Atuação do corregedor Luis Felipe Salomão intimida magistrados
Ministros Luís Roberto Barroso, presidente do Conselho Nacional de Justiça, e Luis Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça, durante Sessão Ordinária em 13.ago.2024
A atuação do corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, na esfera disciplinar intimida os juízes.
Consulta a 30 operadores do direito revela que magistrados temem ser punidos por decisões jurisdicionais, não sujeitas a apuração administrativa pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Juízes e promotores que, antes, se manifestavam sem reservas sobre problemas administrativos agora optam por ter seus nomes preservados. Entre 16 magistrados ouvidos, apenas dois preferiram ser identificados. A grande maioria reprova o rigor das decisões do ministro.
O corregedor encerra sua gestão no final deste mês.
“A gestão de Salomão foi afetada pela pretensão em ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal. Tudo de bom que eventualmente possa ter sido feito foi ofuscado por isso”, diz um juiz estadual.
Não foram sugeridas questões específicas aos consultados. O grosso das avaliações remete ao processo disciplinar da Lava Jato. Em abril deste ano, o presidente do CNJ, Luís Roberto Barroso, e o corregedor nacional divergiram sobre o afastamento de magistrados do TRF-4.
Barroso considerou a decisão monocrática de Salomão “ilegítima, arbitrária e desnecessária”.
“Se chancelarmos isso, estaremos cometendo uma injustiça, quando não uma perversidade”, afirmou.
As principais associações de magistrados enviaram ofícios reprovando as conclusões de Salomão.
Barroso previu naquela ocasião que “a represália do conselho a uma decisão jurisdicional contaminaria negativamente toda a magistratura.”
Semanas depois, juízes criminais federais, reunidos em seminário em Foz do Iguaçu, anunciaram que haveria reação às intimidações.
Espiral vaidosa
Salomão não blindou magistrados, como fez o corregedor João Otávio de Noronha; não tratou a correição como terapia, como fez Humberto Martins. Deu continuidade a processos disciplinares que a antecessora, Maria Thereza de Assis Moura, comandou pessoalmente.
Mas Salomão “perdeu a mão”, diz um juiz federal de segunda instância [autodenominado desembargador federal]. “O ministro mergulhou numa espiral vaidosa, talvez em busca de promoção pessoal. Sua implacabilidade, não raro injusta, o desconstruiu enquanto magistrado de formação genuína”, afirma.
“O grande destaque negativo fica para a tentativa de afastamento do cargo, sem qualquer contemporaneidade entre as condutas e o momento do julgamento de juízes e desembargadores que decidiram casos da Lava Jato. Além disso, era profundamente discutível o mérito das imputações”, comenta um juiz estadual de primeira instância.
“O juiz médio fica receoso de mexer com os poderosos. Esse é o grande ‘legado’ de Salomão”, conclui.
“O corregedor se encarregou de perseguir juízes que deram decisões desfavoráveis a políticos, e a mando de políticos. Na minha comarca, fomos pessoalmente vítimas de achaque de políticos graças a esta gestão”, diz outro juiz estadual.
Elogios e críticas
O desembargador Alfredo Attié Jr., presidente da Academia Paulista de Direito, discorda. Diz que Salomão atuou “com discrição e técnica, sem o alarme costumeiro”.
“O exemplo está na atuação a respeito da operação Lava Jato, que tantos embaraços trouxe à imagem do Judiciário brasileiro. Despolitizando a atividade administrativa, a partir de denúncias, o ministro desvendou uma questão técnica relativa à administração inadequada de valores que circularam nos processos.”
“Buscou impedir que determinações jurisdicionais de tribunais superiores viessem a ser descumpridas por instâncias inferiores. A imparcialidade, a serenidade e a formação técnica do ministro ficaram claras à sociedade, quando enfrentou críticas imerecidas a seu trabalho, mesmo no CNJ”, diz Attié.
O procurador da República Celso Tres, crítico dos excessos da Lava Jato, diz que Salomão pecou pela precipitação e superficialidade.
“Investigação profunda e responsável exige tempo e pessoas independentes, qualificadas. Não havia por que afastar juízes da jurisdição. Bastava retirá-los da operação.”
Tres diz que Salomão foi precipitado ao “desautorizar corregedorias dos tribunais, avocando de público, escrachando culpa, questões menores”.
“Autoridade da Justiça está na credibilidade. Depois de escrachado, o magistrado estará maculado.”
“Hoje, juízes no Brasil não têm independência funcional. Cumprimento da Constituição e da lei está constrangido pelo temor ao CNJ”, diz o procurador.
Uma procuradora da República diz que a conduta de Salomão “beirou a ilegalidade, pois acionou a Polícia Federal, quebrou sigilos sem ordem judicial senão a dele mesmo.”
Ele “investigou magistrados como se fosse um inquérito policial”, diz.
Outro lado
A assessoria de imprensa da Corregedoria Nacional informou que o ministro Salomão preferiu não fazer comentários.
Ao final da gestão, a assessoria enviou um ‘folder’ sobre as principais atividades da corregedoria nesta gestão.
De setembro de 2022 a agosto de 2024, houve acréscimo de 14% de processos recebidos na corregedoria e 8% de processos baixados.
Foram instaurados 82 Processos Administrativos Disciplinares (35 deles com afastamento cautelar das funções) e 12 Revisões disciplinares.
O Plenário julgou 208 processos de relatoria da Corregedoria Nacional.
Todos os tribunais de Justiça das 27 unidades da Federação foram inspecionados. Foram realizadas 16 correições extraordinárias.
Frederico Vasconcelos. Folhapress
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