maioria de todos os brasileiros e parlamentares conhece ainda muito pouco sobre o tema. E não está maduro para se tomar uma decisão tão importante como essa.
Aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dizem que o Mato Grosso é contra a reforma porque perderia a arrecadação do Fethab, que é uma taxa para o Fundo Estadual de Transporte e Habitação.
Minha atuação é como governador e como cidadão. E vejo que há pontos muito ruins para o país, como a desoneração completa da exportação. Empresas exportadoras que lucram bilhões vão deixar de pagar impostos. Como é que vai fazer com os impostos que hoje elas pagam dentro da cadeia e deixarão de ser pagos? Se não vão pagar, alguém vai pagar para compensar isso.
Um dos pedidos da bancada ruralista é a manutenção da Lei Kandir [que isenta do ICMS as exportações de produtos primários].
Isso é importante e está mantido. As exportações precisam ser desoneradas. Só que [no projeto] houve uma ampliação dessa cadeia de desoneração. Os grandes exportadores, além das tradings, são beneficiados por essa reforma.
O senhor vê que a reforma está sendo contaminada pela polarização política?
Não tem absolutamente nada a ver. Não senti nas conversas que eu tive qualquer tipo de viés ideológico. O que existe nesse momento é um grande desconhecimento da maioria dos parlamentares sobre os verdadeiros reflexos, consequências da reforma.
Como está a relação do agro com Lula após seis meses de governo?
Não posso falar por todo o agro, apesar de ser governador do estado que tem uma maior peso na produção nacional. É um governo que usa o mesmo modelo que usou em 2003, de montar uma base de colisão, distribuindo ministérios, tentando criar uma ampla base de apoio político.
Esse modelo no atual Congresso pode não funcionar muito bem. E seis meses ainda é um período curto para se fazer uma avaliação tanto positiva quanto negativa. Precisamos dar mais um tempo para ver os resultados. Qualquer avaliação tem que vir com base nos resultados entregues ao setor e à população brasileira.
Thiago Resende/Folhapress
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