RenovaBR quer se blindar de ‘posturas antidemocráticas’ e aposta na eleição de 2024

A diretora executiva, do RenovaBR, Bruna Barros
Em meio à deterioração do debate público, com a proliferação de discursos radicais e campanhas de desinformação no Brasil, o RenovaBR, movimento de renovação política fundado pelo empresário Eduardo Mufarej e apoiado pelo apresentador Luciano Huck, decidiu ser mais criterioso na escolha dos candidatos do grupo nas eleições de 2024 para evitar encampar nomes com posturas antidemocráticas. Segundo a diretora executiva, Bruna Barros, essa é uma preocupação, embora o grupo não queira perder o caráter de espaço pluripartidário.

“Conseguimos quantificar hoje, dentro do nosso processo seletivo, esse espectro de pessoas que tendem a sair ou a pensar fora das regras democráticas do jogo”, afirma ela, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo. As perguntas envolvem, por exemplo, qual a opinião do candidato sobre viver em uma democracia e o quão fundamental é o povo escolher seus líderes em eleições livres.

Bruna garante, por outro lado, que as pessoas não são preteridas por suas escolhas partidárias na triagem e que essa diferenciação é feita em termos de visão de mundo e de sociedade. “Dos espectros de A a Z, e hoje temos alunos de 29 partidos, conseguimos ter pessoas com visões democráticas. Assim como há pessoas em diversos partidos que também têm visões radicais”.

Entre as crias do RenovaBR está o deputado federal bolsonarista Luiz Lima (PL-RJ), ex-nadador olímpico que ganhou notoriedade no meio político com vídeos na internet atacando o processo eleitoral. Em maio do ano passado, ele usou o plenário da Câmara para acusar, sem provas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de “enviar dinheiro da empregada doméstica para a Venezuela matar pessoas”. Era uma reação a uma decisão do magistrado de suspender o Telegram por 72h caso o aplicativo não apagasse uma mensagem contra o PL das Fake News.

A situação gera desconforto dentro do programa. A diretora, que divide as funções com Rodrigo Cobra, relata que o RenovaBR faz um monitoramento dos posicionamentos de seus ex-alunos e se distancia deles caso identifique que o discurso não condiz mais com os seus valores. “E a gente espera que, com base nos recursos que empregamos no processo seletivo, esse não seja o público atraído para ingressar no programa”, aponta Bruna.

O movimento pretende contar com 159 candidatos disputando prefeituras em todo o Brasil, incluindo sete capitais, além de 1.183 nomes para as câmaras municipais. Do total, 620 são estreantes. O porte de um pequeno partido político gera situações curiosas — como na cidade mineira de Uberaba, onde a atual prefeita, Elisa Araújo (Solidariedade), pode enfrentar outros dois egressos do programa nas urnas. Em São Paulo (SP), o pleito para o Executivo deve contar com a deputada federal Tabata Amaral (PSB) e com a ex-secretária de Desestatização de Paulo Guedes, Marina Helena (Novo).

O RenovaBR entende que o cenário polarizado, em geral, não favorece a ascensão de outsiders, de novas lideranças de fora da política, mas ainda é possível ser competitivo dependendo do contexto local. Além disso, diante de fracassos da “terceira via” nas eleições mais recentes, os candidatos devem avaliar a necessidade de se posicionarem no embate nacional entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e o ex-presidente Jair Bolsonaro, do PL, para aumentar as suas chances de vitória. Veja a entrevista completa abaixo.

Qual o principal desafio hoje na política nacional?

Eu acho que são dois principais desafios. Primeiro é a questão da distribuição dos recursos, que é sempre um desafio em uma democracia. Quando você tem uma concentração pequena de pessoas com acesso aos recursos eleitorais e muitas pessoas sem acesso a esses recursos, você torna a democracia mais fraca, mais fragilizada, porque você acaba fazendo com que muitas pessoas não consigam se viabilizar. E a outra questão são as tecnologias. Temos hoje um fator pós-fake news, que são as deepfakes e a inteligência artificial podendo entrar nas eleições, principalmente nas capitais, onde os candidatos podem fazer uso contra seus adversários.

Como impedir que uma pessoa com perfil radical, sem compromisso com princípios democráticos, seja aceita no programa?

Dentro do processo seletivo existem algumas fases. Elas são todas somatórias, e uma delas trata do ponto de vista. Colocamos questões que podem dar pontos extras ou podem eliminar candidatos dependendo do tipo de posicionamento. Quando identificamos posicionamentos antidemocráticos, podemos retirar essas pessoas ou pelo menos fazer o flag (alerta); ela não deixa o processo seletivo, participa dele como um todo, mas lá na frente vai apontar que essa pessoa, na verdade, não tem os valores que o RenovaBR busca para um líder.

O RenovaBR está sendo mais rigoroso no processo seletivo? De que forma?

Justamente pela inclusão desses chaveamentos. Saber se a pessoa já faz parte de algum partido, fazer uma checagem, ver se ela já teve algum processo e de que tipo, se ela é ficha limpa, isso sempre teve. Mas, foi colocado hoje de uma forma que conseguimos quantificar, dentro do nosso processo seletivo, esse tipo de espectro, de pessoas que tendem a sair ou a pensar fora das regras democráticas do jogo. Então, na verdade, é só uma forma de organizar melhor essas informações. São várias perguntas.

E como isso se equilibra com o princípio de ser uma organização com pluralismo ideológico?

Dos espectros de A a Z, e hoje temos alunos de 29 partidos, conseguimos ter pessoas com visões democráticas. Assim como há pessoas em diversos partidos que também têm visões radicais. Fazemos uma diferenciação, não só em termos de competitividade (do candidato), mas também nessa questão democrática, de visão de mundo e de sociedade mesmo.

Como as redes sociais devem ser exploradas pelos alunos?

O que a gente pede, na verdade, é que as pessoas sejam criativas. Mostramos diversos cases criativos que não são, de forma nenhuma, de violência ou que promovam qualquer tipo de irresponsabilidade ou mesmo notícias falsas. Então, é só o formato e exemplos de como fazer. Temos pessoas eleitas hoje que utilizam muito bem as redes sociais sem destilar notícias falsas ou fazer qualquer inflamação de assuntos que possam ser considerados radicais.

O deputado Luiz Lima (PL-RJ), que ganhou notoriedade com discurso radical nas redes sociais, foi um dos casos que motivaram esse maior rigor na seleção?

Não foi somente o Luiz. Falo isso também como ex-aluna: ele foi da minha turma, não tinha um discurso desse porte e acabou tornando esse discurso mais agressivo. Temos pessoas muito plurais hoje. São mais de 2.000 lideranças formadas, que hoje estão dentro da rede, são influentes e estão em posições de destaque. Fazemos um monitoramento dessas pessoas e, eventualmente, nos distanciamos se os discursos não são condizentes com os valores que o RenovaBR sempre pregou, a favor da democracia. E a gente espera que, com base nos recursos que empregamos no processo seletivo, esse não seja o público atraído para ingressar no programa.

Como o RenovaBR pode atuar em favor das candidaturas em 2024?

Somos uma escola que tenta alavancar as possibilidades de uma candidatura ser proeminente, fortalecida. Fazemos isso (nos cursos) com conteúdo, apresentando tendências de eleição e tecnologias que são importantes principalmente para as novas candidaturas de fora do status quo da política. O que temos (nas eleições) são pessoas que veem oportunidades nos alunos do RenovaBR e nos procuram querendo entrar em contato com eles. A gente faz esse match, entende? Não é uma operação vinculante.

Acredita que o cenário hoje, polarizado entre PT e PL, possibilita a entrada de outsiders, de pessoas desconhecidas e estreantes na política?

Sempre é possível e depende muito da narrativa, do contexto, da localização. A grande questão é se seria possível fazer isso de forma massificada. Entendemos que não, que ainda o contexto de polarização do presidente atual (Luiz Inácio Lula da Silva, do PT) com o ex-presidente (Jair Bolsonaro, do PL) ainda vai pesar muito nas eleições. Essas narrativas vão precisar ser aderidas de alguma forma. A gente sabe que é muito difícil para candidatos que se colocam contrários a ambos os lados da polarização. E isso aconteceu muito nos últimos anos, pessoas que ficaram sem mandatos justamente por não se colocarem de um lado ou de outro. É uma análise caso a caso, que depende do partido, do contexto local e da própria história da pessoa para se colocar como pró, contra ou isento nesta polarização.

A deputada Tabata Amaral (PSB), uma das principais apostas deste ano, pode vencer em São Paulo?

Olha, a Tabata é um nome conhecido nacionalmente, um nome relevante, que tem muitos feitos. Ela é uma pessoa que está construindo uma história muito importante dentro da política e que, nas pesquisas, está se mostrando ainda competitiva em relação aos nomes que são da máquina ou que são da polarização, nomes endossados pelo atual presidente e o ex-presidente da República. Vamos apoiar o máximo que pudermos as nossas lideranças que vão se candidatar, e a Tabata é um desses nomes.

Samuel Lima/Estadão

Beneficiários do Bolsa Família chegam a gastar R$ 100 por mês em apostas esportivas

Pesquisa Datafolha sobre as chamadas bets mostra que 17% dos beneficiários do Bolsa Família —o programa de transferência de renda do governo federal destinado a pessoas de baixa renda— disseram apostar ou já ter feito apostas esportivas online.

Desse percentual, similar ao da população em geral (15%), quase um terço relata gastar ou ter gasto mais de R$ 100 por mês nos sites.

Seis em cada dez apostadores beneficiários do programa de transferência de renda dizem apostar mais de R$ 50 por mês —entre os que não recebem a bolsa, a proporção é de 4 a cada 10.


Em dezembro, o Bolsa Família repassou uma média de R$ 680,61 a mais de 21 milhões de famílias.

A pesquisa foi realizada em 5 de dezembro de 2023. Foram 2.004 entrevistas presenciais em 135 municípios, com pessoas de 16 anos ou mais de todas as regiões. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para baixo para cima, com um nível e confiança de 95%.

A oferta de sites de apostas esportivas é liberada no Brasil desde 2018, após lei aprovada durante o governo Michel Temer (MDB), mas o tema não foi regulamentado pelo Executivo como deveria.

A partir disso, propagandas de bets passaram a dominar a grade da TV aberta, sobretudo em jogos de futebol. As redes sociais também foram inundadas de anúncios de jogos de apostas, viralizados pela atuação de influenciadores famosos.

O governo de Jair Bolsonaro (PL) teve quatro anos para regulamentar o mercado, mas não o fez. Assim, o número de casas de apostas voltadas ao público brasileiro explodiu sem que houvesse regras claras para atuação neste setor, tampouco órgãos fiscalizadores e controladores específicos para a atividade.

O governo Lula (PT) passou a trabalhar na regulamentação desde o ano passado. Já foi aprovada nova lei para definir taxação e funcionamento dessas empresas, que também deverão se credenciar para atuar no Brasil —atualmente, as empresas que oferecem apostas online no país têm sede no exterior.

A regulamentação total deve ser finalizada ainda no primeiro semestre. A legislação trata dos jogos da chamada quota fixa, em que se sabe quanto pode ganhar com a aposta (a partir de resultados de jogo de futebol, por exemplo).

Durante a tramitação do projeto de lei das apostas esportivas na Câmara, os deputados incluíram nessa categoria, além das apostas esportivas, também os jogos online, onde entram cassinos e outros jogos de azar em ambiente virtual. Estima-se que até 80% da movimentação do setor venha desse tipo de atividade.

Críticos temem que isso possa disseminar uma série de sites que oferecem games populares de apostas que trabalham à margem dessa lógica, com promessas de prêmios exorbitantes ou algoritmos fraudulentos.

Atualmente já há investigações sobre casos deste tipo, e deve ficar a cargo da Fazenda determinar quais tipos de jogos podem ou não operar.

Faz nove meses que o motoboy Dalton da Silva Gomes, 28, começou a jogar pelo celular. Entre uma entrega e outra, joga em um site em que aposta enquanto um aviãozinho decola —tem de parar de apostar antes que ele exploda.

“Quanto mais a gente que vai entrando, mas vai ficando envolvido. Você ganha R$ 300 de uma vez, mas aí vai perdendo de dez em dez até zerar tudo”, diz ele, que trabalha em Brasília e até o ano passado era beneficiário do Bolsa Família.

“Comecei a jogar para acalmar outras ansiedades e vícios, mas estou querendo parar. Já perdi R$ 400,00 só este ano”, diz. Dinheiro que faz falta em sua renda mensal, equivalente a menos de dois salários mínimos.

Também vivendo de entregas de moto na capital federal, Wanderson Junior, 24, conta que fez apostas seduzido pela publicidade e o acesso fácil.

“Comecei a jogar depois que vi anúncios no Instagram que diziam ‘mude sua vida’, esses anúncios bem sensacionalistas. Aí cai na lábia”, diz ele, que diz ter parado de jogar há um mês. Antes disso, perdeu R$ 100,00, relata. “Sorte que botei o dinheiro que estava sobrando, e não me atrapalhou muito”.

Os dados do Datafolha mostram que a prevalência de jogadores é disseminada independentemente da ocupação. Enquanto a média de pessoas que já apostaram ou continuam apostando é de 15% da população, entre os desempregados é de 16%, percentual igual ao registrado entre quem se declarou autônomo, como Dalton e Wanderson.

Aos segregar os dados do Datafolha por região, o alcance dos sites de apostas se mantém praticamente estável, com uma variação maior no Nordeste: 18% da população dessa região diz já ter feito apostas ou continuar a realizar.

O médico e pesquisador Daniel Spritzer, do Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas, no Rio Grande do Sul, diz que o alto alcance dos sites de apostas se deve à facilidade de se jogar pelo celular, ao boom de publicidade e, sobretudo, por envolver universos com muitos apaixonados sem necessariamente haver associação direta com jogos de azar.

“Em termos de apostas, dois elementos mudaram radicalmente o cenário: porque eles conseguem pegar um público que gosta de videogame e jogos, que é muito grande, e o público que gosta de esporte, que é também gigantesco”, diz Spritzer, que é pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Médicos e grupos de apoio a viciados em jogos já relatam que o perfil de quem procura ajuda tem sido de pessoas cada vez mais jovens. Quase um terço (30%) dos jovens de 16 a 24 anos afirma que já apostou. A proporção é o dobro da média geral.

Uma lei aprovada após envio de uma medida provisória por parte do governo Lula (PT) traz itens relacionados a jogo responsável, preocupação com publicidade somente a menores e destinação de recursos para o SUS (Sistema Único de Saúde) para medidas de prevenção, controle e mitigação de danos sociais advindos da prática de jogos.

O procurador do Ministério Público Federal Alfredo Falcão diz que as empresas autorizadas a explorar as apostas deverão atender os termos da legislação, como fazer propagandas adequadas sem a promessa de ganhos impossíveis. “É importante que a tutela do consumidor esteja presente na regulamentação das apostas desportivas”, afirma.

O presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável, Andre Gelfi, afirmou ser fundamental que autoridades criem um padrão de conduta para a indústria na regulamentação.

“Não faz sentido que indústria aborde sem qualquer rigor um público vulnerável. O Brasil é um país desigual e cabe ao setor tomar esse tipo de precaução quando oferta produtos que podem gerar consequências indesejadas”.

João Gabriel/Paulo Saldaña/Folhapress

Transição após eleições tem impacto na mortalidade infantil, aponta estudo

A mortalidade infantil aumenta em média 6,7% durante o período de transição de governo municipal quando há mudança de gestão, aponta pesquisa do IEPS (Instituto de Estudos para Políticas de Saúde).

Os efeitos são ainda maiores para a mortalidade por causas preveníveis, ou seja, que poderiam ser evitadas. O aumento médio é de um óbito a cada mil nascidos vivos.

O estudo “Eleições Municipais e Transições de Governo: Disrupção de Serviços e Aumento da Mortalidade Infantil”, realizado pelas pesquisadoras Helena Arruda, do IEPS, e Rudi Rocha, da EAESP/FGV (Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas), usou como base os pleitos de 2008, 2012, 2016 e 2020.

A amostra avaliou 2.900 municípios em 2008, 2.200 em 2012, 2.395 em 2016 e 3.040 em 2020. No recorte do estudo foram analisadas cidades que tiveram um candidato concorrendo à reeleição em um pleito acirrado entre os concorrentes.

O estudo partiu de diferentes fontes de dados. As informações sobre saúde foram coletadas do Siab (Sistema de Informação da Atenção Básica), do Sisab (Sistema de Atenção Básica à Saúde), do Sinasc (Sistema Nacional de Informações sobre Nascidos Vivos) e do SIM (Sistema Nacional de Informações sobre Mortalidade), todos do Ministério da Saúde.

As informações sobre contratações e demissões foram coletadas da Lista Anual de Informações Sociais. A análise se restringiu aos trabalhadores da saúde (médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde).

Para a análise das finanças e gastos públicos foram usados os dados anuais do Finbra (Sistema Financeiro Brasileiro). As informações sociodemográficas foram tiradas do IEPS Data, um portal que fornece dados oficiais de várias fontes.

O estudo comparou dois grupos de municípios: os que tiveram os governos reeleitos e os que tiveram transição de governo. A escolha também levou em conta municípios onde as eleições foram acirradas.

A pesquisadora Helena Arruda diz que a ideia do estudo surgiu a partir do interesse em investigar como a saúde interagia com ciclos eleitorais. “Aproveitamos a situação de que a saúde de atenção primária está vinculada com a atividade municipal para perguntar como a eleição poderia impactar.”

Ela diz ainda que optou em estudar o período gestacional porque é um momento muito crítico do desenvolvimento do bebê.

“Entendemos que para esse momento da vida, se encontrássemos um choque, mesmo que pequeno, no quesito de duração, teria chance disso trazer uma consequência de mais longo prazo na vida dessas crianças”.

O estudo concluiu que há efeitos negativos na prestação de serviços de saúde após as eleições. Mais especificamente, ao longo do período de transição e nos primeiros dois anos do novo governo.

A partir de outubro do ano eleitoral, foi observada uma redução no número de consultas por mês em municípios que passaram por transição de governo em comparação aos que não passaram.

As taxas de mortalidade infantil também aumentaram quando o segundo trimestre de gestação coincidiu com os períodos de mudança de governos.

Segundo Helena Arruda, uma confluência de fatores pode contribuir para esse resultado, mas um parece ser decisivo: os recursos humanos.

“Sabemos que, na atenção primária, as pessoas são parte vital da provisão desse serviço. [Por isso] nós investigamos o que acontece com as principais ocupações que atuam na área”, afirma.

O que a pesquisa encontrou foi um aumento nas demissões de servidores públicos nessas ocupações. As exonerações foram maiores em municípios que passaram por transição de governo, mesmo que a Lei Eleitoral Brasileira aponte que servidores públicos não podem ser demitidos em períodos eleitorais.

Arruda explica que as demissões foram de servidores comissionados, que, diferentemente dos contratos padrões de funcionalismo público, não possuem estabilidade. “Há uma proporção considerável de trabalhadores da saúde municipal que têm esse tipo de contrato”, diz.

Segundo Michelle Fernandez, professora e pesquisadora do Instituto de Ciência Política da UnB, na maioria das prefeituras do Brasil não há uma estrutura burocrática de carreira consolidada, mas funcionários que são contratados ou indicados. “[Por isso] pode existir essa variação na mudança de governo”, afirma.

Ao investigar o que justificaria as exonerações, o estudo encontrou uma explicação relacionada a uma outra legislação brasileira: a de responsabilidade fiscal.

A lei diz que municípios não podem gastar mais de 60% de seus recursos com pessoal. Ainda que a regra não se restrinja a profissionais da saúde, o estudo concluiu que municípios próximos do limite de gasto com pessoal tiveram, em média, mais demissões após as eleições quando houve mudança de governo.

A diminuição do quadro de funcionários é entendida como um dos fatores que justificam a redução nas consultas de pré-natal, que são importantes para identificar uma série de doenças preveníveis.

Se a gestante também perde consultas no momento crítico da gestação, a criança pode desenvolver doenças que vão, por exemplo, provocar maiores chances de ela nascer com baixo peso.

Isabela Brandão, professora do Núcleo de Saúde e Políticas Públicas do Insper, explica que o segundo trimestre da gestação é um período em que algumas exposições que o feto tem no útero podem gerar efeitos na saúde da criança de curto e médio prazo.

“O estudo pega o primeiro efeito, que é o de redução de peso ao nascer, mas há pesquisadores da literatura médica, e mesmo econômica, que associam, por exemplo, o efeito de um peso mais baixo a piores resultados de saúde na vida adulta”, afirma Brandão.

A professora diz ainda que o sistema público de saúde é sobrecarregado e que, no país, crianças e grávidas morrem por falta de acesso ao pré-natal.

Por isso, ela defende como política pública básica oferecer consultas de pré-natal em quantidade e qualidade adequada. “Às vezes observamos no sistema público que a consulta pré-natal até existe, mas não necessariamente com todos os recursos adequados para se fazer a triagem”, completa.

Para Helena Arruda, uma das soluções propostas pelo estudo é os governos garantirem que não haverá demissões de profissionais de saúde durante o período de transição de governo.

“A mortalidade infantil acontece até o início do segundo ano do outro mandato. Uma vez perdidas as consultas pré-natal, o efeito é de certa forma irreparável. Por isso, é tão importante conversar e pensar em formas para que isso não continue acontecendo”.

Priscila Camazano/Folhapress

Chuva deixa dois desaparecidos, alaga ruas, fecha metrô e inunda hospital no Rio

Arvore cai no bairro do Flamengo, na zona sul do Rio de Janeiro

Fortes chuvas registradas neste final de semana na cidade do Rio de Janeiro e na região metropolitana causaram pelo menos sete mortes, segundo informações divulgadas no início da tarde deste domingo (14) pelo Corpo de Bombeiros.

Os temporais deixaram um rastro de alagamentos, principalmente na zona norte da capital e em municípios próximos. Os bombeiros disseram que atenderam a mais de 200 ocorrências relacionadas às chuvas no estado. Os casos incluem salvamentos de pessoas, inundações, cortes de árvores, desabamentos e deslizamentos.

Na capital, os alagamentos chegaram a interditar o trânsito em um trecho da avenida Brasil, uma das principais vias da cidade, neste domingo. O fluxo de veículos foi liberado no final da manhã deste domingo. A chuva também fechou estações de trem e metrô.

Nas redes sociais, o prefeito Eduardo Paes (PSD) disse que o Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, em Acari, na zona norte, ficou sem energia elétrica. A água inundou o subsolo da unidade de saúde.

“O que a gente pede é que as pessoas, especialmente dessa área da cidade [zona norte], evitem se deslocar. A avenida Brasil [está] interditada, ou seja, não força a mão, não força ficar passando em área alagada. Você coloca em risco a sua vida, atrapalha os agentes públicos. A previsão é de menos chuva ou chuva mais fraca hoje”, afirmou Paes em vídeo divulgado às 7h40.

Outro impacto foi a suspensão de concursos públicos. A Prefeitura do Rio anunciou que as provas dos processos seletivos Acadêmico Bolsista e Projeto Acolher, que aconteceriam neste domingo, foram adiadas devido às chuvas. Novas datas devem ser divulgadas em breve.

A capital entrou no estágio 4 do monitoramento realizado pelo COR (Centro de Operações Rio). Isso significa que a recomendação é para que a população evite deslocamentos e fique em locais seguros.

A concessionária SuperVia disse que a estação de trens Osvaldo Cruz, na capital, foi fechada para embarque e desembarque em razão dos alagamentos.

A operação do metrô também sofreu impacto. As estações Pavuna, Engenheiro Rubens Paiva, Acari Fazenda Botafogo e Coelho Neto foram fechadas temporariamente.

“As equipes de manutenção estão mobilizadas para atuar, após o escoamento da água, e restabelecer o mais breve possível o sistema metroviário”, afirmou o MetrôRio.

Em razão dos alagamentos, o prefeito Eduardo Paes pediu o cancelamento do ensaio técnico de carnaval previsto para este domingo na Sapucaí. Ele ainda afirmou que recebeu uma ligação do ministro Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional), que teria se colocando à disposição da cidade.

De férias, o governador Cláudio Castro (PL) afirmou no sábado que estava coordenando secretarias e que estava em contato com prefeituras para “lidar com as intensas chuvas”.

Leonardo Vieceli/Folhapress

Brasil soltou 57 mil presos na saidinha de Natal, e menos de 5% não voltaram para a cadeia

Menos de 5% dos detentos que tiveram o direito à saidinha no Natal no fim de 2023 não retornaram aos presídios no Brasil.

Levantamento realizado pelo jornal Folha de S.Paulo a partir de informações das secretarias estaduais responsáveis pelo sistema penitenciário mostra que 56.924 presos tiveram o benefício concedido pela Justiça em 18 unidades da federação. Destes, 2.741 não regressaram (4,8% do total).

Oito estados (Acre, Alagoas, Amazonas, Goiás, Mato Grasso, Paraíba, Rio Grande do Nortes e Tocantins) disseram que não concederam o direito. A Bahia não respondeu. O Pará informou que a saidinha ainda está em vigor em algumas comarcas do interior do Estado.

De acordo com especialistas, cabe às Varas de Execução Penal de cada estado avaliar, observados caso a caso, se concede ou não o benefício. Alguns estados não concederam a saidinha de Natal porque dão o benefício em outra data. Outros argumentaram que todos os presos do semiaberto cumprem a pena com tornozeleira, fora do presídio.

O Estado onde mais detentos deixaram de retornar ao sistema foi o Rio de Janeiro (14%), unidade da federação que historicamente enfrenta problemas na segurança pública. O Pará (12%) e o Ceará (9%) completam a lista das três localidades com mais destaque nesse quesito.

Em números absolutos, São Paulo liderou a quantidade de presidiários beneficiados com a saidinha. Foram 34.547 pessoas, das quais 1.566 (5%) não retornaram.

Os dados mostram ainda que pelo menos 151 pessoas (5,5%) das que não regressaram ao sistema (2.741) foram recapturadas.

Consultadas pela reportagem sobre os custos envolvidos com a recaptura, as secretarias de segurança pública e responsáveis pelo sistema prisional afirmaram não dispor de informações.

O benefício da saidinha temporária é garantido há quase quatro décadas pela Lei de Execuções Penais. É concedido pela Justiça para presos do sistema semiaberto que já tenham cumprido ao menos um sexto da pena no caso de réu primário —e, em caso de reincidência, um quarto da pena—, além de outros requisitos. Preso que comete crime hediondo resultante em morte não possui esse direito.

O tema se tornou foco de discussões e mobilizou setores da classe política após a morte do sargento da Polícia Militar Roger Dias da Cunha, 29, baleado na cabeça e na perna durante uma perseguição em Belo Horizonte a um homem que estava em saída temporária.

Outro caso que gerou repercussão foi a fuga de dois dos condenados por chefiar a maior facção de tráfico de drogas do Rio de Janeiro, Saulo Cristiano Oliveira Dias, 42, conhecido como SL, e Paulo Sérgio Gomes da Silva, 47, o Bin Laden, após o direito a saidinha de Natal.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a discussão do projeto que acaba com a saída temporária. Atualmente, o texto está na Comissão de Segurança Pública do Senado, sob relatoria de Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

Em seu relatório, Flávio defendeu a proibição da saidinha, que acontece em datas comemorativas no país, como Natal, Dia das Mães, Dia dos Pais. “Saidinha incentiva a fuga nas cadeias e não ajuda na reintegração dos presos”, disse o parlamentar, por meio de sua assessoria.

O presidente da comissão, senador Sérgio Petecão (PSD-AC), busca um acordo para alterar alguns pontos do texto. No entanto, a proibição da saída temporária deve permanecer.

“Ainda estamos discutindo, mas a ideia é preservar a saída para trabalho ou estudo dos presos do semiaberto, já que são atividades que promovem a ressocialização, e eliminar as saidinhas em feriados, que têm gerado fugas de parte dos presos e novos crimes”, disse o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), que tem ajudado na costura política em torno da proposta.

De acordo com dados da Sennapen (Secretaria Nacional de Políticas Penais), havia em junho de 2023 nas cadeias cerca de 118 mil presos no regime semiaberto.

O Secretário Nacional de Políticas Penais, Rafael Velasco, disse lamentar a tragédia envolvendo a morte do sargento Dias, considerando-a evitável e, ao mesmo tempo, uma exceção.

O representante do Ministério da Justiça destacou a importância de manter o benefício da saída temporária, enfatizando a necessidade de aprimorar a legislação. Na sua visão, o percentual de menos de 5% das pessoas que não retornam é baixo.

Para o secretário, a discussão sobre o tema deve focar o refinamento da lei que trata do direito e acrescenta que, atualmente, a concessão do benefício pelas varas de Execuções Penais requer consulta prévia ao Ministério Público e à administração do sistema prisional. Essa etapa não assegura automaticamente que o juiz negará a saída, mesmo diante de pareceres desfavoráveis.

“Essa abordagem é genérica na legislação, carecendo de detalhamento mais preciso. Uma pessoa ligada a facção criminosa, por exemplo, não deveria ter direito a esse benefício”, disse.

“E eu vou além, a partir do momento que a recomendação do Ministério Público ou da secretaria de Administração Penitenciária, ou mesmo da Segurança Pública, seja de que a pessoa não deva sair [mesmo estando enquadrada nos requisitos previstos em lei para o benefício] e a Justiça conceda o benefício, isso deveria passar por um órgão colegiado”.

Velasco afirmou que a saída temporária é concedida em outros países, como Inglaterra, Espanha, Itália, Portugal e França, com requisitos objetivos e diferentes entre si.

Estados afirmam que cabe à Justiça a concessão do benefício e que usam o monitoramento eletrônico nos casos do semiaberto. “Os presos do semiaberto estão em monitoração eletrônica desde o início da pandemia”, destacou Goiás, em nota.

O juiz Douglas de Melo Martins, presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, apoia a manutenção da saidinha, destacando que tal medida viabiliza o processo gradual de ressocialização do indivíduo. Em sua perspectiva, a recusa em se conceder esse benefício pode ser considerada inconstitucional.

Com base em sua experiência como juiz da Vara de Execuções Penais, o magistrado identificou diversas razões que levam uma pessoa a não voltar ao sistema prisional, tais como o envolvimento em atividades vinculadas a facções criminosas e a dependência química. Ele lembra que, em caso de recaptura, o indivíduo perde o direito ao semiaberto e retorna ao regime fechado.

O magistrado diz ainda que, em sua visão, a discussão sobre o tema frequentemente cai no que ele classifica como “populismo penal”, ressurgindo especialmente durante os períodos eleitorais.

“A criminalidade no Brasil é grave e mobiliza as pessoas. Há um sentimento de que a criação de novos tipos penais, o aumento das penas e a restrição de direitos dos presos possam reduzir a criminalidade, o que acaba atraindo votos para aqueles que promovem tais propostas. Estas, porém, já foram implementadas anteriormente e não tiveram sucesso. Esse fenômeno de populismo penal se intensifica durante os períodos eleitorais.”

Sandro Caron, presidente do Consesp (Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública), tem outra avaliação. Ele afirma que a legislação precisa ser revista com urgência para acabar com o benefício.

“O Consesp defende o fim da saidinha, bem como entende que precisamos revisar urgentemente alguns pontos de nossa legislação penal e processual penal, principalmente para a acabar com liberdades provisórias que infelizmente são concedidas quase que diariamente a líderes do crime organizado, a homicidas, a assaltantes”, disse Caron, também é secretário de segurança Pública do Rio Grande do Sul.

Raquel Lopes/Folhapress

BYD negocia compra de mineradora com maior reserva de lítio no Brasil

Fábrica da BYD em Campinas (SP)
A fabricante chinesa de carros elétricos BYD está em negociação para comprar uma produtora de lítio no Brasil, na corrida global para garantir matérias-primas para a revolução dos veículos elétricos.

O presidente da BYD no Brasil, Alexandre Baldy, disse que discutiu com a Sigma Lithium, avaliada em US$ 2,9 bilhões (R$ 14,34 bilhões), sobre um possível acordo de fornecimento, joint venture ou aquisição.

A Sigma começou a enviar o metal —um elemento-chave para as baterias de veículos elétricos— de sua mina de rocha dura e planta de processamento no estado de Minas Gerais no ano passado. Em fevereiro, foi noticiado que a empresa estaria na mira de Elon Musk. Sete meses depois, a Sigma divulgou que avaliava propostas de venda, mas não anunciou os interessados.

A BYD é apoiada pela Berkshire Hathaway de Warren Buffett e ultrapassou, no começo deste ano, a Tesla como a maior fabricante de veículos elétricos do mundo.

A empresa está construindo sua fábrica de carros elétricos no Brasil, a primeira fora da Ásia, como parte de um investimento de R$ 3 bilhões.

Enquanto a BYD busca ativos de lítio no país com o objetivo de montar uma cadeia de suprimentos integrada, Baldy disse que há um diálogo “ativo” com a Sigma, que está listada nas Bolsas de Toronto e da Nasdaq, em Nova York.

“Estamos discutindo diferentes aspectos sobre fornecimento, uma joint venture, uma aquisição… nada é concreto”, afirmou o executivo.

Baldy disse que a BYD se encontrou com a CEO da Sigma, Ana Cabral Gardner, em São Paulo no mês passado, mas se recusou a dar mais detalhes sobre as conversas, citando um acordo de confidencialidade. A Sigma se recusou a comentar.

Os planos da BYD no Brasil ocorrem enquanto empresas chinesas de veículos elétricos e energia renovável buscam expandir rapidamente no exterior.

A fabricante sediada em Shenzhen também planeja construir uma fábrica de veículos elétricos na Hungria e tem negociado um local no México.

No entanto, as ambições da China têm gerado preocupações sobre os sonhos de Pequim de superioridade tecnológica e domínio sobre recursos globais essenciais para as indústrias de tecnologia limpa.

A administração de Joe Biden, nos Estados Unidos, tomou medidas para reduzir a fabricação chinesa em solo americano, e a Europa está investigando a indústria de veículos elétricos da China por suposta concorrência desleal.

Em 2022, o governo de Justin Trudeau, no Canadá, ordenou que três grupos chineses se desfizessem de empresas de mineração de lítio em estágio inicial listadas em Toronto, algumas das quais tinham ativos fora do Canadá.

O sucesso da BYD na China em vender veículos elétricos de alta tecnologia a baixo custo se deve, em parte, ao controle de grande parte de sua cadeia de suprimentos, incluindo minas, baterias e chips de computador.

Vários grandes fabricantes de automóveis fizeram acordos diretos com mineradoras para garantir o fornecimento de lítio, que será vital para a descarbonização das frotas de veículos do mundo.

Durante seu primeiro ano de produção, a Sigma registrou uma perda líquida de US$ 19 milhões (R$ 94 milhões) nos primeiros nove meses de 2023 —quase metade em relação ao mesmo período do ano anterior.

Suas ações caíram cerca de um terço nos últimos seis meses, em meio a uma queda acentuada nos preços do lítio que tem gerado preocupações com o excesso de oferta.

O conselho da Sigma está conduzindo uma revisão estratégica que pode resultar na venda do negócio ou na listagem de sua unidade brasileira na Nasdaq e na Bolsa de Valores de Cingapura.

Embora a entidade controladora esteja registrada em Vancouver, no Canadá, os ativos da Sigma estão localizados no Brasil. O maior acionista é a A10 Investimentos, cujos co-fundadores são a CEO da Sigma e seu outro co-presidente.

A revista Exame informou no fim do ano passado que a Volkswagen e a fabricante chinesa de baterias CATL estariam interessadas na aquisição da Sigma.

A VW disse: “Quando se trata de matérias-primas, estamos explorando o mercado e conversando com muitos parceiros em diferentes regiões do mundo”, acrescentando que não comentaria “rumores de mercado”.

Os principais países produtores de lítio em 2022 foram Austrália, Chile, China e Argentina, seguidos pelo Brasil, de acordo com a Statista.

A Sigma extrai minério de espodumênio e o processa em concentrado de lítio de grau de bateria. A empresa planeja triplicar sua capacidade de produção anual de 270 mil toneladas. A empresa controladora da BYD e a CATL não responderam aos pedidos de comentário.

Folhapress

Jitaúna: Briga entre ciganos, tiros e perseguição assustam moradores

Foto: Reprodução/Jitaúna Em Dia

Uma discussão entre três homens de origem cigana quase termina em morte na tarde deste sábado (13), por volta das 16h20 na praça da Câmara de vereadores em Jitaúna. Segundo informações divulgadas pelo blog Jitaúna em Dia, um dos ciganos foi até o veículo e se apossou de um revólver calibre .38 indo em direção do seu desafeto que adentrou em outro veículo começando uma perseguição na rua Jequié.

De acordo com relatos de populares, foram ouvidos cinco disparos. Após o cessar fogo os veículos tomaram rumos ignorados. A Guarda Municipal e a Polícia Militar fizeram ronda mas, não obtiveram êxito na captura dos ciganos envolvidos. Os motivos e circunstancias não foram informados. Os nomes dos envolvidos também não foram informados. A Policia Civil deverá investigar o caso, informa o Blog Jitaúna em Dia.

Suspeitos batem carro durante perseguição policial e morrem após troca de tiros com a PM na Bahia

Motorista do carro roubado bateu em poste durante perseguição policial em Eunápolis — Foto: 8º Batalhão de Polícia Militar
Dois homens morreram em confronto com a Polícia Militar na noite de sexta-feira (12), em Eunápolis, cidade do extremo sul da Bahia. Antes da troca de tiros, os suspeitos foram perseguidos e bateram o carro após denúncia de roubo do veículo, diz a Polícia Militar.

Segundo a corporação, a denúncia indicava que os homens estariam se deslocando para Porto Seguro, na mesma região. Assim, quando os agentes avistaram o veículo no distrito de Pindorama, foi dada a ordem de parada.

Como os suspeitos não atenderam a determinação, a PM deu início à perseguição.

Em nota à imprensa, o 8º Batalhão informa que o condutor do veículo roubado perdeu o controle da direção, colidindo num poste já nas proximidades do distrito de Agrovila. A frente do carro ficou destruída com a colisão.

Entenda a sequência de fatos pós-acidente que culminou nas mortes

Os suspeitos teriam desembarcado e começado a atirar contra os policiais, que revidaram.

Em seguida, os dois teriam se infiltrado em uma área de mata — a força de segurança diz que os militares realizaram uma varredura no perímetro, onde encontraram o primeiro suspeito baleado.

Depois disso, os agentes foram acionados para averiguar a presença de um homem armado que tentava invadir uma residência.

No local, os agentes deram ordem de prisão ao homem, mas o suspeito não teria obedecido, iniciando novos disparos contra os membros da guarnição. Esse outro embate terminou com o segundo suspeito atingido.
A PM disse que encaminhou os dois homens para uma unidade de saúde, mas eles não resistiram aos ferimentos.

Em meio a à ação, os agentes apreenderam um revólver calibre 32 e objetos como carteiras de identidade, CPF, aparelho celular e cartões bancários.

Semana de confrontos

Em menos de uma semana, nove pessoas morreram após confrontos policiais na Bahia. Os casos foram registrados na capital e interior.

O primeiro registro foi em Juazeiro, no norte do estado, na madrugada de terça-feira (9). Na ocasião, três detentos fugitivos do presídio de Salvador vieram a óbito.

Os homens foram identificados como Flávio Bastos Carneiro, conhecido como "Fal/Batata", Íkaro da Costa Santos, chamado de "Cabeça", e Jefferson Silva de Carvalho.

Já na noite de terça, um homem morreu em confronto na cidade de Maragogipe, no recôncavo baiano. O suspeito cuja identidade não foi divulgada foi avistado com um grupo que entrou em confronto com a PM. Eles eram procurados após exibirem vídeos portando armas e praticando um homicídio.

No mesmo dia, um grupo de homens trocou tiros com policiais no bairro Expansão do Feira IX, em Feira de Santana. O suspeito baleado chegou a ser socorrido para o Hospital Geral Clériston Andrade (HGCA), mas não resistiu.

Na madrugada de quarta, a ocorrência foi em Salvador, na localidade da Baixa Fria, no bairro da Boca do Rio.

De acordo com a Polícia Civil, os PMs foram recebidos a tiros quando faziam rondas no local. Um dos suspeitos foi atingido e chegou a ser socorrido para um hospital, porém, não resistiu.

O último registro antes do confronto em Eunápolis, na noite de sexta, foi em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador (RMS). Ainda na madrugada de quarta, militares trocaram tiros com suspeitos na área conhecida domo "Boca do Vulcão.

Um homem foi ferido e levado para um hospital, contudo, morreu na unidade.

Violência na Bahia

Em 2023, o estado registrou recorde de apreensões de fuzis. Mais de 50 armamentos foram apreendidos entre os meses de janeiro e outubro, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA).

Para a pasta, o maior número de apreensões se deve à ampliação do trabalho de inteligência, com as implantações de novos núcleos, e a integração das Polícias Militar, Civil e Federal, consolidada com a instalação da Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco).

Veja mais notícias do estado no g1 Bahia.

Guerra Israel-Hamas completa cem dias sob risco ainda maior de escalada

Soldado israelense durante operação contra o Hamas na Faixa de Gaza

Desde que atacou brutalmente Israel em 7 de outubro do ano passado, o grupo terrorista Hamas contava com a ignição de um conflito de maiores proporções no Oriente Médio a partir da previsível retaliação dura de Tel Aviv contra a Faixa de Gaza, que comandava desde 2007.

Cem dias depois da mais recente guerra entre o Estado judeu e um ente árabe, o objetivo não se confirmou da forma prevista pelo Hamas, mas nem por isso o risco de uma escalada da guerra no âmbito regional está descartado. Ao contrário.

O foco, contudo, não é o Irã, como temiam analistas. O Estado persa, por toda a retórica inflamada e o apoio a prepostos regionais como o Hamas, não parece disposto a ir a vias de fato e enfrentar os Estados Unidos, que viriam em socorro a Israel em caso de um ataque e mostraram os dentes militares para provar isso.

A coisa muda de figura em duas outras frentes. A mais importante, no norte de Israel, onde forças de Binyamin Netanyahu têm enfrentado, diariamente desde o início da guerra em Gaza, o Hezbollah, grupo fundamentalista apoiado por Teerã e aliado dos terroristas palestinos.

A briga é antiga e remonta à invasão israelense do Líbano em 1982, que na prática deu origem à agremiação liderada pelo xeque Hassan Nasrallah. O empate técnico no mais recente embate direto entre os rivais, em 2006, deixou aberta a possibilidade de uma revanche.

Com a nova crise, Israel tem feito ultimatos ao Hezbollah para que deixe a faixa neutra determinada pela ONU no sul do Líbano, retraindo-se para além do rio Litani. Tel Aviv fez esse movimento, respeitando a ainda contestada Linha Azul.

Nasrallah fala grosso, mas na prática tem evitado uma guerra aberta. “O Hezbollah precisa da causa palestina para justificar a recusa em desmantelar sua ala militar”, afirma Hilal Khashan, professor de ciência política da Universidade Americana de Beirute. No Líbano, o grupo também é um importante partido político.

O grupo se apoia no formidável arsenal de mísseis e foguetes, que Khashan estima em até 200 mil, para manter uma posição pública de força. “Mas o arsenal intimida mais em teoria do que na prática”, diz o professor, lembrando que a maioria das armas tem pouca precisão, e as que têm precisam ser retiradas de depósitos secretos e posicionadas em lançadores.

“Isso as expõem a ataques israelenses, já que o Hezbollah não tem uma defesa antiaérea decente”, afirmou Khashan. Isso, somado ao temor de os Estados Unidos fazerem valer suas ameaças de atacar quem interferir na guerra em Gaza, tem mantido os libaneses na defensiva.

O tempo, avalia o acadêmico, “está chegando ao fim”. Ele considera que, com a redução anunciada nas operações ao norte de Gaza por Israel e ações como assassinato de um líder do Hamas em Beirute, o cenário está armado para um tira-teima.

Com uma capacidade de engajamento de Tel Aviv aprimorada ao norte, algo que não era possível com a ação intensa contra o Hamas nos primeiros meses da guerra, é possível que Netanyahu já não tema a abertura de uma nova frente de combate total.

Por outro lado, é incerto o apoio da opinião pública israelense a uma guerra declarada pelo país. Apesar de Netanyahu ter suporte apenas marginal hoje, ele lidera um combate que lhe foi imposto pelo mega-ataque de 7 de outubro, de resto um vexame político e militar debitado de sua conta. Iniciar uma nova ação é outra história.

Já numa terceira frente da guerra, a escalada já é uma realidade. Antes considerado um teatro secundário, o mar Vermelho virou o centro de preocupações mundiais com o apoio dado ao Hamas pelos rebeldes pró-Irã houthis do Iêmen. Via de 15% do comércio marítimo mundial, a região viu o trânsito cair até 40% devido aos ataques a embarcações acusadas de ligação com Israel.

Na sexta (12), os EUA e o Reino Unido deixaram de agir reativamente com sua força-tarefa naval e lançaram ataques contra posições do grupo no país árabe, do qual ele domina uma boa porção no oeste, junto às costas do mar Vermelho. Neste sábado (13), Washington repetiu o feito, ainda que em menor escala.

Os houthis ensaiaram uma reação pontual e prometeram vingança, deixando em aberto a possibilidade de uma escalada ainda maior na violência. O presidente Joe Biden jura que não quer se envolver mais, mas que os bombardeios foram essenciais para deter mais ataques rebeldes.

Parece uma tática de enxugamento de gelo. O arsenal de mísseis houthis, com material antigo chinês e mais moderno do Irã, parece bastante disponível para novas ações. Aqui, menos do que algum risco existencial a Israel, a questão é a aposta dos rebeldes em trazer os EUA para a briga.

Isso pode elevar a animosidade, já grande em países árabes e de maioria muçulmana, como a Turquia, contra Washington. Isso já seria uma vitória estratégica do Irã —sem que o país dos aiatolás tenha de disparar um tiro, mesmo demonstrando limites estratégicos na crise.

Não lateral, há a questão da Cisjordânia, o território parcialmente governado pela Autoridade Nacional Palestina, rival do Hamas. Ali, as mortes e prisões de moradores têm sido diárias, na busca por elementos radicais, e a tensão é a maior em anos.

Concorre para o atoleiro a indefinição pública de Israel acerca de seus objetivos e, na hipótese de desmantelar o Hamas em Gaza, sobre o que ocorrerá com o território obliterado e seus 2,3 milhões de habitantes.

O ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, falou superficialmente sobre devolver o controle político da Faixa aos palestinos, excluindo o Hamas, mas sem deixar claro a quais palestinos ele se referia.

Biden enviou quatro vezes seu secretário de Estado, Antony Blinken, para sinalizar que está preocupado com isso. Até aqui, não recebeu mais do que evasivas israelenses em troca, e esse prolongamento aumenta a fatura que os conflitos subjacentes à destruição de Gaza cobrarão dos EUA.

Gallant havia previsto no início do conflito uma guerra de três meses. Já se passaram dez dias do prazo, e a solução é tão elusiva quanto antes.

Igor Gielow/Folhapress

Vice-prefeito de Itapé é preso por tráfico de drogas

O  vice-prefeito de Itapé, André Jatobá
Alvo de mandados de busca e apreensão no âmbito da Lei Maria da Penha, o vice-prefeito de Itapé, cidade no sul da Bahia, André Jatobá, acabou preso por porte ilegal de armas e tráfico de drogas, na última sexta-feira (12).

De acordo com a Polícia Civil, o objetivo da “Operação Revenge” era apenas fazer buscas em dois endereços dele, no município de Itabuna. A instituição afirma que Jatobá é investigado “por diversos crimes contra a sua ex-companheira”.

Mas, durante o cumprimento das medidas judiciais, os agentes encontraram “um arsenal composto por diversas armas de fogo, munições e explosivos, além de entorpecentes”. Os mandados foram cumpridos pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam/Jequié), com apoio da 9ª Coordenadoria Regional de Polícia do Interior (Coorpin/Jequié) e da 6ª Coorpin/Itabuna.

Quanto às armas, foram apreendidas:
  • três pistolas
  • duas réplicas de armas de fogo
  • oito carregadores
  • 769 munições
  • 20 cartuchos deflagrados
  • três bananas de dinamites
  • um explosivo artesanal
  • carregadores
  • um porta-carregador
  • dois coldres
As drogas apreendidas foram:
  • 161 comprimidos de ecstasy
  • 30 porções de MDMA
  • uma pedra e um saco com uma porção da mesma droga sintética
  • dois vasilhames com resíduo de ecstasy
  • uma pedra de haxixe
  • um papelote de cocaína
  • três cigarros e cinco vasilhames com maconha
  • uma porção de skunk
  • três recipientes com anabolizantes
  • 14 frascos de lança-perfume
Além disso, os agentes recolheram celulares, notebooks, tablet, DVRs, pendrives, HD externo, CD e cartões de memória. Todo o material foi encaminhado para perícia no Departamento de Polícia Técnica (DPT).

André Jatobá passou por exames de lesões corporais e seguirá preso à disposição da Justiça.

Jatobá foi eleito em 2020, pelo Podemos, na chapa encabeçada pelo prefeito Naeliton. De acordo com o DivulgaCand, portal oficial de informações sobre candidaturas, essa foi a primeira disputa eleitoral do político.

G1/Bahia

Seca histórica no Amazonas custou R$ 1 bi a mais para indústria e reduziu importações

Estiagem de outubro e novembro de 2023 foi a maior da história
A seca histórica no Amazonas, no fim do ano passado, impactou a indústria do Estado e implicou R$ 1,4 bilhão de custos extras às empresas, que diminuíram a produção diante da falta de insumos e da dificuldade para escoar os produtos finais.

A estiagem de outubro e novembro de 2023 foi a maior da história. O rio Negro chegou a atingir 12,7 metros —o menor nível em mais de um século. Segundo dados do ComexStat, plataforma do governo brasileiro sobre exportação e importação, houve uma queda de 83% na importação pelo modal aquaviário do Amazonas em razão da seca.

Essa queda da navegação está diretamente ligada aos custos extras das empresas. A maioria dos produtos que entram e saem de Manaus é transportada por navios. Porém, com o baixo nível dos rios, a indústria teve de optar por modos alternativos de traslados, como aviões, cujos custos são mais altos em comparação ao aquaviário, e o ro-ro caboclo, em que caminhões são transportados por barcaças nos trechos em que não há estrada.

Este último, apesar de ser mais barato do que transportar as cargas através do avião, não consegue atender à mesma demanda da cabotagem e dos navios de longo curso.

“A gente estimou em R$ 1,4 bilhão de cursos excessivos que as indústrias tiveram para enfrentar essa seca”, afirma Augusto César Rocha, coordenador da comissão de logística do Cieam (Centro de Indústria do Estado do Amazonas).

“São custos assustadoramente altos colocados já sobre o custo Brasil e sobre o que chamamos de custo amazônico”, completa o especialista, fazendo menção à despesa adicional que as empresas têm para produzir no país, na comparação com a média dos custos nos membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Segundo o ComexStat, só em outubro, primeiro mês da seca, as importações gerais no Amazonas tiveram uma queda de 49,79%, indo de US$ 1,097 bilhão (R$ 5,32 bilhões) para US$ 604 milhões (R$ 2,9 bilhões). Por via aquaviária, essa redução foi ainda maior, de 73,82%. Em contrapartida, as importações por via aérea, que são mais caras, subiram 9%.

O mês puxou o desempenho da indústria no Amazonas para baixo, representando uma queda de 5,7% em comparação ao mesmo período de 2022, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgados nesta sexta-feira (12).

Já em novembro, a produção industrial do Amazonas teve uma queda de 4,2% em relação a outubro, conforme o IBGE. Na comparação anual, esse percentual foi ainda maior, de 10,3%. Ainda não há dados disponíveis do ComexStat sobre as importações no Estado.

De acordo com o coordenador do Cieam, apesar do impacto na indústria, pouco foi sentido no bolso dos consumidores.

“O preço do produto é o mercado que define, é a oferta e demanda. O consumidor pouco percebe o problema. Mas a matriz do que seria a venda da empresa é toda modificada. Por exemplo, em vez de vender uma motocicleta com o maior valor agregado, ela vai vender com o menor valor agregado”, diz Rocha.

O IBGE, no entanto, apontou a seca no Amazonas como um dos fatores que elevaram a inflação de ar-condicionados no final do ano passado. No acumulado de 2023 até novembro, o preço do eletrodoméstico subiu 13,97%, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Apesar de o fim da seca e o início das chuvas já terem aumentado o nível dos rios, o Amazonas ainda não chegou à normalidade. O mais recente boletim de estiagem do Estado, de quarta-feira (10), indicou que os 62 municípios amazonenses continuam em estado de emergência.

Diante do cenário, Rocha afirma que o poder público, principalmente o governo federal, precisa fazer investimentos para evitar que o cenário do final de 2023 se repita neste ano.

“As empresas se planejam todos os anos para a seca e se preparam para enfrentar um cenário extremo. O problema é que a seca foi bem pior do que era esperado. A indústria se planejou para parar por 30 dias, mas parou 60”, diz o especialista.

“A gente não pode ficar dependendo de um santo para que faça chover ou não, é necessário investimento”, afirma, acrescentando que é preciso haver alternativas de rota para os produtos que chegam e saem do Amazonas.

Uma das sugestões é a recuperação da BR-319, que liga Manaus e Porto Velho, em Rondônia. Não há pavimentação em grande parte da rodovia, o que impede o translado de caminhões de carga na região.

“Manaus é como se fosse uma ilha. A cidade está no meio do Amazonas e não é ligada por nenhuma rodovia com o restante sul do Brasil, isto é, o Sul, o Sudeste e o Centro-Oeste. A BR-319 é uma alternativa, mas, para isso, ela deve ser recuperada e monitorada, com centros de controle para a proteção da floresta, para que não se torne um vetor de destruição da Amazônia”, afirma.

Camila Zarur/Folhapress

Garimpo retoma força e desnutrição se incorpora à rotina de yanomamis

Ministros voltam à Terra Indígena Yanomami após reunião com Lula

Vista facilmente por quem cruza os céus do território yanomami, em Roraima, uma pista de pouso e decolagem suspeita de servir ao garimpo ilegal abriga nove aviões de pequeno porte, dispostos lado a lado, bem perto da exploração ilegal de ouro na maior terra indígena do Brasil. A região é de fronteira com a Venezuela, e as coordenadas apontam para a presença da pista 5 km adentro no país vizinho.

No “garimpo do Rangel”, em território brasileiro, embarcações com garimpeiros trafegam sem incômodo pelas águas sujas e barrentas do rio Couto Magalhães. É fim da tarde de quarta-feira (10), e os barcos também circulam tranquilamente pelo rio Mucajaí, que está imundo.

Garimpos e cicatrizes de garimpos parecem engolir malocas, pequenas aldeias e uma pista de pouso que já serviu à saúde indígena, nas regiões de Homoxi e Xitei. Os rios, como o Uraricoera, voltaram a adquirir a aparência pastosa que é característica da exploração predatória e ilegal de ouro.

Tudo é visto de cima, da janela de um dos três aviões de pequeno porte usados pela comitiva de ministros do governo Lula (PT) em visita à região de Auaris, a mais distante da terra yanomami, na fronteira com a Venezuela.

O garimpo retomou a força em pontos estratégicos do território. A 20 minutos de voo do PEF (Pelotão Especial de Fronteira) do Exército em Auaris, onde pousaram os aviões da comitiva de ministros, dois pontos estratégicos para a logística do ouro ilegal estão em pleno funcionamento.

Maurício Ye’kwana, diretor da Hutukara Associação Yanomami, fez um relato detalhado aos ministros Sônia Guajajara (Povos Indígenas), Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima) e Silvio Almeida (Direitos Humanos), dentro do espaço central da aldeia Fuduuwaadunha, dos ye’kwanas, que também estão na terra yanomami.

“Há um fluxo grande de aviões e helicópteros nos dois pontos logísticos. São 17 aeronaves, que alimentam garimpos no Parima, no Homoxi, em Xitei”, disse Maurício. Davi Kopenawa, que lidera a Hutukara, resumiu assim a retomada de força do garimpo em seu território, num tom de irritação ao se dirigir aos ministros: “Eles são como cupim. Metade foi embora. Os criminosos ficaram.”

No caso da pista de pouso com nove aviões, o governo brasileiro chegou a planejar a destruição das aeronaves, mas teria constatado que a pista está no lado venezuelano.

A reativação de garimpos é um combustível para a crise humanitária dos yanomamis, com impacto no acesso a alimentos e com sucessivos surtos de malária no território. A desnutrição de crianças yanomamis é tão visível quanto a exploração do ouro, e são diretamente proporcionais.

Auaris é, hoje, um dos principais focos da crise de saúde. O acesso a comunidades se dá por meio de voos com duas horas de duração, o que dificulta atendimentos e remoções; o garimpo vem se estendendo à região, sem repressão por órgãos de fiscalização, de segurança e pelas Forças Armadas; há cooptação de indígenas adultos, o que impacta a produção nas roças.

É comum que crianças estejam desnutridas e com malária, ao mesmo tempo, além da alta incidência de doenças oportunistas da fome: pneumonia, diarreia, anemia, verminoses.

Profissionais de saúde consideram que todos os yanomamis da região de Auaris tenham tido malária ao longo de 2023. São 4.000 indígenas. Até novembro, houve 6.917 casos positivos notificados pelo polo base de saúde, conforme dados do COE (Centro de Operação de Emergências) Yanomami, vinculado ao Ministério da Saúde. Em nenhuma outra região houve tanta malária quanto no local.

No começo da tarde da última quarta, sete crianças estavam internadas no polo base com desnutrição –quatro casos graves, e três, moderados.

As crianças e as mães ficam num galpão onde existe um redário. Uma suplementação alimentar por seringa é administrada nos pacientes, numa tentativa de ganho de peso pelas crianças, de forma que se tente evitar a remoção aérea para o Hospital da Criança em Boa Vista. Em 2023, foram mais de mil atendimentos na unidade de saúde.

Uma criança que estava internada na unidade de saúde em Auaris, e que teria entre 12 e 13 anos, pesava 10 kg. Os casos graves eram de indígenas sanumás, um subgrupo yanomami presente principalmente em Auaris.

Os profissionais de saúde que fazem o atendimento a esses pacientes dizem que as famílias perderam o hábito da roça. Dependem das cestas básicas distribuídas pela Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).

Nas cestas, há arroz, farinha, leite, charque, sardinha em lata, paçoca de carne e um processado à base de milho, segundo agentes de saúde indígenas. A dieta dos sanumás, antes da dependência às cestas, incluía beiju, banana, peixe e carne de porco do mato, veado e macaco. Segundo um agente de saúde, hoje, quase não há caça nem pesca.

Na Casai (Casa de Saúde Indígena) Yanomami, em Boa Vista, um dos principais fluxos de indígenas é proveniente da região de Auaris. O espaço deveria ser apenas uma casa de acolhimento e passagem, mas faz atendimentos médicos e internações.

Quando o presidente Lula (PT) foi a Boa Vista para anúncio de medidas da emergência em saúde, no primeiro mês de seu terceiro mandato, ele se dirigiu à Casai, e afirmou ser inaceitável a superlotação do lugar. Houve declaração de emergência em saúde na terra yanomami em 20 de janeiro de 2023.

O espaço segue com mais pessoas do que vagas existentes. Até terça (9), havia 276 pacientes e 310 acompanhantes, num total de 586 indígenas. A capacidade da Casai é de 442 redes e 16 leitos. No auge da crise humanitária, quase 900 yanomamis ficavam na Casai, parte deles por meses, sem retornar ao território tradicional.

Galpões são estruturados para abrigar os indígenas, divididos por regiões. O de Auaris era um dos mais lotados na terça, quando a reportagem visitou o lugar.

“O garimpo voltou com tudo e, com isso, a malária voltou com tudo”, afirma a médica ginecologista Ana Paula Pina, que atua no DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena) Yanomami. “Há mães desnutridas crônicas. E a maioria das internações é de crianças desnutridas e com malária”.

No polo base em Auaris, profissionais de saúde encontram dificuldades em administrar a suplementação alimentar nos casos de desnutrição. Mesmo assim, as sete crianças com desnutrição não necessitariam de transferência para Boa Vista, segundo o diagnóstico feito no dia da visita dos ministros.

É comum que indígenas do lado venezuelano procurem a unidade de saúde em Auaris, principalmente por causa de malária, conforme o relato de lideranças da região. O fluxo é de 80 a 100 indígenas, segundo as lideranças.

“A gente está muito ciente de que [a crise] está longe de terminar, está longe para se libertar o território”, disse a ministra Sônia Guajajara, na reunião feita com lideranças em Auaris. “Sabemos que há invasores, que o que fica é a parte criminosa”.

Marina Silva afirmou que o governo quer “a transparência e a realidade”, e não o “autoengano”. “O recado do presidente é para resolver a situação.” Silvio Almeida disse algo semelhante: “Temos a plena ciência de que, apesar do trabalho, ainda não foi o suficiente”.

Na terça, após reunião ministerial convocada pelo presidente, o governo federal anunciou a presença de uma “casa de governo” em Roraima para tratar das ações na terra yanomami e a instalação de três bases de vigilância no território, com forças de segurança como PF (Polícia Federal) e Forças Armadas. Os gastos previstos são de R$ 1,2 bilhão.

Lula se mostrou incomodado com os dados de saúde. O relatório mais recente do COE mostra que 308 yanomamis –ou indígenas de outros subgrupos na região– morreram em 2023. Os dados incluem registros até 30 de novembro. Mais da metade dos óbitos foi de crianças de até 4 anos. Entre as causas principais das mortes estão pneumonia, diarreia, malária e desnutrição.

Os alertas de garimpo apontam uma redução de 80% ao longo do ano, mas as imagens de satélite podem camuflar retornos de invasores a áreas que já estavam abertas. E isso vem ocorrendo, segundo agentes de fiscalização.

A estimativa desses agentes é que cerca de 3 mil invasores permanecem na terra indígena, quase um ano após o início de ações de desintrusão –retirada de não indígenas. Eram cerca de 20 mil no auge da crise, estimulados pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).

Com a maior presença de equipes de saúde na região, os números são mais próximos da realidade do que os compilados ao longo do governo Bolsonaro, quando havia expressiva subnotificação. Mas equipes seguem sem entrar em comunidades mais próximas de garimpos, em razão de riscos ao trabalho de saúde.

Na região de Kayanaú, o polo de saúde segue fechado. O garimpo se intensificou no lugar. O governo brasileiro não sabe o destino e as condições de saúde de mais de 300 yanomamis que viviam em cinco aldeias da região.

Vinicius Sassine/Lalo de Almeida/Folhapress

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