PGR diz não haver provas de coação no acordo bilionário da J&F: ‘Ilações e conjecturas abstratas’

O procurador-geral da República, Paulo Gonet
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou no recurso contra a decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a multa de R$ 10,3 bilhões do acordo de leniência da J&F, que ‘não há provas de que houve coação’ contra os empresários Joesley e Wesley Batista, controladores do grupo. No acordo, os irmãos admitiram práticas de corrupção e se comprometeram a restituir os cofres públicos com cifras bilionárias.

Na decisão monocrática em que suspendeu o pagamento da multa, Toffoli declarou que “há, no mínimo, dúvida razoável sobre o requisito da voluntariedade da requerente (J&F) ao firmar o acordo de leniência”. Segundo o magistrado, isso justificaria, “por ora, a paralisação dos pagamentos, tal como requerido pela autora”.

Paulo Gonet, no entanto, afirma que só há “ilações e conjecturas abstratas” a respeito da suposta coação, e que isso não é o suficiente para suspender o acordo.

“Não há como, de pronto, deduzir que o acordo entabulado esteja intrinsecamente viciado a partir de ilações e conjecturas abstratas sobre coação e vício da autonomia da vontade negocial”, sustenta o procurador-geral da República.

PGR diz que caso não tem a ver com Lava Jato e quer mudar o relator

Paulo Gonet diz ainda, em seu recurso, que Toffoli não deveria ser o responsável por julgar o acordo de leniência do grupo J&F e pede a redistribuição da relatoria do caso.

Toffoli assumiu a relatoria porque considerou que a petição da J&F tinha relação com ações que envolvem a “Vaza Jato” – ou seja, a revelação de mensagens entre o ex-juiz federal e hoje senador Sérgio Moro (União-PR) e procuradores da Lava Jato – que lançou dúvidas sobre a idoneidade da operação que derrubou sólido esquema de corrupção na Petrobrás, entre 2003 e 2014.

Toffoli é juiz prevento de ações que envolvem o caso, assim, desdobramentos devem ficar sob sua alçada.

O recurso da PGR, no entanto, afirma que “o acordo de leniência celebrado pela holding J&F Investimentos S.A. não foi pactuado com agentes públicos responsáveis pela condução da Operação Lava Jato e seus desdobramentos”.

Gonet destaca que não houve participação da 13ª Vara Federal Criminal de Paraná, que era a vara conduzida por Moro, o ex-juiz citado diretamente na Operação Spoofing, que tratou da Vaza Jato.

O procurador-geral menciona a força-tarefa das operações Greenfield, Sépsis e Cui Bono Operação Carne Fraca, que, segundo ele, “não se confundem com a Operação Lava Jato e não são dela decorrentes”.

A operação Cui Bono, deflagrada pela Polícia Federal em 2017, é tida como um desdobramento da Operação Catilinárias que, por sua vez, foi aberta a partir de provas obtidas pela Lava Jato.

O nome da Lava Jato, inclusive, aparece no acordo de leniência da J&F, entre parênteses junto ao nome da Cui Bono, quando o texto esclarece as investigações que abastecem o caso.

Suspensão da multa causará ‘vultoso prejuízo’ a fundos de pensão

Outro argumento apontado no recurso da PGR é que a suspensão da multa bilionária da J&F pode causar um “grave risco ao sistema previdenciário complementar brasileiro”.

Gonet afirma que os fundos de pensão Funcef, da Caixa Econômica Federal, e Petros, da Petrobras, receberiam, cada um, cerca de R$ 2 bilhões do total de R$ 10,3 bilhões da multa. A paralisação dos pagamentos, então, representa um “vultoso prejuízo”, como definiu o procurador-geral.

Toffoli também suspendeu uma multa de R$ 3,8 bilhões da Novonor (antiga Odebrecht), chegando a um total de R$ 14,1 bilhões entre as duas. O valor ainda pode aumentar por meio de um efeito cascata, já que outras empresas que admitiram as práticas de corrupção e se comprometeram a restituir os cofres públicos, como UTC, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, OAS, Braskem e Engevix (atual Nova), podem aproveitar a oportunidade para pedirem a revisão dos próprios acordos de leniência.

O recurso foi recebido por Toffoli e, caso ele não acate os argumentos da PGR, deverá ser levado ao plenário do STF. Não há prazo estabelecido para essa decisão do ministro.

Ruben Anater/Estadão

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