Renato Freitas é alvo de novo pedido de cassação, e ministros de Lula irão defendê-lo

O deputado estadual Renato Freitas (PT), durante sessão plenária na Assembleia do Paraná

Os ministros Silvio Almeida (Direitos Humanos) e Anielle Franco (Igualdade Racial) foram arrolados como testemunhas de defesa do deputado estadual Renato Freitas (PT- PR) em processo aberto contra o político na Assembleia Legislativa do Paraná.

O político é alvo de processos disciplinares pela terceira vez em sua carreira. Segundo ele, o que motiva os processos é o racismo.

A ação na Assembleia, entregue à Corregedoria em abril, fala em quebra de decoro tanto do deputado quanto de Ricardo Arruda (PL-PR), com quem Freitas tem enfrentamentos nas sessões.

O despacho cita pronunciamentos em que Freitas chama de rato o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), e fala que os demais deputados costumam usar adjetivos entre eles e contra autoridades públicas, quebrando assim o decoro.

Segundo Freitas, o mais recente processo disciplinar tem um viés racista.

Ele afirma que os embates com Arruda começaram já nas primeiras semanas de trabalho na Assembleia e estão relacionados com falas em que ele questiona o que chama de fake news do deputado, como a narrativa de que o ataque golpista de 8 de janeiro teria sido organizado por petistas infiltrados.

“[É racismo] primeiro pela forma como o outro deputado [Ricardo Arruda] se dirige a mim, dizendo ipsis litteris que eu sou funkeiro. E eu não sou exatamente do funk, eu sou do hip hop, que é uma outra cultura. [Diz ainda] que sou maconheiro, incapaz e bandido. São rótulos que caracterizam uma deturpação racista das nossas imagens. Um estereótipo”, afirma.

Para Freitas, apesar de o processo disciplinar provavelmente não ter força para levar a uma cassação, não há boa expectativa em relação a seu desfecho, porque a ação teria caráter coercitivo e persecutório. O objetivo seria o acúmulo de advertências que eventualmente justificariam uma cassação.

“É como, para quem já trabalhou de carteira registrada, quando o patrão quer te mandar embora e ele faz você assinar uma, duas, três advertências até que ele te mande por justa causa. É mais ou menos esse o plano da Assembleia Legislativa”.

Ricardo Arruda alega que não quebrou o decoro e que está tranquilo quanto ao andamento do processo. “Eu apenas respondi na tribuna todas as acusações levianas que o deputado Renato Freitas vinha fazendo contra o meu nome e minha honra”, afirmou.

Arruda afirma que Freitas usa a questão racial para se vitimizar. “Quando vereador, ele já foi cassado duas vezes, e toda vez que ele comete um delito, um crime, sempre ele usa a cor da pele. É racismo.”

Indagada sobre a alegação de Freitas, a Assembleia informou que é o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar o responsável por se manifestar. O Conselho não respondeu até a conclusão desta reportagem. A reportagem também tentou contato com o relator do processo, o deputado Tercilio Turini, mas as ligações para o número indicado pela assessoria caíram três vezes na caixa postal.

Os ministros Silvio Almeida e Anielle Franco foram incluídos no processo como testemunhas de Freitas. A defesa do político foi entregue em junho e, nesta segunda-feira (10), o Conselho de Ética vai ter acesso à defesa dos deputados.

Almeida já foi testemunha de Freitas em outro processo de cassação, quando o petista era vereador da capital paranaense. Na ocasião, o ministro falou sobre o contexto do racismo estrutural no Brasil.

MANDATO DE VEREADOR

Freitas, que é negro e periférico, já foi cassado duas vezes enquanto era vereador de Curitiba. Ele foi acusado de quebra de decoro parlamentar ao participar da ocupação de uma igreja durante um protesto contra o racismo.

A ação foi motivada pelas mortes do congolês Moïse Kabagambe e de Durval Teófilo Filho e pela tentativa de assassinato de Quintino Correia, três homens negros violentados em 2022 em contextos relacionados com o racismo.

Em carta destinada à Câmara, a Arquidiocese de Curitiba afirmou que, apesar de considerar que a manifestação tenha desrespeitado um local sagrado, ela foi legítima e ocorreu somente após o término da missa.

Na época, a arquidiocese pediu uma “medida disciplinar proporcional ao incidente” e sugeriu a não adoção da cassação.

“A movimentação contra o racismo é legítima, fundamenta-se no Evangelho e sempre encontrará o respaldo da Igreja. Percebe-se na militância do vereador o anseio por justiça em favor daqueles que historicamente sofrem discriminação em nosso país. A causa é nobre e merece respeito”, afirmou a Arquidiocese em documento de 25 de março de 2022.

Ainda assim, o então vereador foi cassado com 25 votos favoráveis e 5 contrários em 22 de junho do ano passado na Câmara Municipal de Curitiba. Dias depois, o TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná) suspendeu a sessão em que ocorreu a cassação por entender que ela não cumpriu prazos legais.

Freitas foi cassado de novo pela Câmara, nessa última vez com 23 votos a favor, 7 contra e 1 abstenção. A votação foi em agosto de 2022.

Freitas entrou com recurso na Justiça e obteve decisão favorável no STF (Supremo Tribunal Federal), recuperando o mandato de vereador.

O ministro Roberto Barroso, relator do texto, citou na decisão o racismo estrutural da sociedade brasileira.

“Na situação aqui examinada, e talvez não por acaso, o protesto pacífico em favor de vidas negras, feito pelo vereador reclamante dentro de igreja, motivou a primeira cassação de mandato na história da Câmara Municipal de Curitiba “, afirmou na decisão.

Antes disso, ele enfrentou outro processo disciplinar por fala em debate na Câmara em fevereiro de 2021, em que foi acusado pela Comissão de Ética de quebra de decoro e intolerância religiosa, dessa vez por supostamente atacar membros da bancada evangélica durante debate em que discutia o uso da ivermectina no tratamento da Covid.

Nas eleições de 2022, Renato Freitas se tornou deputado estadual com 57,9 mil votos pelo PT.

Ana Gabriela Oliveira Lima/Folhapress

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente esta matéria.