Copom deve manter Selic em 10,5%, mas endurecer tom, dizem economistas
O comitê, por outro lado, deve emitir comunicado mais duro com relação à deterioração do cenário econômico, sinalizando possibilidade de alta na Selic em decisões futuras, de acordo com especialistas consultados pela Folha.
Na última reunião, em 19 de junho, o Copom obteve consenso para interromper o ciclo de cortes da taxa básica de juros, ainda que sob pressão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para uma redução.
Até então, a taxa havia passado por seis reduções de 0,5 ponto percentual e uma de 0,25 ponto, o que a levou para o menor patamar desde fevereiro de 2022, quando estava fixada em 9,25% ao ano.
Para a reunião desta quarta, pesa na decisão do órgão a deterioração de expectativas de inflação, incertezas com relação à capacidade de cumprir o arcabouço fiscal (a nova regra para as contas públicas aprovada no ano passado) e um câmbio mais desvalorizado.
“Os modelos do Banco Central provavelmente apontarão para uma inflação ainda elevada nos próximos dois anos, e isso dificulta a redução da Selic”, diz Thaís Zara, economista sênior na LCA Consultores.
O IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) registrou nova desaceleração em julho, para 0,30% —acima das expectativas de 0,23% do mercado. Os preços do grupo alimentação e bebidas aliviaram o índice, com recuo de 0,44%, enquanto transportes tiveram alta de 1,12%. Nos últimos 12 meses, o IPCA-15 teve ganho de 4,45%, enquanto o mercado esperava 4,38%.
O centro da meta oficial para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) é de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.
Economistas consultados pelo Banco Central, por outro lado, voltaram a prever inflação maior, com a expectativa para o IPCA passando de 4% para 4,05% neste ano, segundo último boletim Focus.
A mesma pesquisa mostrou que a expectativa sobre a taxa Selic permanece estável em 10,5% para este ano, em 9,5% para 2025 e em 9% para 2026 e 2027.
Até o fim do ano, quando termina o mandato de Roberto Campos Neto, atual chefe da autoridade monetária, o Copom tem mais três rodadas de reuniões —17 e 18 de setembro, 5 e 6 de novembro e 10 e 11 de dezembro.
Nesse intervalo, o órgão pode decidir por uma nova alta na taxa básica, na avaliação de Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.
“Teremos muita turbulência pela frente e o câmbio vai ficar mais alto do antes, o que, junto com o fiscal mal encaminhado, pressiona a inflação. Por conta disso, o risco é o Banco Central ter que subir a Selic este ano. A possibilidade de alta é maior do que a de baixa”, diz.
O avanço mensal de 0,25% do Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br) também pode levar a uma postura mais conservadora do Banco Central, de acordo com Alessandra Ribeiro, economista e sócia diretora da consultoria Tendências.
“Do ponto de vista da atividade econômica, é positivo, mas, do ponto de vista da inflação, é mais um elemento que ainda pede cautela”, afirma.
Os economistas citam as tensões políticas norte-americanas e incertezas sobre a saúde fiscal do Brasil como fatores de influência para a depreciação do câmbio. O peso das mudanças no cenário internacional, entretanto, é limitado, segundo Vale.
“Países emergentes parceiros não tiveram pressão como nós tivemos. O cenário doméstico tem peso mais importante nesse sentido”, diz.
Zara, da LCA consutores, vai na mesma linha: “existe o componente externo das eleições dos EUA, mas há também o componente doméstico, que é a dificuldade de vislumbrar as contas do governo caminhando para uma consolidação do superávit”.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) anunciou um bloqueio de R$ 11,2 bilhões e contingenciamento de R$ 3,8 bilhões no Orçamento deste ano em uma tentativa de cumprir as regras do arcabouço fiscal. Emendas parlamentares e ministérios que concentram obras devem estar entre os principais alvos.
A medida, apesar de positiva, é insuficiente para sinalizar vontade política do governo em fazer ajustes considerados importantes para o mercado, segundo Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim.
“O governo precisaria adotar medidas fiscais mais robustas para convencer os agentes econômicos, tanto no âmbito técnico quanto político. Uma possibilidade seria a revisão de indexações em setores como saúde e previdência, além da reavaliação de gastos tributários”, diz.
Mas mais importante do que a manutenção da taxa de juros será a comunicação do Banco Central para coordenar expectativas, de acordo com especialistas.
“A indicação deve ser a de que o balanço de riscos está piorando. O BC vinha cortando taxas, mas, agora, está inseguro e precisou reagir e seguir sinalizando isso”, diz Padovani.
“O comunicado deve vir mais duro, no sentido de sinalizar que, se a deterioração observada se mostrar mais duradoura, o Copom deve reagir e subir a Selic”, afirma Ribeiro, da Tendências.
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