Viagens de servidores e autoridades no ‘Gilmarpalooza’ já custaram R$ 1,3 milhão de dinheiro público
O evento é organizado por instituto de ensino superior do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, e ocorreu entre quarta, 26, e esta sexta-feira, 28, na capital portuguesa. O levantamento do jornal O Estado de São Paulo é parcial, com base nas informações já publicadas: o valor final tende a aumentar. Procurados, os órgãos confirmaram as informações e detalharam as agendas de seus representantes.
Nos últimos anos, o evento na capital portuguesa se tornou um dos mais importantes do calendário político brasileiro. Ao longo desta semana, o Congresso ficou esvaziado – funcionando em regime remoto – e o Supremo Tribunal Federal (STF) antecipou sessões do plenário para que ministros pudessem viajar a Portugal. Ao todo, 160 autoridades dos três Poderes e ao menos 20 assessores foram à capital ibérica para o evento promovido por Gilmar Mendes. A maioria deles com custos pagos pelo contribuinte.
A programação oficial inclui três dias de palestras na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, uma instituição pública de ensino criada em 1913. De 318 palestrantes confirmados, 265 são brasileiros (84%). Outros 44 são portugueses e só 9 são de outras nacionalidades. O evento é organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), do qual Gilmar Mendes é sócio, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e a Universidade de Lisboa. Para além das palestras, o evento é famoso pelas conversas de bastidores, jantares e coquetéis oferecidos por empresas.
Só em diárias, o valor desembolsado chega a R$ 1,2 milhão. O pagamento foi feito a pelo menos 78 pessoas, entre servidores, políticos, seguranças, ministros de Estado e membros do Poder Judiciário. A conta tende a aumentar: os dados consultados pela reportagem estão atualizados até o dia 26 de junho, o que significa que nem todos os pagamentos aparecem nas ordens bancárias.
Quanto às passagens, não é possível saber o montante gasto até agora. O Estadão conseguiu identificar apenas R$ 181,4 mil, referente a 14 autoridades. Neste caso, a maioria dos portais da transparência ainda não publicou informações sobre o mês de junho, o que dificultou o levantamento dos dados.
Para chegar aos números, o Estadão combinou informações do Diário Oficial da União; da lista de palestrantes do Fórum Jurídico; das ordens bancárias do Siafi; dos portais da transparência e de documentos do Sistema de Concessão de Diárias e Passagens (SCDP).
O IDP informou que o fórum não custeia passagens nem hospedagem dos participantes. No entanto, a FGV, que também faz parte da organização do evento, pagou parte dos custos de viagem do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, e do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Passos Rodrigues. Em 2022, a FGV foi alvo de investigação da Polícia Federal, sob a suspeita de fraude em licitação e corrupção de agentes públicos. A PF chegou a deflagrar uma operação para investigar a instituição de ensino, com buscas nas sedes de São Paulo e do Rio.
Outros cinco ministros da Suprema Corte viajaram a Lisboa, mas não informaram quem custeou suas passagens. Procurada, a FGV decidiu não comentar.
O órgão com maior número de enviados a Lisboa que aparecem nos dados é a Câmara dos Deputados, com 25 pessoas. Desse total, 21 são parlamentares, incluindo o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Juntos, eles receberam R$ 257,8 mil em diárias. Nem todos tinham palestras no fórum, mas aproveitaram o evento para fazer política. Todos os candidatos à sucessão de Lira na Presidência da Câmara viajaram ao Velho Continente.
A Câmara desembolsou ainda R$ 95,6 mil em diárias a quatro servidores, incluindo o diretor da Polícia Legislativa da Câmara, Paul Pierre Deeter, e o policial legislativo Romulo Sofocles de Almeida Panza, responsáveis pela segurança de Lira. A Casa ainda não publicou os custos das passagens. Procurada, indicou realizar uma demanda via Lei de Acesso à Informação (LAI), que estipula um prazo de até 30 dias para respostas.
Por sua vez, o Senado pagou R$ 105,4 mil em diárias a seis senadores, entre eles o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), e o presidente do PP, Ciro Nogueira. O presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) estava na programação oficial do evento, mas não viajou a Lisboa.
Nove ministérios do governo Lula, além da Polícia Federal, enviaram representantes a Portugal. Os gastos de sete deles chegam a R$ 181,6 mil somente em diárias. Cinco ministros de Estado participaram do evento – Alexandre Silveira (Minas e Energia), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), Anielle Franco (Igualdade Racial), Vinícius Carvalho (CGU) e Jorge Messias (AGU). As outras Pastas – Transporte, Educação, Desenvolvimento Social e Cidades – enviaram representantes.
A Presidência da República realizou o pagamento também de R$ 12,2 mil em diárias para dois seguranças do ex-presidente Michel Temer (MDB). O político participa de uma mesa na tarde desta sexta-feira com o tema “O que fica do Presidencialismo de Coalizão?”.
A lista inclui ainda 18 diretores, procuradores e presidentes de sete agências reguladoras: Anatel, ANA, Aneel, ANS, Antaq, ANTT e Anvisa. As diárias de 12 deles custaram R$ 217,6 mil aos cofres públicos.
Já o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) desembolsou R$ 135 mil em diárias e R$ 91,7 mil em passagens para a ida à Europa do presidente, Alexandre Cordeiro, do superintendente, Alexandre Barreto, e de quatro conselheiros. Eles aproveitaram a viagem, no entanto, para participar de um workshop em Barcelona.
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