Estados e municípios vivem montanha-russa nas contas públicas e têm histórico de socorro
Se prefeitos e governadores conseguirem abocanhar um socorro do governo federal, não será a primeira vez – e, provavelmente, nem a última. Ao longo das décadas, Estados e municípios receberam inúmeras ajudas financeiras numa tentativa de melhorar o quadro das contas públicas.
Desde 1980, diversas medidas de socorro foram encabeçadas pela União – como em 2017, quando foi criado o Regime de Recuperação Fiscal, que, dentre outras medidas, permitiu a suspensão do pagamento da dívida dos Estados -, mas essas ações também já foram comandadas pelo Congresso e até mesmo pelo Poder Judiciário.
“Historicamente, a gente tem um modelo de federalismo que induz Estados e municípios a terem baixa responsabilidade fiscal e jogarem os custos para a União”, diz Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper. “E o que a gente está vendo, hoje, é mais uma repetição desse ciclo que já vem acontecendo desde os anos 80. Um programa atrás do outro.”
O socorro aos Estados e municípios volta sempre para a pauta econômica em Brasília, conforme os resultados fiscais vão piorando. E, no último ano, a situação das finanças estaduais mudou drasticamente.
Em 2022, a decisão do Congresso de limitar a cobrança de ICMS em itens considerados essenciais, como combustíveis, telecomunicações e energia, afetou em cheio a capacidade arrecadatória do principal tributo dos Estados – que tem uma porcentagem repassada aos municípios.
Apoiada pelo governo Jair Bolsonaro, a medida teve como principal objetivo reduzir os preços dos combustíveis na bomba, em meio à tentativa de reeleição.
“Foi uma coisa imposta, e a autonomia federativa ficou até um pouco frágil”, afirma Renata dos Santos, secretária de Fazenda de Alagoas. “A nossa fonte de receita própria foi golpeada.”
A perda de arrecadação com o ICMS marcou uma inflexão significativa, porque os governadores, até então, contabilizavam um aumento de caixa considerável com as transferências realizadas pela União no auge da pandemia e pela alta dos preços das commodities no cenário internacional. Ao mesmo tempo, eles ficaram proibidos de conceder aumento aos servidores públicos (em 2020 e 2021), o que ajudou a melhorar as contas.
Mas a inversão foi rápida – tanto pelo lado da receita como do gasto. Mesmo afetados pelo desempenho arrecadatório do ICMS, os Estados concederam reajustes aos servidores públicos, que estavam com o salário congelado há dois anos. O grande problema é que esses aumentos se transformam numa despesa fixa. Ou seja, não é possível voltar atrás quando a arrecadação perde força – como é o caso agora.
Pedro Schneider, economista do Itaú, resume essa inversão de cenário: “Antes, a receita estava em alta, e a despesa travada. Simplesmente trocou. Passou a ter receita em queda e despesa em alta”.
Ele destaca que, em momentos de bonança, o aumento de receita costuma ser integralmente consumido por novas despesas. “Isso gera pressões e dificuldades fiscais quando a arrecadação cai. É a história do Brasil desde sempre”, diz.
No quesito gastos, governadores e prefeitos ponderam que também foram afetados por uma série decisões tomadas pela União e pelo Congresso Nacional – as quais não vieram acompanhadas de compensações. Dentre elas, a criação e o reajuste dos pisos da enfermagem e da educação, além da alta real (acima da inflação) do salário mínimo.
Montanha-russa dos números
Um levantamento realizado pela equipe de pesquisa macro do Bahia Asset Management dá a dimensão dessa montanha-russa que se tornaram os orçamentos estaduais. Em 2020, o caixa dos governadores somava R$ 60 bilhões, valor que subiu para quase R$ 160 bilhões em 2021 e alcançou R$ 180 bilhões em 2022. Neste ano, a previsão é que recue para R$ 140 bilhões.
Ao mesmo tempo, o gasto com o salário dos servidores subiu de R$ 332 bilhões para R$ 369 bilhões entre 2022 e o projetado para 2023 – uma alta de 11,14%.
“Quando você olha os dados da Pnad e do Caged, a taxa de crescimento (da quantidade de servidores públicos) é de 8% desde 2022 e de 5% neste ano”, afirma Luiz Maciel, economista-chefe Macro Brasil do Bahia Asset Management. “Além do aumento de salário, está havendo um crescimento na quantidade. Isso vai criando uma bomba, porque esse é um gasto que não se corta.”
Luiz Guilherme Gerbelli, Adriana Fernandes e Bianca Lima/Estadão Conteúdo
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