Reoneração seguirá em vigor na MP para ajudar governo a reduzir bloqueio no Orçamento
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou em entrevista à GloboNews que o Executivo vai enviar um projeto de lei em regime de urgência para conduzir as negociações e chegou a dizer que a parte referente à desoneração da folha “vai ser tratada exclusivamente no PL, vai ser suprimida da MP”.
A declaração gerou no Congresso Nacional, nas empresas beneficiadas e em parte do próprio governo a expectativa de envio de uma nova MP revogando o trecho que prevê a reoneração da folha a partir de 1º de abril. A frustração tende a gerar ruído com os parlamentares.
Integrantes da equipe econômica ouvidos reservadamente pela Folha afirmam que uma MP revogadora comprometeria os cálculos para a avaliação bimestral do Orçamento, gerando um risco ampliado de contingenciamento de despesas por causa da frustração na arrecadação.
Embora a própria MP diga que a reoneração só vale a partir de 1º de abril, o texto publicado tem força de lei e permite ao governo incorporar, desde já, os ganhos fiscais da iniciativa.
O principal deles é não precisar reconhecer perdas de R$ 12 bilhões com a desoneração da folha das empresas e de R$ 4 bilhões com o corte das alíquotas dos municípios.
Revogar agora o trecho da MP, portanto, significaria retomar as desonerações aprovadas pelo Congresso e absorver o impacto integral nas estimativas do Orçamento.
Por isso, integrantes do governo consideram crucial que a reoneração seja mantida no texto da MP pelo menos até 22 de março, sem prejuízo da condução das discussões de mérito no âmbito do projeto de lei. Desde sua edição, a medida é considerada a “âncora fiscal” do primeiro relatório.
Uma autoridade afirma sob reserva que “não pode ter um vácuo”, sob pena de afetar os cálculos do primeiro relatório bimestral.
Segundo técnicos, o próprio projeto de lei tratará da revogação do trecho da MP que prevê a reoneração a partir de 1º de abril. Nesse formato, porém, a medida só teria validade legal após a aprovação e sanção do texto —que, no cenário ideal, se desenrolaria nessa janela entre 22 de março e 1º de abril.
A Folha procurou o Ministério da Fazenda para obter esclarecimentos do que Haddad quis dizer com a expressão “suprimida da MP” e se isso significava uma nova medida para revogar o trecho.
Na primeira resposta, a assessoria de imprensa encaminhou o áudio da declaração do ministro à GloboNews. Após a insistência da reportagem para saber se haverá uma MP revogadora, não houve resposta do ministério.
O ministro Rui Costa (Casa Civil) disse à Folha que o governo está dialogando com o Congresso sobre o tema e citou apenas o projeto de lei como solução para o impasse.
“O ministro Haddad teve uma reunião ontem [quarta, 21] sobre a MP 1.202, que vai ser desdobrada em projeto de lei”, afirmou após a posse de Flávio Dino como ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
A estratégia do governo é evitar o impacto da desoneração agora e “trabalhar com mais calma” na segunda revisão do Orçamento, que ocorrerá em maio de 2024.
Até lá, o Executivo espera ter uma “visão mais realista” das receitas e despesas. A data é para quando o mercado espera a flexibilização da meta de déficit zero, cujo cumprimento exigiria um contingenciamento bilionário —e indesejado pela ala política do governo.
Mas a manutenção da reoneração na MP, ainda que o governo tenha sinalizado abertura para as negociações, deve gerar desgaste com os parlamentares.
Autor do projeto que prorroga a desoneração, o senador Efraim Filho (União Brasil-PB), líder do partido na Casa, disse que o governo “tem de revogar o trecho da MP de toda forma”, independentemente do envio do projeto.
“A decisão política já foi tomada. Ao governo falta apenas formalizar a nova MP”, disse Efraim Filho. “O governo já admitiu que não recupera a desoneração, especialmente em 2024”, afirmou.
Empresários dos setores alcançados pela desoneração também tinham a expectativa de revogação do trecho da MP e devem intensificar as conversas com o Legislativo na tentativa de restabelecer o benefício.
A desoneração da folha foi criada em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), e prorrogada sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.
A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha.
Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, entre outros.
A prorrogação do benefício até o fim de 2027 foi aprovada pelo Congresso no ano passado, mas o texto foi integralmente vetado por Lula. Em dezembro, o Legislativo decidiu derrubar o veto presidencial, restabelecendo o benefício setorial.
Em reação, o ministro da Fazenda enviou uma MP ao Congresso, propondo a reoneração gradual da folha de pagamentos e a consequente revogação da lei promulgada após a derrubada do veto.
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