Investigação aponta Vai-Vai como reduto do PCC
Luiz Roberto Marcondes Machado de Barros, dirigente da Vai-Vai que polícia diz ser do PCC; o irmão dele, Luiz Eduardo (à direita), apontado como membro da cúpula da facção, preso no sistema federal
A Vai-Vai, uma das mais tradicionais escolas de samba de São Paulo e dona de 15 títulos do Carnaval, tornou-se um reduto da facção criminosa PCC, segundo relatórios de investigação da Polícia Civil.
Os documentos aos quais a Folha teve acesso fazem parte de um processo de lavagem de dinheiro que corre em segredo na Justiça de São Paulo e tem entre os alvos o então diretor financeiro e ex-presidente da agremiação, Luiz Roberto Marcondes Machado de Barros, o Beto da Bela Vista.
“Escola [Vai-Vai] que BBV [Beto Bela Vista] pertence ao quadro diretivo e sabidamente é reduto da mencionada facção criminosa [PCC], tendo, inclusive, procedendo há algum tempo atrás a expulsão de alguns componentes que eram policiais justamente por este motivo”, diz trecho do documento.
Os investigadores afirmam ter identificado essa ligação após recebimento de uma série de denúncias apontando o envolvimento de Beto com o crime organizado e a realização de diligências de campo em endereços ligados ao então diretor e a outros integrantes da escola de samba.
Ainda conforme a polícia, dados obtidos pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) reforçaram as suspeitas de que ele, a mulher, a mãe e outras pessoas participem de lavagem de dinheiro.
Procurada, a Vai-Vai diz que Beto Bela Vista integra o conselho e foi diretor no mandato anterior, que terminou no final de 2022. “Ele é membro do conselho, foi eleito e nenhuma condenação inviabiliza sua atuação”, afirma a assessoria da agremiação.
A Vai-Vai também afirma que, entre os seus quase 1.500 componentes cadastrados, há policiais em diversos segmentos, mas não precisou quantos são.
Além de Luiz Roberto, também foi indiciado nessa investigação o então diretor presidente do clube de futebol ligado à Vai-Vai, Marco Aurélio Barbosa, ex-jogador de Santos e Guarani. A investigação aponta conexões dele com empresas supostamente usadas para lavagem de dinheiro.
Barbosa, ao ser ouvido pela polícia, ficou em silêncio.
Os relatórios afirmam, ainda, que Luiz Roberto esteve preso por cerca de dez anos (deixou a prisão em agosto de 2014). Ele tem passagens por formação de quadrilha, roubo, uso de documento falso, desacato, motim de presos, extorsão mediante sequestro, porte ilegal de armas, lesão corporal, resistência, desobediência e dano.
Em sua ficha consta que, em abril de 2003, era integrante da quadrilha que tentou roubar o apartamento de Flávia Soares, ex-mulher do apresentador de TV e humorista Jô Soares, em Higienópolis. “O assalto só não se concretizou porque uma empregada de Flávia percebeu a ação e correu com a patroa para o hall social do condomínio”, diz o documento.
Os investigadores também apontam possível ligação dele com André de Oliveira Macedo, o André do Rap, foragido após habeas corpus do então ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello.
Durante depoimento na polícia, Luiz Roberto negou ligação com André do Rap e com o PCC. Disse que não pratica mais nenhuma atividade ilícita e que o patrimônio dele é fruto de herança. Por fim, disse frequentar a Vai-Vai desde criança e desconhecer ligação da escola com o crime.
Procurada pela Folha, a advogada Luiza Oliver, sócia do Toron Advogados, afirma que Luiz Roberto nunca foi condenado nem denunciado por fazer parte de uma organização criminosa. O que existe, segundo ela, é um processo no qual o irmão dele foi denunciado.
“O Luiz Roberto não tem nenhuma relação com isso. Basta ler a denúncia apresentada pelo Ministério Público para ver. Portanto, é no mínimo temerário associá-lo a essa organização criminosa em razão de condutas atribuídas apenas e tão somente ao irmão. Obviamente, ninguém pode ser responsabilizado por atos de terceiros, mesmo que sejam irmãos”, disse.
O irmão do ex-presidente da Vai-Vai é Luiz Eduardo Marcondes Machado de Barros, o Du Bela Vista, que está preso.
Em 2014, Du estava com Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, na lista de chefes da facção que seriam resgatados em um plano que previa a utilização de avião e dois helicópteros. O suposto plano foi descoberto, e os presos, punidos.
Du Bela Vista tem passagem por roubo, falsidade ideológica, porte de drogas, porte ilegal de armas, lesão corporal, dano, receptação, formação de quadrilha, uso de documento falso, tentativa de homicídio, homicídio e corrupção.
A Vai-Vai afirmou que Marco Aurélio Barbosa e Du Bela Vista não fazem parte da escola.
ELO COM ESCOLAS DE SAMBA É APURADO DESDE 2006
As suspeitas de envolvimento do PCC com escolas de samba na capital não são novas. Ao menos desde 2006, ano marcado pelos ataques do crime às forças de segurança, a polícia investiga tal elo.
Naquele ano, homens apontados como diretores da Império da Casa Verde, tricampeã do Carnaval paulistano, foram presos sob suspeita de receber recursos da facção para cobrir gastos com desfiles.
Interceptações telefônicas flagraram, segundo a polícia, membros da agremiação planejando ações com Sidney Rogério de Moraes, apontado como arrecadador da facção na zona norte da capital.
Moraes e dois diretores foram presos na época, e um terceiro diretor da Império escapou. Outras nove pessoas foram indiciadas por suposto envolvimento com a quadrilha.
Também era integrante da Império da Casa Verde o homem que, em 2012, invadiu a área da apuração e rasgou as notas do Carnaval de São Paulo, cena transmitida ao vivo pelas emissoras de TV.
Anos depois, esse homem, Tiago Ciro Tadeu Faria, conhecido como Gianecchini, foi preso sob a suspeita de participar mega-assaltos a unidades bancárias –acabou condenado a mais de 50 anos de prisão. Em junho deste ano, foi enviado para a Presidente Venceslau, onde fica a penitenciária reduto do PCC.
Em 2009, policiais militares prenderam 18 integrantes do PCC reunidos na sede da escola de samba Barroca Zona Sul. Conforme denúncia do Ministério Público, os criminosos se reuniam com frequência na quadra da escola e, naquela noite, planejavam crimes na região da Baixada Santista.
Em 2010, o então diretor da Gaviões da Fiel Elvis Riola de Andrade, o Cantor, foi preso sob suspeita de ter matado, um ano antes, um agente penitenciário a mando da cúpula PCC. Andrade foi condenado a cerca de 15 anos pelo crime que, durante julgamento, acabou confessando.
A Gaviões da Fiel e a Império de Casa Verde não responderam a reportagem.
Rogério Pagnan e Carlos Petrocilo/Folhapress
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