Bolsonarista Hélio Lopes rejeita reparação histórica e critica ação do movimento negro
F deputado federal Hélio Lopes (PL-RJ) |
O deputado Hélio Lopes (PL-RJ), 54, já adotou nas urnas o sobrenome Negão e Bolsonaro, emprestado pelo ex-presidente. Mas é ao Barbosa (de Hélio Fernando Barbosa Lopes) que o militar reformado recorre para explicar suas origens.
“Esse nome Barbosa, minha mãe diz que é da origem dos meus antepassados, que residiam, moravam e trabalhavam na fazenda dos Barbosas. Para trabalhar na fazenda e ter essa história, com certeza foram escravos, mas não aprofundei. É até um alerta bom para começar a pesquisar”, diz o deputado.
Para ele, carregar o sobrenome dos que escravizaram seus antepassados é apenas parte da história, assim como os horrores da escravidão.
O deputado bolsonarista rejeita a criação de políticas públicas voltadas para reparação histórica dos descendentes dessa população, exigida pelo movimento negro e seus apoiadores em razão dos mais de 300 anos da exploração de africanos e seus descendentes no país.
“O que aconteceu não tem como mudar. Mas essa reparação… Eu acho que é falha”, diz ele, contrário às políticas afirmativas adotadas nas últimas décadas, mas favorável às cotas sociais.
Hélio Lopes é nascido e criado no morro do Tempero, em Queimados, na Baixada Fluminense, filho de uma empregada doméstica e de um pedreiro. Ele conta que começou a trabalhar aos dez anos recolhendo restos de alimentos no bairro para dar aos porcos criados pela tia. Lembra também da “luta muito grande” para estudar.
“Eu estudava de segunda a segunda. Na minha época não tinha biblioteca lá em Austin. Eu pegava o trem em Austin [bairro de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense] e ia até Japeri [também na Baixada] dentro do trem estudando. Ia para Central [estação no centro do Rio], ia para Santa Cruz [zona oeste da capital], Japeri. Assim eu fazia. Chegava em casa tarde da noite, saltava na estação, ia andando. Chegava em casa, subia o morro e ainda ia estudar.”
O deputado afirma não ver o sacrifício excessivo para estudar durante a infância como uma consequência direta da exploração de seus antepassados.
“Pobreza sempre vai existir. Sinto muito orgulho do meu passado. Tem que fazer o pessoal valorizar o seu passado”, diz.
Após trabalhar como servente de obra, jardineiro e office boy de uma madeireira, o deputado foi aprovado aos 22 anos num concurso para sargento do Exército. Foi nas Forças Armadas que Hélio Lopes conheceu o ex-presidente Jair Bolsonaro, à época deputado federal.
“Quando eu chegava ao serviço, ele estava lá, conversava com os militares. Sempre foi muito comunicativo. De lá para cá, o negócio foi aumentando”, afirma Hélio.
Após 12 anos no Exército, em 2004, registrou candidatura para a Câmara Municipal de Queimados.
“Se você souber o local que eu morava… Para você ter uma ideia, eu, como deputado federal, pedi a quatro presidentes da Cedae [companhia de águas do Rio de Janeiro] para verificar a possibilidade de levar água para o bairro. Só no final de 2021 que eu consegui fazer chegar a água lá. Então a gente vê muita injustiça, muita coisa que não era feita. Mesmo sendo militar, eu já observava. ‘Só pode mudar através da política’, falei.”
Ele acabou desistindo da campanha e não registrou votos. Em 2016, a nova tentativa, em Nova Iguaçu, não resultou em melhoria significativa: foram apenas 480 votos.
Dois anos depois, a onda conservadora e sua associação com Bolsonaro pelo sobrenome emprestado e a presença constante nos eventos do ex-presidente catapultaram o então sargento como o deputado federal mais votado do Rio de Janeiro, com 345 mil votos.
É a partir do resultado expressivo que Hélio Lopes faz uma de seus críticas ao movimento negro.
“Quando eu fui o mais votado do Rio de Janeiro, alguém do movimento negro fez uma nota? ‘Parabéns, futuro deputado Hélio, você representa a nossa cor’. Não fizeram. Mas passou um pouco de tempo e tinha um grupo aqui falando que eu tinha que representar o movimento negro”, diz ele.
O apoio a Bolsonaro, a recusa a ações afirmativas e outras bandeiras do movimento negro fizeram Lopes se tornar alvo de críticas da esquerda. Segundo o deputado, houve ataques com cunho racial.
Um deles se transformou numa denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro por injúria racial, por ter sido chamado de “capitão do mato” no X (antigo Twitter).
O juiz Marcos Peixoto, porém, rejeitou a acusação por considerar que brancos e negros desempenharam o papel de captura de escravizados que escaparam das fazendas, não se configurando o vínculo racial da expressão.
Lopes vê um viés político na análise dos seus casos.
“Eu quero ver a bancada negra se manifestar quando eu pegar os meus processos e mandar para eles. Se eu fosse negro de esquerda tinha um monte de gente presa. A luta do movimento negro não é pela cor, não é pela causa, é pelo voto”, diz ele.
Ao mesmo tempo que critica a falta de apoio, Hélio Lopes propôs a revogação da lei que iguala a injúria racial ao racismo. Ele não vê contradição em tentar acabar com a lei a que recorreu para denunciar as ofensas à polícia.
“Essa Justiça só funciona para um lado. Eu tenho que mostrar e vou continuar fazendo isso, mesmo com essa opinião [contrária à lei de injúria racial].”
O deputado decidiu não integrar a bancada negra recém-criada na Câmara dos Deputados. Apesar das críticas, ele afirma respeitar a atuação dos parlamentares e do movimento negro.
“Eu sou contra a construção do movimento negro, mas que exista o movimento negro e que ele esteja feliz defendendo as pautas deles. Não quero que eles defendam a minha pauta. Eu sou contra, mas respeito que todo mundo se reúna e que lute pelos objetivos. Mas não tem que estar implantado aqui em mim que eu tenho que pensar igual a eles.”
Lopes considera não existir um racismo estrutural no país, mas sim casos esporádicos. Ele não inclui entre esses a fala de Bolsonaro sobre pesar negros com arrobas, unidade de medida usada para animais. “Não vi como preconceituoso nem como inadequado.”
Ele diz também não se sentir usado por Bolsonaro como forma de minimizar as acusações de racismo de que o ex-presidente é alvo. “Bolsonaro é um irmão que a vida me deu.”
RAIO-X | HÉLIO LOPES, 54
Nascido em Queimados (RJ), é formado em gestão financeira pela Unisul (Universidade do Sul de Santa Catarina). Foi sargento do Exército por 26 anos. Candidatou-se a vereador em 2004, pelo PRP, e em 2016, pelo PSC, mas não se elegeu. Foi o deputado federal mais votado do Rio de Janeiro em 2018, com 345 mil votos, pelo PSL. Foi reeleito em 2022, pelo PL, com 132 mil votos.
Italo Nogueira, Folhapress
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