Em alerta, moradores de Maceió protestam: ‘Estamos sem dormir para prestar socorro’
Vista aérea da mina 18, localizada no bairro do Mutange, em MaceióFoto: Itawi Albuquerque/Secom |
Diante do risco iminente de uma mina da cidade colapsar, moradores de Maceió fazem protestos nesta sexta-feira (1º) com queima de entulhos e pneus e bloqueio de vias. Dezenas de pessoas estão deixando as suas casas, enquanto outras pedem para ser incluídas no mapa de risco.
Um dos atos ocorre no bairro dos Flexais. Os manifestantes reclamam de não terem sido contemplados no plano de realocação e temem ficar ainda mais isolados já que houve evacuação nas proximidades. Eles também pedem indenização à Braskem, empresa responsável pela mina de sal-gema.
Um segundo protesto acontece no bairro do Bom Parto, que teve mais residências adicionadas ao mapa de risco atualizado pela prefeitura nesta quinta (30) para incluir as novas residências.
Segundo Jackson Douglas Ferreira de Souza, 42, membro do MUVB (Movimento Unificado contra a Braskem), são 812 residências nos Flexais, com 3.500 pessoas, conforme pesquisa feita pelos moradores há um ano e meio.
O pedreiro Fabiano dos Santos Oliveira, um dos moradores dos Flexais, cobra a inclusão do local na área de risco.
“A nossa reivindicação da gente é a opressão que a gente vem sofrendo aqui nos Flexais, nessas áreas que a Defesa Civil alega que não estão condenados. Nós temos vários estudos que comprovam isso. Nossas residências estão cheias de fissuras, rachaduras, sentindo esses tremores e abalos”.
O morador relata a agonia das famílias com a situação. “A gente já não aguenta mais. Depois desse caos, desse alarde, a gente não tem mais sossego nem paz. Não conseguimos dormir. Todo dia tem uma nota com o horário que a mina vai romper e ficamos aqui na ansiedade, e isso não acontece. Dia após dia desse jeito. As pessoas estão adoecendo, em pânico, sem ter o que fazer.”
Segundo Santos, os moradores não entendem o motivo de deixarem duas ruas fora do mapa de risco. “Sabem do problema, sabem do sofrimento das pessoas. Ontem, às 22h, cortaram o fornecimento de água daqui dos Flexais e até agora essa água não retornou para as torneiras.”
Os moradores afirmam, ainda, que o comércio local deixou de funcionar. Também não há escolas, e somente uma igreja continua a receber fiéis.
Na visita de quinta, a reportagem presenciou um cenário de abandono. Praças vazias, com pouco movimento de carros. As casas se deteriorando. Em algumas, o pedido de realocação já pichado nos muros ou o aviso de que ainda havia famílias ali.
“Tenho que trabalhar. Dependo da minha renda, dos meus comércios, de tudo o que eu fazia antes. Hoje só tenho dinheiro para pagar as minhas contas”, disse Valdemir Alves dos Santos, autônomo.
O porteiro Ronaldo Vicente Ferreira, 50, afirmou que todos estão em estado de alerta desde o anúncio do risco de colapso da mina.
“Estamos sem dormir para prestar socorro a um e a outro. Tem que tirar as pessoas para um lugar em que se sintam confortáveis, porque temos crianças, idosos e animais.”
Questionados, Defesa Civil e Braskem não informaram o motivo de o Flexais não ter sido incluso na área de risco.
Em 2022, a Braskem firmou um acordo com a Prefeitura de Maceió, Ministérios Públicos estadual e federal, além da Defensoria Pública da União, para oferecer uma indenização de R$ 25 mil por família dos Flexais por conta dos danos materiais e morais decorridos do isolamento, além de obras para revitalizar a região. As famílias rechaçam a oferta, segundo moradores ouvidos pela reportagem.
ENTENDA O CASO
Na quarta-feira, a Defesa Civil de Maceió alertou que uma mina da Braskem está em risco iminente de colapso. A população que mora próximo à área atingida foi orientada a deixar o local e procurar abrigo, e a prefeitura decretou estado de emergência por 180 dias.
A situação tem ligação com o afundamento do solo que atinge cinco bairros da capital de Alagoas. O problema começou em março de 2018 e até hoje não foi solucionado. O Serviço Geológico do Brasil, órgão do governo federal, concluiu que as atividades de mineração da empresa em uma área de falha geológica causaram o problema.
Desde então, mais de 60 mil famílias dos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol foram realocadas para outros pontos da cidade.
Na manhã desta sexta-feira, o deslocamento vertical acumulado da mina 18 era de 1,42 m, e a velocidade vertical era de 2,6 cm por hora, segundo a Defesa Civil de Maceió.
Procurada, a Braskem não se pronunciou sobre a crítica do grupo organizador do protesto.
Em nota pela manhã, a empresa informou que existem duas possibilidades: uma acomodação gradual até a estabilização e outra de colapso da mina.
O prefeito João Henrique Caldas (PL) e a Marinha sobrevoaram a área da Lagoa Mundaú nesta sexta para realizar uma vistoria.
Em nota, a Prefeitura de Maceió disponibilizou abrigos para acolher a população de forma emergencial, diante do risco eminente de colapso da mina n°18 da Braskem. “Ao mesmo tempo, a Prefeitura já solicitou ao governo federal apoio para garantir moradias à população que foi obrigada a deixar suas casas”, diz o comunicado.
Ainda segundo a nota, a prefeitura “reafirma o compromisso em cobrar de todos os envolvidos, incluindo a Braskem, que todos os direitos da população afetada sejam garantidos”.
De acordo com a prefeitura, 83 pessoas aceitaram ir para os abrigos organizados. São seis escolas municipais e a Casa de Passagem Familiar dispostos, abastecidos com colchões, lençóis, kits de higiene pessoal e alimentação.
Além disso, cerca de 14 bairros tiveram o abastecimento de água afetado na madrugada e manhã desta sexta por conta do iminente colapso da mina, já que a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) paralisou as atividades na Estação de Tratamento de Água (ETA) Sistema Cardoso.
O sistema começou a ser restabelecido por volta das 11h.
Josué Seixas/Folhapress
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