Estados pobres mais populosos saem perdendo em rateio de fundo da reforma tributária
O Acre, Roraima e Amapá vão receber quatro vezes mais recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), que será criado com a reforma tributária, do que o Maranhão, que é o Estado mais pobre do País. Enquanto o Maranhão receberá R$ 502 por habitante, Roraima receberá o valor mais alto: R$ 2.622 per capita.
O Acre, segundo da lista, terá direito a R$ 2.111 por habitante. O Amapá vem em terceiro com R$ 1.755, de acordo nota técnica dos economistas Marcos Mendes e Sergio Gobetti, publicada pelo Insper.
Para os dois pesquisadores, o novo fundo vai reproduzir uma distribuição enviesada dos recursos, a favor dos Estados menos populosos, e prejudicial aos que têm baixa renda e população maior.
Os senadores desses três Estados, além de Rondônia, foram ainda mais beneficiados com a criação de um novo fundo que será bancado pelo governo federal. O acordo foi feito para garantir a aprovação da proposta, que corria risco de ser derrotada, já com a votação em andamento e, segundo a oposição, houve atropelo regimental.
A Bahia – um dos Estados mais populosos do Brasil e com renda per capita baixa – vai receber, proporcionalmente, cerca de um sexto do valor destinado a esses três Estados do Norte do País. O repasse reservado aos baianos com a fórmula aprovada é de R$ 349 por habitante, segundo o estudo.
Já São Paulo, o Estado mais rico e populoso do País, receberia R$ 100 per capita, se o fundo de R$ 60 bilhões por ano estivesse funcionando hoje.
Valores totais
Como têm muitos habitantes, Bahia e São Paulo, por outro lado, figuram no topo da lista em valores totais a serem recebidos pelo governo federal – com R$ 4,9 bilhões e R$ 4,4 bilhões, respectivamente. Foi essa lista, que não considera o valor per capita, que foi distribuída a senadores na semana anterior à votação da reforma, como mostrou o Estadão.
O texto aprovado no Senado aumentou o aporte do fundo abastecido pela União, de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões, no auge. Ele foi criado com a ideia de ajudar os Estados a bancar investimentos em infraestrutura e educação como forma de atrair empresas, uma vez que os incentivos da guerra fiscal deverão cessar após 2032.
O modelo de partilha do fundo foi escolhido pelo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), e aprovado pelos 53 senadores que votaram a favor da proposta, que terá que passar por nova votação na Câmara. O critério estabelece um rateio segundo o Fundo de Participação dos Estados (FPE) (com peso de 70%) e o tamanho da população (com peso de 30%).
Os dois economistas fizeram as simulações da partilha do novo fundo para mostrar que o rateio do FNDR reproduzirá a distorção já existente na divisão do FPE.
“Introduzir diretamente o critério populacional não resolve, e manterá a inconsistência do FPE”, disse Mendes ao Estadão. Segundo ele, quando se tira peso do fator renda per capita e dá peso para o fator população, o Estado pobre e muito populoso ganha por um lado (via a introdução do fator população) e perde por outro (com a redução do peso do fator renda per capita).
“Quem ganha é o Estado rico e populoso, pois ele se beneficia da redução do peso dado ao fator renda per capita, porque é rico, e pela introdução do fator população, já que é populoso”, explica.
Nova fórmula
Os dois economistas propõem no estudo um modo mais simples e flexível de calcular a distribuição do FPE, que pode ser usado para distribuir o FNDR, sem levar às distorções atuais. A fórmula mais simples, que permite dosar os efeitos redistributivos, leva em conta o inverso da renda por habitante do Estado multiplicado pela população.
A nota técnica traz simulações com essa fórmula, garantindo uma redistribuição mais equilibrado (sem tanta dispersão) com ajustes por nível de renda per capita, sem criar grandes benefícios para os Estados de população pequena.
Segundo Gobetti, com essa fórmula, utilizando valores razoáveis para os pesos dos fatores renda per capita e população, o Maranhão que é o Estado mais pobre, ficaria com R$ 703 por habitante; Acre, com R$ 572; Roraima, R$ 542; Amapá, R$ 419; e Bahia subiria para R$ 410.
O Estado de São Paulo subiria para R$ 137, no piso da lista; e Maranhão, no topo, sem grandes discrepâncias como no modelo aprovado pelo Senado.
Ao defender a mudança da partilha dos recursos do fundo na nova votação da Câmara, Gobetti destaca que o relator Eduardo Braga, no seu próprio parecer, reconheceu que o FPE cria distorções no sentido de tender a gerar transferências per capita em valores muito elevados para Estados mais pobres, mas com população pequena.
Mas o estudo mostra que a opção adotada, de se fazer uma fórmula matemática somando os fatores de renda per capita e população, com pesos de 70% e 30%, respectivamente, não resolve o problema. A regra de partilha aprovada pelo Senado não tem consenso e segue dividindo os Estados mais ricos e pobres. No passado, o impasse em torno do fundo barrou as tentativas de aprovar a reforma.
Adriana Fernandes/Estadão Conteúdo
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