Lira manda recado ao Judiciário, e Barroso defende pautas do STF

As maiores autoridades do Legislativo e do Judiciário se reuniram nesta quinta-feira (5) para celebrar os 35 anos da Constituição em meio a farpas e afagos entre Congresso e STF (Supremo Tribunal Federal).

Em seus discursos, os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Supremo, Luís Roberto Barroso, enfatizaram a divisão e equilíbrio entre Poderes, mas ressaltaram pontos de desavença entre parlamentares e ministros.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chefiou a sessão solene, que também contou com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, e o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB).

Autoridades e pessoas presentes ao evento avaliaram, sob reserva, que os discursos de Lira e Barroso tiveram recados sobre as desavenças entre os Poderes, mas nada fora do que se esperava e de divergências comuns do momento.

Lira, por exemplo, afirmou que as três instâncias devem ser guardiãs da democracia, e que para isso precisam trabalhar com harmonia e independência. “Os Poderes devem ser freios e contrapeso, um poder não pode ser bigorna e o outro martelo dos outros.”

O presidente da Câmara citou ainda a divisão e limites de competências entre cada uma das instâncias, justamente o motivo de maior reclamação dos parlamentares com relação à postura do Supremo.

“Como servo fiel da Carta Magna, cada Poder, cada autoridade, cada ser servidor público deve agarrar-se com vigor às suas competências, jamais as recusando, jamais avançando sobre competências alheias”, disse.

Barroso tratou de ressaltar pautas sociais e de costumes, sobre as quais o STF se debruçou recentemente e que vem causando incômodo no Congresso, que reclama de interferência de competências dos ministros.

Enalteceu, por exemplo, o casamento homoafetivo, união que foi reconhecida pelo Supremo, mas que deputados conservadores querem proibir. Também citou os direitos dos povos indígenas, que recentemente viram o marco temporal derrubado pelo Judiciário, mas aprovado pelo Legislativo.

“Ainda acrescentaria a independência e harmonia dos Poderes, o Executivo voltou ao seu tamanho normal [após a ditadura], o Legislativo recuperou o seu espaço decisivo na democracia e o Judiciário viveu um momento importante de ascensão institucional”, afirmou o ministro.

Barroso foi ao evento após abrir uma sessão solene no STF sobre o mesmo tema. A sua presença no Congresso não constava na agenda oficial, ao contrário de outros compromissos do ministro que foram divulgados do dia.

Ele teria demonstrado certa insatisfação em ter que deixar o evento do tribunal, onde chamou especialistas da Carta Magna para palestrar. Após sua fala e algumas fotos, ele retornou ao Supremo para o discurso de encerramento.

“Não existem Poderes hegemônicos, somos todos parceiros institucionais, pelo bem do Brasil, como bem demonstra essa mesa que o presidente Pacheco aqui reuniu”, completou, no discurso no Congresso, se referindo ao plenário em que as autoridades se sentaram lado a lado.

Pacheco, por sua vez, lembrou que a “harmonia e a independência” fazem parte da Constituição e que devem servir de norte para a atuação de cada um dos Poderes.

“[A promulgação da Constituição] significava o retorno de uma institucionalidade vigorosa, em que o Executivo governa, o Parlamento legisla e o Judiciário julga, sem que um poder se subordine ao outro, formal ou informalmente”, afirmou no discurso.

Após encerrar a leitura do texto preparado para a cerimônia, Pacheco ainda cumprimentou o vice-presidente, Geraldo Alckmin, também presente na mesa, e fez um aceno aos dois ministros do Supremo presentes.

“A ambos externo, em nome do Senado e do Parlamento, o nosso apreço e respeito ao Poder Judiciário”, disse.

Finalmente, Alexandre de Moraes, um dos mais criticados por parlamentares bolsonaristas por suas decisões monocráticas e por conservadores, sobretudo pelo seu posicionamento pela descriminalização das drogas, enalteceu a tarefa de preservar a democracia contra movimentos autoritários e populistas no Brasil e no mundo.

“Em que pesem eventuais divergências, que são naturais da democracia, temos que estar unidos na defesa da democracia”, disse.

Após a sessão, Pacheco conversou com jornalistas e afirmou que não vê nenhuma crise entre os Poderes, mas defendeu que o Legislativo se debruce sobre as propostas que limitam as decisões monocráticas do STF e a que prevê mandatos para os ministros —temas que, segundo ele, devem ter apoio da “maioria muito considerável” do Senado.

“É interessante termos uma regulação com relação as decisões monocráticas para aquilo que seja o mais sagrado do Supremo, que é a sua colegialidade, prevalecer? Não há nada irracional nisso. Como também não há nos mandatos fixos, que são adotados em outros países”, afirmou.

Segundo ele, o debate destes temas não constitui afronta, assim como também não o é quando o STF pauta temas nos quais ele entende que a competência deveria ser do Legislativo —como marco temporal e drogas.

Por outro lado, Pacheco refutou a ideia de que o Congresso possa reverter decisões do Supremo, como propõe uma PEC protocolada na Câmara.

“Acho isso muito complicado, de difícil alcance constitucional”, afirmou. “É um tanto inusitado pensar na possibilidade de reversão de uma decisão judicial pelo Poder Legislativo, mas eu não conheço o texto da proposta”, completou.

João Gabriel e Constança Rezende, Folhapresss

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