Exército amplia aval para armas restritas em acervos pessoais de PMs e libera até 5 fuzis em casa

O Exército emitiu autorização para que policiais e bombeiros militares tenham em casa até seis armas de fogo, sendo até cinco de uso restrito. Entre elas, estão liberados alguns tipos de fuzis – equipamentos não recomendados para defesa pessoal. A medida trata de equipamentos que podem ser adquiridos para acervos particulares, sem relação com as armas institucionais usadas para o trabalho.

O País tem cerca de 406,3 mil policiais militares e 55 mil bombeiros militares na ativa, segundo os dados mais recentes. A nova regra, apresentada em portaria publicada na terça-feira, 23, também abrange os servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República.

A nova regra para armas de uso restrito em acervos pessoais de policiais representa um afrouxamento das normas que vigoraram antes e durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Até então, os militares estaduais podiam comprar duas armas de uso restrito para ter em casa. Agora poderão ter até cinco.

Uma arma de uso restrito é aquela que só pode ser utilizada pelas Forças Armadas, por alguns órgãos de segurança e por pessoas habilitadas, como atletas.

Desde janeiro de 2023, os integrantes dessas forças de segurança não tinham limite diferenciado para compra de armas. Decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no primeiro dia de governo suspendeu medidas do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em seguida, outro decreto do petista definiu que novas regras seriam editadas pelo Exército e pela Polícia Federal.

Procurado para comentar os critérios utilizados, o Exército não se manifestou até esta publicação. A pedido da reportagem, o gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, especialista em regulamentos sobre o armamento civil, levantou as normas que vigoravam anteriormente e apontou os impactos da nova portaria.

Até 2018, os policiais militares podiam ter até duas armas de uso restrito, mas de calibres específicos. Os de fuzil não estavam entre eles. A partir de 2019, a especificação de calibres caiu e eles podiam comprar até dois fuzis, à exceção dos armamentos automáticos, que disparam rajadas com um acionamento de gatilho.

Agora, o número de armas restritas subiu para cinco. As automáticas continuam proibidas, mas alguns tipos de fuzis, como o T4, da Taurus, seguem liberados porque só foram proibidas armas que geram, em testes específicos, mais de 1.750 joules, uma medida de energia cinética. O equipamento da Taurus emite 1.748,63.

“À primeira vista, a portaria de armas particulares de policiais parece tentar reproduzir o regulamento pré-Bolsonaro, mas há claramente um afrouxamento, com aumento de número de armas restritas de duas para cinco e um critério de joules (medida de energia) que parece ter sido feito sob medida para contemplar o fuzil brasileiro mais vendido na era Bolsonaro”, afirmou Langeani.

Para especialistas e pesquisadores, o desvio de armas compradas legalmente é um dos principais fatores que contribuem para formação de arsenais no crime organizado.

Na última segunda-feira, 22, em Brasília, um subtenente da Polícia Militar do Distrito Federal registrou boletim de ocorrência depois de chegar de uma viagem e notar que armas que mantinha em casa haviam sido roubadas. Entre os itens levados, dois fuzis e uma pistola. As informações são do portal Metrópoles.

Entre 2019 e agosto de 2023, bandidos roubaram ou furtaram pelo menos 295 armas de policiais civis e militares no Estado de São Paulo, segundo reportagem do Metrópoles.

Entenda como as regras de armas em acervos de PMs foram alteradas
Até 2018, antes de Bolsonaro, os policiais militares podiam ter até oito armas em casa, em uma divisão específica:

6 armas de uso permitido, sendo até duas de cada tipo (2 de porte, 2 rifles e 2 carabinas, por exemplo)
2 armas de uso restrito, sendo elas de calibres específicos (357, 40 SW, .45ACP, 9mm). Fuzis não estavam contemplados.
A partir de 2019, as seis armas de uso permitido passaram a poder ser de qualquer tipo.

6 armas de uso permitido, sem limitação de cada tipo.
2 armas de uso restrito, de qualquer tipo, à exceção das automáticas – que disparam tiros em sequência com um acionamento de gatilho. Portanto, os policiais podiam comprar até 2 fuzis semiautomáticos.
Em janeiro de 2024, foram publicadas as novas regras, pelo governo Lula.
6 armas de uso permitido, sem limitação de tipo.
Até 5 das 6 podem ser restritas, desde que tenham poder de gerar determinada energia nos disparos. A lista atual de armas e calibres restritos foi publicada em portaria conjunta do Exército e da Polícia Federal em novembro. As restritas que podem ser compradas são aquelas que não geram, em testes específicos, energia cinética superior a 1.750 joules – uma unidade de medida de energia. Os fuzis com calibre 5,56 mm, como o do AR-15, da Colt, e do T4, da Taurus, emitem 1.748,63 joules, segundo a portaria conjunta.
Os policiais podem comprar até 600 munições por arma, por ano.
As novas normas para policiais militares são semelhantes às definidas pelo Exército para os acervos pessoais dos seus próprios homens, conforme uma portaria de dezembro. Os militares da Força também podem comprar seis armas, sendo cinco de uso restrito, como os fuzis.

A regra estipulada para os homens do Exército representou uma restrição a uma portaria de 2019, publicada no governo Bolsonaro, mas não resgatou o modelo que vigorava anteriormente. Antes de Bolsonaro eram permitidas seis armas de uso permitido, além de duas de uso restrito. Mas os tipos restritos deveriam ser de calibres limitados, e os de fuzil, como o 5,56 mm, não estavam contemplados.

A relação das PMs com o governos federal
Em 2018, as polícias militares foram uma importante base de apoio ao então presidente Jair Bolsonaro. Uma pesquisa de 2021 mostrou que a adesão ao “bolsonarismo radical” cresceu no meio militar estadual. Com vistas à reeleição, o então presidente editou medidas que beneficiavam a classe, mas foi criticado por falta de ações mais concretas.

A relação com as polícias, como por exemplo na definição de regras para uso de câmeras corporais, é um dos principais desafios do Ministério da Justiça e Segurança Pública do governo Lula.

Exército voltou a liberar novos CACs
O decreto de janeiro de 2023 paralisou a emissão de novas autorizações para CACs (Caçadores, Atiradores e Colecionadores de armas). Ainda em julho de 2023, um novo decreto de Lula sinalizou que elas seriam retomadas a partir de uma deliberação do Exército, o que voltou a ocorrer neste mês.

O decreto de julho também determinou que caberia ao Exército definir novas regras para compras de armas para as forças de segurança. Esses equipamentos devem ser registrados no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma).

Vinícius Valfré/Estadão Conteúdo

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