Leite vê tentativa de criar governo paralelo no RS, e clima com gestão Lula fica azedo
Na solenidade, ocorrida na quarta-feira (15) em São Leopoldo, Leite enfatizou a superação de divergências ideológicas e afirmou que as necessidades urgentes da população gaúcha serão atendidas com “o maior esforço de seu presidente, de seu governador e de prefeitos”.
A ausência de um agradecimento direto a Lula não passou despercebida por integrantes do Palácio do Planalto e foi interpretada como demonstração de contrariedade do tucano com a nomeação de Paulo Pimenta (PT) para a Secretaria Extraordinária para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul.
Aliados do governador admitem, sob reserva, que Leite ficou muito incomodado com a designação de um político com pretensões eleitorais no estado. O governador soube pela imprensa da nomeação de Pimenta, como informou a coluna Painel, da Folha.
Segundo esses aliados, o temor de Leite é que Lula queira criar um governo paralelo no estado, em que os ministros passem a discutir medidas diretamente com Pimenta, desviando do Palácio do Piratini.
Um integrante da equipe de Leite afirmou, na condição de anonimato, que o governo do estado não se opunha à constituição de uma autoridade desde que ela se limitasse ao acompanhamento das ações federais no Rio Grande do Sul.
Segundo relato, o Ministério da Fazenda já havia apresentado uma proposta segundo a qual caberia ao governo Lula a definição do destino dos recursos oriundos da suspensão do pagamento da dívida do estado com a União.
A Fazenda chegou a elaborar o texto em que o governo Leite se comprometeria a submeter à União a aplicação do dinheiro mantido nos cofres do estado graças à suspensão do pagamento da parcela da dívida. Mas Leite não concordou e convenceu Lula de que essa fórmula seria inviável diante da urgência de medidas para reconstrução do RS.
O medo agora é que a secretaria represente nova tentativa de controle dos recursos no estado. O mal-estar poderá se acentuar caso Pimenta indique o ex-prefeito Emanuel Hassen De Jesus, conhecido como Maneco Hassen, para a secretaria-executiva da autoridade federal.
O presidente do PSDB, ex-governador de Goiás Marconi Perillo, foi um dos porta-vozes dessa insatisfação. “Causou muita estranheza o fato de o presidente ter anunciado a autoridade federal sem ter sequer falado disso com o governador, que é a principal autoridade constitucional no estado”, afirmou.
Perillo disse esperar que essa autoridade apoie a reconstrução do Rio Grande do Sul, “com recursos que precisam ser destinados ao estado”.
“A gente espera que a ajuda seja em forma de transferência gratuita, ou seja, em doação, porque o estado não suporta mais operações de crédito. Então a gente espera que realmente essa autoridade possa ajudar e não atrapalhar”, disse.
Já o ex-governador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou que questionará, na Câmara dos Deputados, os fundamentos legais para a constituição desse ministério. Na opinião de Aécio, abre-se um precedente perigoso. “É uma intervenção no estado não prevista na Constituição”, disse ele.
Aécio pergunta se o PT consideraria razoável se o governo Jair Bolsonaro (PL) criasse secretarias extraordinárias nos estados brasileiros para combater a pandemia da Covid-19.
Segundo Aécio, o episódio começa com uma indelicadeza de Lula ao instituir a autoridade sem avisar ao governador do Rio Grande do Sul e pode acabar com uma imprudência.
O próprio Leite, entretanto, negou incômodos na relação com Pimenta. “Não contem comigo para disputa política, não contem comigo para disputa de vaidades, de egos, é em favor da sociedade. Temos uma população nesse momento que está sofrendo”, afirmou.
“Não temos o direito de permitir que qualquer tipo de diferença ideológica, programática, divisão política ou de aspiração pessoal possa interferir na nossa missão que atender essas pessoas. Vou me reunir em breve, inclusive com o ministro [Pimenta] e vamos atuar para que possamos coordenar essas ações conjuntamente”, concluiu.
Na cerimônia de quarta, Pimenta posou ao lado de Lula e Leite após o presidente assinar medida provisória que institui o vale reconstrução, apoio financeiro destinado a famílias de desabrigados. Os três ergueram o documento para fotos.
Na avaliação de um aliado de Leite, esse foi um retrato da politização da crise. Em seu discurso, o governador reafirmou pedido de anistia parcial da dívida do estado com a União e pregou a superação de diferenças políticas.
“Não permitiremos que haja diferença que nos impeça de atender às necessidades urgentes que serão atendidas com maior esforço do seu presidente, do seu governador e dos prefeitos e de cada um daqueles que escolheram a vida pública para servir a esta sociedade”, discursou.
Já o site oficial do Governo do Rio Grande do Sul destacou, do discurso de Lula, a afirmação de que a ação do governo federal não é um favor. A frase de Lula reproduzida na página do estado foi a seguinte: “O problema de uma cidade não é apenas dela: é do estado, do governo federal, da nação. O que estamos fazendo não é nenhum favor, pois é uma necessidade ajudar todos”.
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