Escalada da crise entre Brasil e Venezuela provoca novo racha no PT
A presidente do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann |
O Itamaraty respondeu nesta sexta-feira, 1, à nota em que o governo venezuelano disse que Amorim estava se comportando como “mensageiro do imperialismo americano”. A gota d´água para o Ministério das Relações Exteriores decidir se manifestar foi o fato de a Polícia Nacional Bolivariana ter postado em suas redes sociais uma fisionomia borrada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tendo ao fundo a bandeira do Brasil. “#Quem mexe com a Venezuela se dá mal”, diz a mensagem que acompanha a foto.
Em nota, o Itamaraty afirmou que autoridades venezuelanas têm adotado “tom ofensivo” em relação ao Brasil e aos seus símbolos nacionais, fazendo “ataques pessoais e escaladas retóricas”.
Antes deste comunicado, Gleisi já havia condenado as críticas a Celso Amorim, que é filiado ao PT, e defendido o diálogo entre os dois países. Depois disso, porém, preferiu o silêncio. A eleição que renovará a cúpula do PT deve ocorrer até junho de 2025 e, mesmo sem poder disputar novo mandato, Gleisi tem sido alvo de muitas críticas. A Venezuela é um tema importante no debate sobre os rumos do partido.
A Executiva Nacional do PT endossou a posição do Conselho Eleitoral da Venezuela, que declarou a vitória de Maduro, um dia depois da disputa no país vizinho. A nota do PT foi divulgada na noite de 29 de julho, apesar das denúncias de fraude.
Em agosto, após um vaivém retórico, Lula disse que não reconheceria o ditador da Venezuela como vencedor – tampouco o oposicionista Edmundo González – enquanto os boletins de urna não fossem apresentados. Vários países pediram verificação dos votos. Sem sucesso.
À época, Gleisi afirmou que Lula estava certo ao tomar essa posição. “Mas nós somos partido, e não governo. Nós reconhecemos a institucionalidade do resultado. Agora, tem um conflito lá e a disputa está judicializada. Temos de esperar a decisão do Supremo da Venezuela”, afirmou a deputada, em conversa com o jornal O Estado de São Paulo.
No dia 22 daquele mês, a mais alta Corte venezuelana, que é alinhada ao regime de Maduro, declarou a vitória do ditador e proibiu a divulgação das atas eleitorais.
A partir daí as relações entre Lula e Maduro – que chegou a ser recebido com tapete vermelho no Palácio do Planalto, em maio de 2023 – degringolaram de vez.
Mesmo com todas as evidências de irregularidades, o Foro de São Paulo também reconheceu, em 29 de setembro, a reeleição de Maduro. A dirigente do PT Mônica Valente é secretária executiva do Foro – organização que reúne partidos de esquerda da América Latina – e subscreveu o documento.
O auge da crise com a Venezuela, porém, ocorreu nos últimos dias. Na semana passada, o Brasil vetou o ingresso do país vizinho no Brics durante a cúpula de líderes do bloco, realizada em Kazan, na Rússia. Em protesto, Maduro convocou para consultas, na quarta-feira, 30, o embaixador da Venezuela no Brasil, Manuel Vicente Vadell. Na diplomacia, a convocação do representante do país significa um gesto de repúdio.
“É um absurdo o que está acontecendo. Chegou a hora de o nosso governo rever as relações com a Venezuela. E já passou da hora de o PT fazer uma autocrítica sobre o seu apoio a Maduro”, disse o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG). “Os pobres estão sendo expulsos da Venezuela, que virou uma autocracia. Nós vamos continuar apoiando isso?”.
Lopes chegou a sugerir que o PT tomasse a frente de um movimento para criar uma entidade com o objetivo de substituir o Foro de São Paulo. “Deveríamos constituir um foro democrático de centro para pensar o desenvolvimento social e econômico da América Latina, as conexões entre os diversos países e projetos conjuntos nas áreas social e de infraestrutura”, argumentou o deputado.
Para o historiador Valter Pomar, integrante do Diretório Nacional do PT, Lopes está assumindo cada vez mais “posições extremistas”. Coordenador da corrente Articulação de Esquerda, Pomar lembrou que, em 2016, o deputado atribuiu o fracasso do PT naquelas eleições ao fato de o partido não abandonar o discurso do “golpe”.
Pomar fez questão de destacar que a nota da Executiva do PT reconhecendo a reeleição de Maduro foi aprovada por unanimidade. “No PT existem diferentes opiniões sobre muitos assuntos. Mas a posição da direção do partido foi aprovada e ninguém pediu para que ela fosse revista ou alterada”, assinalou. Questionado sobre as críticas do regime venezuelano a Amorim, ele respondeu: “Acho que as duas partes – o governo do Brasil e o governo da Venezuela – deveriam parar de fazer notas”.
Na avaliação do presidente do PSB, Carlos Siqueira, o que ocorre na Venezuela é reflexo de um regime “ditatorial, incivilizado e precário”. Siqueira afirmou que o governo Lula foi “no mínimo ingênuo” ao não admitir de pronto a fraude na eleição venezuelana.
“Celso Amorim deu muitas voltas até que houvesse o recuo”, constatou Siqueira. “De ditaduras nós nunca podemos esperar eleições livres, soberanas e democráticas”, completou ele.
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