TSE foca milícia armada ao vetar candidato sem condenação
O voto do relator Antônio Carlos Ferreira, aprovado por unanimidade, focou no veto ao uso de milícia armada por partidos em sua atuação, previsto na Constituição e na Lei dos Partido Políticos. Foi com base nesse dispositivo que houve a rejeição do recurso do vereador Fabinho Varandão (MDB), de Belford Roxo (RJ), contra o indeferimento do registro de sua candidatura à reeleição.
Procurada, a defesa de Varandão não se manifestou. Quando teve o registro indeferido, o vereador criticou a decisão. “Nunca fui julgado, não tem nenhuma condenação. Entendimento não é lei. Quando chegar em Brasília, vai se prevalecer a lei”, afirmou Varandão em suas redes sociais.
Os magistrados fluminenses haviam utilizado como base outro artigo da Constituição, que faz alusão à vida pregressa do candidato, probidade administrativa e moralidade. A regra estabelece, no entanto, que uma lei especificará essas situações. Não há nenhuma previsão legal, nem na Lei das Inelegibilidades nem na Lei da Ficha Limpa, que impeça a candidatura apenas pela condição de réu ou acusado.
“É incabível o amparo do art. 14, § 9º, da Constituição Federal [que trata da vida pregressa], para o indeferimento do registro, porque dependente de lei complementar para novas hipóteses de inelegibilidade, não sendo ele autoaplicável”, afirma o voto de Ferreira.
A mudança tem relevância por restringir o veto a acusados de envolvimento com quadrilhas armadas. Com base no entendimento anterior, o TRE-RJ chegou a barrar um candidato a prefeito denunciado sob acusação de corrupção. Especialistas temiam a falta de critério na análise da vida pregressa sem uma regra clara.
Ao alterar a fundamentação do voto, o ministro rejeita a tese de que o TSE altera entendimento já estabelecido na corte, segundo o qual não cabe ao julgador definir os casos nos quais a vida pregressa do candidato implicará inelegibilidade.
Ele afirma estar se baseando em outro dispositivo constitucional e fixa uma nova tese, também aprovada por unanimidade pelos ministros, para produzir efeitos já nas eleições de 2024.
“A vedação de candidatura de integrante de organização paramilitar ou congênere deriva diretamente do art. 17, § 4º, da Constituição, norma de eficácia plena, que impede a interferência, direta ou indireta, no processo eleitoral, de todo e qualquer grupo criminoso organizado.”
Apesar de divergir dos magistrados do Rio de Janeiro, o relator repete parte da argumentação do TRE ao afirmar que “a Justiça Eleitoral não pode fechar os olhos à realidade nacional na qual organizações criminosas buscam se infiltrar na política”.
“O que se busca, no presente caso, é a eficiência dessa resposta ao impedir, desde logo, o registro de candidaturas reconhecidamente relacionadas às organizações criminosas, alicerçadas na influência ilegal desses grupos no processo eleitoral, cujos interesses se baseiam em atividades criminosas e no monopólio espúrio do comércio por intermédio de domínio territorial, todos se valendo da violência armada como forma de garantir a legitimidade de poder”, afirmou o ministro.
Ferreira afirma em seu voto que não é necessário uma sentença condenatória para impedir o registro.
“O candidato ostenta contra si diversos elementos denotativos de sua participação em milícia armada, na prática de extorsões e no porte ilegal de armas para manter o domínio de atividades econômicas locais, o que atrai a vedação prevista no art. 17, § 4º, da Constituição”, diz o voto do ministro.
O vereador foi denunciado sob acusação de ameaçar e extorquir concorrentes na distribuição de sinal de internet em bairros de Belford Roxo.
O voto da desembargadora eleitoral Maria Helena Pinto Machado, do TRE, descreve os depoimentos do inquérito contra Varandão e outras provas da ação penal.
“A reforma do acórdão regional representaria um retrocesso significativo nas conquistas sociais e jurídicas, minando a confiança da população nas instituições e na legitimidade do processo eleitoral, isso sem falar na negativa de vigência a dispositivo constitucional de eficácia plena (art. 17, § 4º) e, por isso, de aplicabilidade imediata, integral e direta”, diz o ministro.
A gestão da ministra Cármen Lúcia, que assumiu a presidência da corte em junho, tem incentivado medidas para combater a influência do crime organizado na eleição e acenado de forma favorável ao entendimento mais duro para barrar candidaturas.
Em entrevista recente, ela citou a regra da Constituição que fala da vida pregressa e disse que o crime organizado indica pessoas sem obstáculos processuais para evitar a inelegibilidade, de modo que o juiz não tenha motivos para negar o pedido de registro.
Assim, diz ela, “haveria a possibilidade de a gente fazer um saneamento neste pedido de registro de candidaturas”, caso se verificasse que essa pessoa “teria que representar ou substituir aquele que não poderia estar ali” —em referência ao mundo do crime.
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