Veto de Lula atinge ministérios do centrão, e pastas ligadas ao PT são poupadas
Comunicações, Turismo, Esporte, Integração e Desenvolvimento Regional estão entre as pastas que mais sofreram perdas dessas emendas, recursos que deputados e senadores enviam para obras e projetos em seus redutos eleitorais e, com isso, colhem capital político.
Elas são chefiadas por União Brasil e PP e os ministros foram indicados pelo grupo político do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e pelo presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Ao mesmo tempo, ministérios mais ligados ao mandatário, como Saúde, Mulheres, Igualdade Racial, Povos Indígenas e Meio Ambiente, foram poupadas ou tiveram menos emendas retiradas da previsão orçamentária deste ano.
Diante disso, o petista desencadeou uma operação para evitar a eclosão de uma nova crise com o Congresso Nacional, que retorna do recesso em fevereiro e já vem se queixando de outras ações tomadas recentemente pelo Executivo.
Alas da União Brasil e do PP fizeram parte da base de Jair Bolsonaro (PL) e negociaram apoio a Lula após o petista abrir espaço no primeiro escalão a esse grupo político.
Ao sancionar o Orçamento deste ano, na segunda-feira (22), Lula aplicou um corte de R$ 5,6 bilhões nas chamadas emendas de comissão, que, segundo líderes do Congresso, serão usadas para acordos políticos que fortalecem as cúpulas da Câmara e do Senado.
Esse tipo de emenda funcionará, segundo esses líderes, como as extintas emendas de relator, que eram a principal moeda de troca nas negociações do governo Bolsonaro e do Legislativo. O mecanismo, criado no governo passado, foi derrubado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no fim de 2022.
Ao aplicar o veto bilionário, o presidente reduziu quase pela metade o orçamento das emendas de comissão no caso do Ministério do Esporte, comandado por André Fufuca (PP); e praticamente zerou essa verba para as Comunicações, de Juscelino Filho (União Brasil). No Turismo, de Celso Sabino (União Brasil), sobraram menos de 40%.
Apesar da tesourada, o total em emendas parlamentares em 2024 será recorde: R$ 47,5 bilhões. Existem três tipos de emendas: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região), as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso).
Lula tem agido para tentar evitar que o desgaste com o Legislativo se amplie. Ainda na segunda-feira, o Planalto fez chegar a parlamentares a promessa de que a verba alvo do corte será recomposta —não foi dado prazo para isso ocorrer, no entanto.
Nesta terça (23), Lula prometeu explicar os vetos. Em entrevista, declarou estar satisfeito com a relação do Executivo com os congressistas e criticou Bolsonaro, dizendo que ele “não tinha governança nesse país”.
“Na questão das emendas, o ex-presidente não tinha governança nesse país. Eu vou repetir: ele não tinha governança, quem governava era o Congresso Nacional. Ele não tinha sequer capacidade de discutir Orçamento. Porque ele não queria ou porque não fazia parte da lógica deles. O que ele queria é que deputados fizessem o que eles quisessem”, afirmou em entrevista à rádio Metrópole, da Bahia.
Segundo o petista, o seu governo estabeleceu uma “relação democrática” com o Congresso, com ministros conversando diariamente com lideranças da Câmara e do Senado. “E as coisas estão indo. Se não 100% do que a gente queria, mas está indo um percentual razoável, 60%, 70% daquilo que a gente quer.”
Lula afirmou ainda que negocia com os congressistas “sempre” e que dialogar com a Câmara “é sempre um prazer, é sempre difícil”.
“Não tenho o que reclamar da relação do Poder Executivo com o Congresso”, seguiu. “Eu negocio com o Congresso sempre. Ontem [segunda-feira] eu tive que vetar o Orçamento, R$ 5,6 bilhões [em emendas]. E tenho o maior prazer de juntar lideranças e conversar com elas e explicar porque foram vetados.”
Integrantes do centrão dizem que já esperavam que o corte fosse direcionado a ministérios dos partidos do grupo político. Esses membros consideram que o veto será derrubado, mas, por enquanto, aguardam a promessa do plano de Lula para recompor a verba.
Sem uma sinalização clara ou uma solução para ressuscitar as emendas vetadas, Lula enfrentará dificuldades principalmente na Câmara, dizem aliados de Lira.
Fufuca, do PP de Lira, entrou no governo em setembro. Sabino, em julho. Foram trocas ministeriais negociadas com líderes da Câmara para tentar melhorar a relação de Lula com o grupo que representa a maioria dos deputados. Juscelino recebeu a bênção de Lira e hoje é visto como indicação da bancada da União Brasil na Casa.
Além deles, o Ministério das Cidades, de Jader Filho (MDB), foi alvo dos vetos. A verba de emendas de comissão da pasta caiu quase pela metade. O ministério executa obras de mobilidade, além do Minha Casa, Minha Vida, visado por parlamentares na hora de escolher o que financiar com suas emendas.
O Ministério do Desenvolvimento Social, que cuida do Bolsa Família, também perdeu recursos com os vetos, apesar de ser comandado pelo petista Wellington Dias.
Outras pastas mais ligadas a Lula e ao PT, como Saúde, Mulheres, Igualdade Racial, Povos Indígenas e Meio Ambiente, tiveram perdas menores ou foram poupadas.
O Ministério da Educação também se livrou, porém, os parlamentares já haviam decidido colocar pouco dinheiro em emendas nessa pasta —menos de R$ 200 milhões. Há uma insatisfação no Congresso em relação ao ritmo de liberação e repasses autorizados pelo ministro Camilo Santana (PT).
Procurado, o Ministério do Planejamento não respondeu sobre os critérios para selecionar os alvos dos vetos.
O governo afirma que, com menos recursos no cofre, quis poupar do corte áreas consideradas mais importantes para a sociedade, como o Ministério da Saúde. O Fundo Nacional de Saúde, cuja função é irrigar os cofres dos entes federados para custeio, investimento e financiamento de ações da rede pública, continuará com R$ 4,5 bilhões de emendas de comissão.
As emendas de comissão têm sido turbinadas pelo Parlamento nos últimos anos. Em 2022, elas representaram um total de R$ 330 milhões. Para 2024, o Legislativo aprovou R$ 16,6 bilhões, em dezembro. Mas o Planalto diz que o acordo era o valor de R$ 11 bilhões, outro argumento usado para justificar o corte.
O governo justificou o veto em documento no qual afirma que, durante a tramitação do projeto, dotações inicialmente programadas pelo Executivo “sofreram redução considerável”, e parte dos recursos foi direcionada para as emendas de comissão. Disse que a medida foi necessária porque “programações relevantes” ficariam comprometidas.
O corte de Lula nas emendas se soma a outras ações que foram mal recebidas pelo Congresso e que azedaram a relação entre Executivo e Legislativo. No final de dezembro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), editou uma medida provisória que reonera a folha de pagamentos de setores da economia.
A medida gerou fortes críticas entre deputados e senadores, que acusaram o ministro de insistir numa política que já tinha sido rejeitada em votação pelo Parlamento.
Na semana passada, em outra iniciativa que irritou uma importante bancada do Legislativo, a Receita Federal suspendeu a ampliação de um benefício tributário concedido a pastores.
A decisão entrou na mira dos deputados da Frente Parlamentar Evangélica, e o governo precisou anunciar a criação de um grupo de trabalho para tratar do tema. Com as ameaças dos parlamentares religiosos, o Planalto avalia retomar o benefício.
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